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Dossiê aponta 66 assassinatos de defensores de direitos humanos em 2016

Documento elaborado por 24 organizações e movimentos sociais aponta que ameaças contra militantes aumentaram a partir do cenário de 'golpe de estado' marcado pela retirada de direitos

CPT/FACEBOOK

Conflitos por terra são a principal causa de morte de ativistas por direitos humanos no Brasil

São Paulo – Dossiê divulgado nesta terça-feira (4) revela que pelo menos 66 defensores dos direitos humanos foram assassinados no Brasil em 2016. As regiões Norte e Nordeste concentram a maior parte dos casos, e os conflitos por terra são a principal causa da morte dos ativistas.

Intitulado Vidas em luta: criminalização e violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil, o documento atribui o crescimento desse tipo de violência, no país, ao “cenário de golpe de estado, com retirada de direitos, criminalização, esvaziamento político e financeiro de órgãos como o Incra e a Funai”.

O relatório foi elaborado pelo Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH), que reúne 24 organizações e movimentos sociais que lutam por diversas bandeiras, desde o acesso à terra – Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) –, os direitos indígenas – Conselho Indigenista Missionário (Cimi) –, violações a liberdade de expressão – Artigo 19 – , aos direitos da mulher – Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea) –, e o combate à tortura.

Vidas em Luta

Além dos assassinatos de ativistas, o dossiê também detalha outros 64 casos em que militantes por direitos direitos humanos foram criminalizados, atacados ou ameaçados. “O dossiê é uma primeira tentativa do comitê em apresentar um diagnóstico da situação de violações contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil. Os anos de 2016 e 2017 apresentaram um crescente de violência e criminalização dos movimentos sociais. Nós não queremos deixar que isso aconteça na invisibilidade”, afirma Layza Queiroz, advogada popular da Terra de Direitos, outra entidade que também participa do CBDDH. 

Na região Norte, com 32 registros de assassinatos, a situação é “alarmante”, segundo o relatório. O estado de Rondônia lidera, com 19 casos, em sua maioria, envolvendo trabalhadores e trabalhadoras rurais ou lideranças que atuavam na defesa do direito à terra, tendo como algozes madeireiros, grileiros, latifundiários e grandes empresários. 

“Em todo o estado de Rondônia são recorrentes as denúncias que apontam uma articulação de grandes proprietários de terras, agentes públicos da Polícia Militar e grupos de pistoleiros que resulta em ataques e ameaças a defensoras e defensores de direitos humanos, assim como em um forte processo de criminalização, difamação e deslegitimação dos movimentos sociais (Liga dos Camponeses Pobres, MST, o Movimento dos Atingidos por Barragens − MAB – e a CPT, etc.), e famílias que lutam pelo direito à terra”, aponta o dossiê. 

mapa defensores

No Nordeste, foram 24 assassinatos, com a maioria dos casos registrados no estado do Maranhão, com 15 mortos. Ali, além do conflito entre trabalhadores rurais e latifundiários, é marcante também a disputa entre estes últimos e os povos indígenas e quilombolas. 

As regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste registram os outros 11 casos de assassinatos de defensores dos direitos humanos. Para as regiões urbanas, o dossiê alerta que os casos são sub-notificados, pois, na maioria das vezes, são identificados como conflitos individuais ou tráfico de drogas, por exemplo – imputação comum contra manifestantes em protestos. 

Nas cidades, os principais alvos foram ativistas que atuam em defesa do direito à moradia, grupos que defendem os direitos da população LGBT, da juventude negra, das profissionais do sexo, lideranças comunitárias, midiativistas de favelas e periferias, estudantes, dentre outros. 

O dossiê ressalta que, nos centros urbanos, existe uma “dinâmica acelerada e naturalizada de violência brutal, espraiada e difusa, que dificulta a visualização e compreensão dos ataques perpetrados contra defensoras e defensores de direitos humanos”, tendo como principais agentes elementos do Estado – as policiais – e milícias apoiadas sustentadas por grandes empresas. 

A violência policial contra manifestantes se acirrou, em 2016, no momento em que se intensificaram protestos de rua contra o impeachment da presidenta Dilma Rousseff e, posteriormente, contra o novo governo instalado “após a concretização do golpe jurídico-institucional.”

“Segundo monitoramento da ARTIGO 19, na semana de 29 de agosto a 05 de setembro, foram registradas ações de repressão policial em ao menos 24 protestos contrários ao impeachment, em nove estados diferentes. Inclui-se aqui a operação da Polícia Civil, em 04 de setembro de 2016, em São Paulo, que deteve 26 pessoas antes do ato, com claro intuito de criminalizá-las.”

As violações contra os defensores de direitos humanos foram registradas, ainda, no contexto da realização de grandes eventos internacionais, como os Jogos Olímpicos Rio 2016, e a construção de grandes obras – hidrelétricas – e empreendimentos de mineração.

Para além do mapeamento e detalhamento dos casos, envolvendo, ainda, mulheres e midiativistas, o CBDDH faz uma série de recomendações, a serem encaminhadas aos órgãos públicos do Sistema de Justiça e dos Poderes Executivo e Legislativo, a fim de garantir a implementação e fortalecimento do Programa Nacional de Proteção às Defensoras e Defensores de Direitos Humanos no Brasil (PNPDDH) – criado em 2004 – dentre outras ações. 

A íntegra do dossiê Vidas Em Luta pode ser acessada aqui.

 

 

 

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