Crime contra a humanidade

MPF denuncia mais dois agentes por morte e ocultação de corpos durante a ditadura

Segundo a Procuradoria, dois militantes foram executados em maio de 1970, em São Paulo, e seus restos mortais nunca foram encontrados

Reprodução Comissão Verdade SP

Antônio (ALN) e Alceri (VPR) foram executados na casa onde moravam, em São Paulo, com tiros de metralhadoras

São Paulo – O Ministério Público Federal denunciou mais dois agentes da ditadura pelos crimes de morte e ocultação dos corpos de dois militantes políticos, em maio de 1970, durante a ditadura civil-militar. Alceri Maria Gomes da Silva e Antônio dos Três Reis de Oliveira eram integrantes, respectivamente, da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e da Ação Libertadora Nacional (ALN). Segundo a denúncia, o crime ocorreu na casa onde eles moravam, no bairro do Tatuapé, zona leste de São Paulo. Os acusados são o tenente-coronel Maurício Lopes Lima e o suboficial Carlos Setembrino da Silveira. A íntegra da denúncia pode ser lida aqui.

A gaúcha Alceri, metalúrgica, completaria 27 anos ainda em maio. O mineiro Antônio, estudante, tinha 21 anos.

“A Procuradoria destaca que não cabe prescrição ou anistia neste caso, pois as execuções foram cometidas em um contexto de ataque generalizado do Estado brasileiro contra a população civil e, por isso, são considerados crimes contra a humanidade”, lembra o MPF. “A coordenação centralizada do sistema semiclandestino de repressão da época é comprovada por diversos testemunhos e papéis, entre eles um relatório de abril de 1974, assinado pelo então diretor da CIA William Colby e revelado recentemente.”

O Ministério Público faz referência a documento que descreve reunião na qual o presidente Ernesto Geisel assumia manter a “política” de mortes de militantes políticos. “Portanto, as execuções não eram atos isolados, mas sim uma verdadeira política de Estado, chancelada pela Presidência, que não apenas estava ciente, mas a coordenava e, a partir de 1974, passava a exigir autorização prévia”, diz o procurador da República Andrey Borges de Mendonça, autor da denúncia.

Os restos mortais de Alceri e Antônio jamais foram encontrados, lembra o MPF. “As vítimas foram enterradas como indigentes, com o intuito de não serem localizados os seus corpos. Evidente que o crime de ocultação de cadáver, do qual os denunciados participaram, visava evitar questionamentos acerca da forma como as vítimas haviam sido mortas – ou seja, executadas, sem qualquer possibilidade de reação”, destaca a Procuradoria na denúncia.

Ainda segundo o Ministério Público, embora as mortes nunca tenham sido assumidas oficialmente, “as Forças Armadas estavam cientes das circunstâncias em que ocorreram as execuções”. E cita relatório do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que “descreve em detalhes como a ação ocorreu e declara expressamente a morte dos militantes”. Alceri e Antônio foram executados com rajadas de metralhadora – ele morreu na hora e ela, a caminho do hospital.

“Maurício Lopes Lima foi o comandante da ação. Ele chefiava a equipe de buscas do Destacamento de Operações de Informações do II Exército (DOI) em São Paulo, um dos principais centros de perseguição, tortura e morte na ditadura. Em recentes entrevistas à imprensa, o ex-militar confirmou sua participação no episódio. Investigações apontam que, além de Alceri e Antônio, ao menos 18 pessoas foram vítimas dos atos de violência que Maurício empregava na época para reprimir os grupos de oposição ao regime”, diz o MPF. “O suboficial Carlos Setembrino da Silveira, que também integrava a equipe de buscas do DOI, foi o responsável por jogar uma granada no alçapão para expulsar os militantes de seu interior e facilitar as execuções.”

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