risco iminente

Comitê de direitos humanos denuncia ‘mortes anunciadas’ de defensores

Carta aberta lista 15 casos no Brasil de risco de morte iminente de ativistas. Defensores denunciam inação do governo e cobram respostas ao aumento da violência

Mario Campagnani/CBDDH

Defensores querem evitar a ocorrência de novos casos como o Massacre de Pau D’Arco, no Pará

São Paulo – Para alertar sobre a violência crescente contra pessoas que atuam na defesa dos direitos humanos no Brasil e cobrar a atuação urgente das autoridades para evitar que casos de perseguição e ameaça se consumem, o Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) listou 15 casos espalhados por todo o país em que há risco de morte iminente de ativistas.

Os casos listados incluem ataques e ameaças a comunidades de trabalhadores rurais, indígenas, quilombolas e pescadores que vivem em áreas distantes e até isoladas, mas também traz violações nas grandes cidades e áreas urbanas contra moradores das favelas do Rio de Janeiro e militantes LGBT no Paraná, por exemplo. 

Ainda em julho deste ano, o CBDDH – formado por mais de 30 organizações e movimentos sociais que atuam na defesa dos direitos humanos –  elaborou o dossiê Vidas em Luta em que apontam a morte de 66 defensores em direitos humanos em 2016. Neste ano, a marca deve ser superada, pois até o momento já são 62 os ativistas assassinados.

Para a pesquisadora da ONG Justiça Global e representante do comitêAlice de Marchi, os casos apresentados na “carta das mortes anunciadas”, como denomina , são apenas uma “amostra” das violações que vêm ocorrendo em todo o país e servem de alerta para que novas ocorrências venham engrossar as estatísticas. “Diante de todos esses casos que não param de crescer, a gente precisa alertar a sociedade e as autoridades para que mais mortes não venham a ocorrer”, afirmou, em entrevista coletiva do CBDDH nesta sexta feira (22) em São Paulo. 

Ela afirma que essa onda de violência contra os defensores cresce desde meados de 2015, mas teve impulso no ano passado, após a “ruptura democrática” do golpe do impeachment que colocou no poder um governo avesso a políticas voltadas aos direitos humanos.

Estado ausente

Os ativistas denunciam a ausência do Estado, na maioria dos casos, com a falta de proteção aos defensores e de investigação e punição aos crimes cometidos, e também o envolvimento de agentes públicos, como no Massacre de Pau D’Arco, ocorrido no Sul do Pará, em maio deste ano, que teve a participação de policiais civis e militares na morte de dez trabalhadores rurais.

Uma das graves situações de violência recorrente relatada ocorre no município de Nova Guarita, no estado do Mato Grosso, onde um casal que vive em um dos assentamentos rurais foi torturado e mantido em cárcere privado. As ameaças de morte se estendem aos demais moradores do Assentamento Raimundo Viera III, que também já tiveram suas casas queimadas, cercas cortadas, além de disparos contra casas e veículos dos assentados. Os agressores, mais uma vez, seriam fazendeiros interessados nos territórios ocupados.

No Maranhão, a violência é contra o povo indígena Akroá Gamela, na aldeia Cajueiro Piraí, município de Viana. Depois de ataque com arma de fogo, em abril deste ano, que deixou mais de 22 índios da etnia feridos, fazendeiros seguem ameaçando com armas, facas, paus e pedras. Em agosto, novos disparos foram registrados. O relatório completo com os 15 casos denunciados você confere aqui.

Alice disse ainda que o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, criado em 2005 após a morte da missionária Dorothy Stang – que atuava em defesa de povos indígenas da Amazônia e foi morta por pistoleiros a mando de fazendeiros devido a disputas territoriais com os nativos – vem sendo desmantelado pelo atual governo, com corte de recursos e desligamento de defensores. 

Contra as populações indígenas, o integrante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Lindomar Padilha diz que as ameaças e ações violentas são estruturais e endêmicas. Ainda assim, ele afirma que a atual situação é a mais grave desde meados dos anos de 1980. “Nos assusta também o requinte de crueldade. Não é só violação dos direitos, mas a desvalorização daquilo que é mais fundamental, que é a vida”, disse ele.  

O povo guarani-kaiowá, segundo Padilha, contabiliza centenas de mortos, nas últimas décadas, o que configura um verdadeiro genocídio  quando as ações violentas visam o extermínio completo de um determinado grupo. Ele também sinalizou para a inação das autoridades governamentais. “Dia a dia há ataques e assassinatos em acampamentos dos guaranis, com milícias e pistoleiros a mando dos fazendeiros. Não se pode dizer que o governo não sabia, a gente precisa exigir providências do Estado. Se medidas não forem tomadas, a tendência é de agravamento dessa situação”, afirmou o conselheiro indigenista.