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Largou a cozinha e foi a Curitiba: ‘Lula é do povo, é um crime o que ele está passando’

Cozinheira predileta do ex-presidente foi ao acampamento Lula Livre e fez um boi ralado: 'Espero que esse pessoal tenha amor no coração e entenda que ele tá querendo uma comidinha da Tia Zélia'

Joka Madruga/ Agência PT

Tia Zélia serve boi ralado no acampamento Lula Livre

São Paulo – O 11º dia do acampamento Lula Livre em Curitiba foi marcado pela visita da cozinheira brasiliense Maria de Jesus Oliveira da Costa, a Tia Zélia. “Ela tem um restaurante na Vila Planalto (em Brasília). O Lula ia lá desde quando era sindicalista e depois, como deputado, também. Lá virou um santuário de defesa da democracia. Quando era presidente, ele enganava sua segurança para almoçar com a Zélia”, conta o vice-presidente do PT, Márcio Macedo.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se apresentou à Superintendência da Polícia Federal, no bairro de Santa Cândida, no dia 7. Desde as primeiras horas do cárcere, o acampamento está de pé em solidariedade e exigindo a soltura de Lula. O número de apoiadores cresce a cada dia, entre eles Tia Zélia. “Estou aqui só Deus e eu sabemos como. Quando for embora, fica um pedaço de mim. Mas Deus é maior e Lula não vai ficar muito tempo, ele não pertence a este lugar”, disse.

“Ele gosta de comer farinha com a mão, boi ralado, farinha com feijão e arroz. Lula é do povo, é um crime muito grande o que ele está passando. Sei que ele não está bem, porque ele gosta do povo”, disse a cozinheira, que aproveitou para preparar um dos seus pratos típicos, um dos favoritos do ex-presidente, o boi ralado – carne moída refogada com cebola, alho, azeitona picada, pimenta do reino, entre outros segredos, conforme o chef.

Além de servir os acampados, Tia Zélia preparou uma marmita que foi encaminhada a Lula. “Vou mandar um tapauerzinho. Espero que esse pessoal tenha um pouco de amor no coração e entenda que ele tá querendo uma comidinha da Tia Zélia.”

Ela conta que saiu de casa às 2 da madrugada de ontem (17). “Deixei tudo na minha casa e minha filha perguntou se estava tudo bem. Mas o povo lá está mais feliz comigo aqui do que se eu estivesse lá. Minha menina tem capacidade, sabe de tudo, como eu sei.” O contato da cozinheira com Lula não parou quando ele deixou o Planalto, afirma. “Em setembro mesmo ele passou na minha casa para me dar um abraço. Nunca o cargo subiu na cabeça dele”, disse.

A cozinheira citou um dia em que Lula a visitou quando era presidente. “Depois de um discurso dele em uma Marcha das Margaridas ele mandou me buscar para disfarçar. Combinei com ele que andaria na frente dele para não dar na cara. Ele tem um motorista discreto e quando chegamos na minha casa fechei o portão e desci a cortina. Quando ele veio só abri o portão e coloquei ele pra dentro”, conta.

“Não tem um ser humano igual a ele. Não defendo ele por ele ser presidente, sim porque ele é humano, gente, humilde. No governo dele, pedi para buscar fruta de palma para ele, umbu para fazer umbuzada que ninguém sabe fazer”, completou.

Cozinha solidária, cidade solidária

O cotidiano da cozinha do acampamento é liderado por uma iniciativa do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST). A barraca da comida funciona das 6h30 às 23h, e recebe frequentes doações. “Dizem que Curitiba é uma cidade conservadora, de coração duro, mas estou impressionado com a solidariedade do povo daqui. Já temos uma dispensa de comidas, um caminhão baú cheio de alimentação cheio de doações”, conta Macedo.

A agricultora Zenilda Lisboa Pereira, de 46 anos, é uma das responsáveis pela organização. “Nós armazenamos aqui e distribuímos para todas as cozinhas que estão no acampamento. De acordo com a quantidade de refeições que serão feitas, os coordenadores da cozinha vêm com as demandas e a gente repassa para eles o que necessitam”, diz.

Joka Madruga/Agência PT
Zelina e João Paulo Rodrigues (MST), com Márcio Macedo (esq), na tenda de doações: ‘Estou impressionado com a solidariedade do povo daqui’

Ela relata que o MST veio preparado para o acampamento. Porém, com a chegada diária de mais gente – e todos que chegam podem se alimentar no acampamento –, foi instalada a barraca para receber doações. É uma movimentação da unificação dos movimentos sociais com a Frente Brasil Popular. Isso vem dando certo para fazer os trabalhos de base por uma democracia mais justa e igualitária”, afirma Zenilda.

Segundo a agricultora, é impossível saber quanta gente já se alimentou no acampamento. “Chegamos a ter, pelos dados informados pelos cozinheiros, quatro mil refeições no almoço. Na janta é ainda mais difícil calcular. O pessoal às vezes sai do serviço e vem pra cá, pro ato, dar boa noite ao Lula pra ele dormir descansado, tranquilo, porque nós estamos aqui guardeando ele, dando a segurança dele.” Ela considera “uma honra” receber essa militância. “Esse pessoal acaba passando pelo acampamento e jantando aqui. Mesmo quem não está inserido num movimento ou partido, entende que é uma luta da classe trabalhadora e se junta a essa luta.”

Zenilda está na barraca dos alimentos o dia todo. O trabalho que começa muito cedo e termina tarde da noite não cansa a paranaense. “Eu não digo que trabalho fisicamente. Todo momento para nós é um espaço formativo. E esse espaço, além de formativo, é de dedicação em compreender a luta de classes, defender a democracia e aprender cada vez mais nesse campo da vivência coletiva, unificação dos partidos, da esquerda, dos movimentos sociais que formam a grande Frente Brasil Popular. Isso pra nós, a todo momento, é um espaço de formação. E isso é o que o Lula sempre fala no discurso e na prática sempre mostrou isso pra nós.”

A expressão séria da agricultora se rende à emoção quando fala do ex-presidente. “Quando calassem a boca dele, ele ia falar pelas nossas bocas, nossas vozes. Se tentassem tirar as pernas dele ou não deixar ele caminhar, que nem fizeram agora, ele ia caminhar pelas nossas pernas. E é isso que nos estamos fazendo”, explica, citando o que chama de ensinamento, metodologia e prática dele. “Não é fácil, nem pra ele que está lá dentro, para a família, nem para nós militantes, saber que um camarada está lá engaiolado, sem ter culpa.”

A agricultora diz que está indignada, mas firme na luta. “Vamos seguir as orientações que a todo momento ele está passando para nós, quando ele pode. Pela visita dos senadores que teve lá (ontem), transmitindo essa força para ele e ele transmitindo para nós. Então ele mostra que de fato é um homem guerreiro, não é um homem qualquer e por isso nós estamos aqui com a classe trabalhadora e não vamos sair.”

O respeito ao espaço coletivo é uma regra tácita no acampamento. Ninguém pega nada sem pedir. “Isso é uma dinâmica da própria militância, de respeitar espaço coletivo, respeitar companheiros e companheiras.”

Com reportagem de Cláudia Motta, em Curitiba

 

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