Nova diretriz

Após pressão, Doria recua em mudanças na assistência social

Portaria 47 altera artigos que antes suspendiam o atendimento das pessoas em situação de rua no período da manhã, ao menos na região central. 'Foi uma vitória', diz coordenador do Fórum de Assistência Social

Reprodução/Twitter

Suspensão do atendimento de manhã de pessoas em situação de rua causou crise no governo de Doria

São Paulo – O prefeito de São Paulo, João Doria, por meio da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (Smads), recuou da decisão de remanejar parte dos orientadores socioeducativos que realizam a abordagem de pessoas em situação de rua, medida responsável por deflagrar uma crise entre a prefeitura e trabalhadores da assistência social ao longo do mês de agosto.

No dia 22 de julho, o governo havia decidido, por meio da Portaria 41, transferir do período da manhã para o noturno esses trabalhadores, com a intenção de ampliar os encaminhamentos aos centros de acolhida da cidade. Desde então, a medida vinha sendo fortemente contestada pelos profissionais da assistência social do município de São Paulo e organizações da sociedade civil que mantêm convênio com a prefeitura para realizar a abordagem das pessoas em situação de rua.  

Agora, com o texto da Portaria 47 e a nova redação para alguns artigos da portaria anterior, o governo Doria preserva o Serviço Especializado de Abordagem Social (Seas) às pessoas em situação de rua das entidades que atuam nas regiões da Sé, Lapa, Santana, Santo Amaro e Mooca, revogando a redução das metas de atendimentos apontadas na Portaria 41.

A capacidade atual das entidades é de 8.820 atendimentos por mês, meta que havia sido reduzida para 3.200 na decisão anterior do governo, um corte de 5.620 atendimentos. Com a nova decisão expressa na Portaria 47, o corte fica em 1.180 atendimentos, relacionados às organizações que possuem este serviço nas regiões de Aricanduva, Butantã, Campo Limpo, Capela do Socorro, Casa Verde, Cidade Ademar, Itaquera, Itaim Paulista, Vila Mariana e Vila Maria.

“É uma decisão muito positiva, foi graças às manifestações dos trabalhadores. Se não tivéssemos ido às ruas fazer o enfrentamento, isso não teria acontecido”, avalia Itamar Moreira do Carmo, coordenador do Fórum de Assistência Social de São Paulo (FAS). Segundo ele, o número de profissionais demitidos, que antes era em torno de 400 pessoas foi reduzido para cerca de 100 trabalhadores.

“Conseguimos, foi uma vitória”, afirma o coordenador do FAS, enfatizando as manifestações e debates ocorridos ao longo de agosto, denunciando o que ele definia como um “desmonte” do Sistema Único de Assistência Social (Suas).

Apesar da mudança de posição do governo, Itamar Moreira do Carmo afirma que o repasse mensal às entidades conveniadas segue sofrendo atraso. Além disso, ele vê com preocupação a decisão da prefeitura em atrair voluntários para o atendimento do serviço social, medida frequentemente enfatizada como importante pelo secretário da Smads, Filipe Sabará.

O temor, segundo o coordenador do FAS, é que isso comece a representar uma substituição dos profissionais por voluntários, “sem custo”, como costuma destacar o secretário.

Outro lado

Em nota, a Smads explica que “as normativas para adequação de equipes foram construídas de forma participativa, envolvendo Smads, organizações sociais, trabalhadores de serviços conveniados, conselhos municipais (Comas e FAS) e usuários. Também participaram os três sindicatos da classe já que a entidade que responde pela Coordenadoria de Atendimento Permanente e de Emergência (Cape) será substituída e os colaboradores em aviso prévio serão recontratados pela nova organização”. A prefeitura destaca que “estudos de territorialidade” embasaram a nova decisão.

A alegação do governo de que as mudanças foram “construídas de forma participativa”, entretanto, é repudiada pela presidenta do Conselho Municipal de Assistência Social (Comas), Fernanda Campana.

Ela afirma não ter recebido nenhum convite oficial para integrar o suposto Grupo de Trabalho criado pela Smads. E esclarece, ainda, que o Comas já havia se posicionado junto ao Ministério Público pedindo a revogação da Portaria 41. “Importante esclarecer que o Comas não foi convidado para participar do GT”, disse Fernanda Campana. Segundo ela, um conselheiro do Comas, representante dos usuários da assistência social no órgão, esteve na reunião convocada pela prefeitura, porém sem ter sido referendado para falar em nome do conselho.

Já Cecília Apóstolopoulos, que integra a executiva-ampliada do Fórum da Assistência Social (FAS), reconhece ter participado de três reuniões convocadas pela Smads, porém rechaça ter concordado com os termos da Portaria 46. Cecília afirma que o governo não aceitou as propostas feitas, que incluíam a suspensão da Portaria 41, a capacitação dos trabalhadores da assistência social e uma análise apurada do problema.

“A gente não aprovou. O que foi colocado não era tudo o que queríamos. Parece que foi uma coisa pronta, uma manobra. Isso nos incomoda muito. Colocam como se estivessem dialogando com a sociedade civil, mas não é o que aconteceu, não na dimensão que deveria ser. Discutimos sim, mas o que falamos não foi levado em conta”, afirma a representante do FAS.