Gestão Doria

Conselho Federal de Nutricionistas considera ração humana uma ‘ameaça’

Órgão máximo da área convocou a população a se contrapor ao que considera “retrocesso” e “violação” do direito humano à alimentação

SMDH/Prefeitura SP

Desde o lançamento do produto, Doria vem recebendo críticas pela proposta de utilizar alimentos perto do vencimento

São Paulo – O Conselho Federal de Nutricionistas (CFN) emitiu nota colocando-se “veemente contra” a proposta do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), de receber doações de sobras de alimentos que seriam descartados pela indústria ou comércio e processá-los para produzir um “granulado nutricional” que será distribuído à população de baixa renda. O conselho “defende que seja assegurado para toda a população o direito ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentar promotoras de saúde”.

A gestão Doria elaborou o projeto Alimento para Todos, em parceria com a Plataforma Sinergia, com base na Lei 16.704/2017. A ideia é produzir o “Allimento”, “um granulado nutritivo” que pode ser adicionado às refeições ou utilizado na elaboração de outros produtos. Em seu site, a Plataforma Sinergia informa ter desenvolvido “um sistema de beneficiamento de alimentos que não são comercializados pelas indústrias, supermercados e varejo em geral. São alimentos que estão em datas críticas de seu vencimento ou fora do padrão de comercialização”.

Para o CFN, o projeto consiste em uma “iminente ameaça ao direito à alimentação”, desrespeitando o artigo 6º da Constituição Federal, e os princípios da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), defendidos pela Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan), instituída no Brasil em 2006. “É um retrocesso sobre a concepção do alimento, da sua dimensão como produto da história e da cultura de um povo, de identidade, de sentimento e de pertencimento social”, afirma no documento.

O órgão destacou que, na década de 1980, a Multimistura se revelou ineficaz no combate à desnutrição, principal argumento utilizado na época para sua disseminação. E, desde então, o Ministério da Saúde vetou a indicação da Multimistura como um produto para suprir as deficiências nutricionais.

O CFN ressaltou ainda que não foram informadas a composição nutricional, modo de fabricação, valor nutritivo, responsável técnico e outros dados sobre o produto. E destacou que já há programas efetivos no país, como Banco de Alimentos, que coleta os produtos não comercializados pelos atacadistas e produtores rurais em diversas unidades do Ceasa, e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), voltado para a agricultura familiar. Além da importância do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) reconhecido por outros países por sua eficácia no combate à desnutrição de crianças.

“Para o CFN é preciso garantir que as políticas de segurança alimentar e nutricional sejam efetivamente asseguradas para toda a população, com ações estruturantes, e não substituídas por medidas paliativas que reforçam as condições de pobreza, exclusão e desigualdade social”, enfatizou a entidade.

O conselho ainda criticou o desrespeito à Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan), instituída no Brasil em 2006. Além disso, desde que a gestão Doria assumiu, em janeiro de deste ano, não foi realizada nenhuma reunião da Câmara Intersecretarial de Segurança Alimentar e Nutricional da Cidade de São Paulo, responsável pela proposição de dotação e metas para os programas e ações integrantes do Plano de Segurança Alimentar e Nutricional, aprovado em 2016. O plano tem uma série de ações e metas a serem realizadas deste ano até 2020. Mas até agora nada foi feito.

Um dos principais pontos do plano é justamente a elaboração de um diagnóstico de segurança alimentar e nutricional da capital paulista, com indicadores que permitam identificar e combater problemas tanto de desnutrição quanto de obesidade em toda a cidade. Além deste, o programa de alimentação escolar orgânica, a compostagem de sobras das feiras livres, a ampliação das feiras de orgânicos e a implementação de Bancos de Alimentos em todas as prefeitura regionais estão parados. 

Em nota, a prefeitura de São Paulo disse “que há equívocos nas afirmações emitidas em nota pelo Conselho Federal de Nutricionistas, talvez por desconhecimento do projeto”.

“A Prefeitura reitera que os alimentos naturais não serão removidos da rede municipal. Pelo contrário, no âmbito da Lei aprovada, a ideia é ampliar a sua distribuição por meio de parcerias como, por exemplo, o instituto Mesa Brasil – uma rede nacional de banco de alimentos.

A administração municipal já trabalha com o banco de alimentos. A ação consiste em recolher produtos que não serão mais vendidos e direcioná-los para entidades credenciadas que trabalham com famílias em situação de vulnerabilidade. A nova política irá ampliar esta captação. A Prefeitura já esclareceu que não haverá isenção de impostos nem benefícios fiscais para as empresas.

O plano municipal de erradicação da fome e promoção da função social dos alimentos, cuja criação foi determinada pela Lei 16.704/2017, vai dar prioridade ao atendimento de famílias em situação de vulnerabilidade social, em especial aquelas que possuem crianças de até três anos. O principal objetivo desta política será a redução do desperdício de alimentos, por meio do incentivo de práticas de manejo eficiente.”

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