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MST ocupa capitais para reafirmar luta pela reforma agrária

Mobilizações marcaram dia de luta pela reforma agrária, escolhida para homenagear trabalhadores assassinados em Eldorado dos Carajás, no Pará, em 1996

MST

Durante a Jornada Nacional, o MST também denunciou a Media Provisória (MP) 759 que, de acordo com o movimento, pode barrar qualquer processo de reforma agrária

São Paulo – Para reafirmar a luta pela reforma agrária e a necessidade de novos assentamentos, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) festejou, na segunda-feira (17), o Dia Nacional e Internacional de Luta pela Reforma Agrária, com mobilizações e ocupações em diversos pontos do país. A data foi escolhida para homenagear 21 trabalhadores sem-terra assassinados em Eldorado dos Carajás, no Pará, no dia 17 de abril de 1996.

Na época, os manifestantes marchavam até Belém, quando foram atacados por policiais militares comandados pelo já falecido governador Almir Gabriel (PSDB). A violência deixou outras 69 pessoas feridas

Durante a Jornada Nacional, o MST também denunciou a Media Provisória (MP) 759 que, de acordo com o movimento, pode barrar qualquer processo de reforma agrária.  Em várias capitais brasileiras, manifestantes ocuparam as sedes locais do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). No Ceará, cerca de oitocentos sem-terra ocuparam o local. O movimento reivindica a desapropriação de terras para assentar mais de duas mil famílias em todo o estado.

No Piauí, 450 pessoas também ocuparam o órgão. Em Curitiba, os manifestantes montaram acampamento em frente ao Incra e entregaram uma pauta de reivindicações para o superintendente responsável pelo órgão no Paraná.

Cerca de quatrocentos sem-terra ocuparam a sede do Incra em Santa Catarina. Eles pedem a criação de novos assentamentos, entrega de cestas básicas para os acampados, além de crédito especial para reforma agrária, crédito de habitação e assistência técnica.

No Rio Grande do Sul, o MST ocupou os pátios do Incra e do Ministério da Fazenda, em Porto Alegre. Em Alagoas, cerca de três mil trabalhadores montaram um acampamento na Praça Sinimbu, em Maceió, contra a paralisação da reforma agrária.

Em entrevista à Rádio Brasil Atual, o coordenador da CPT, Thiago Valentim, afirma que há uma falta de compromisso do governo federal com as demandas do campo. O desmonte do Incra, como também o da Funai, não é de agora. Há um bom tempo que o Incra sofre corte nos recursos, tornando-se impedido de realizar o seu trabalho. No entanto, isso se intensificou no governo Temer. Desmontar esses órgãos quer dizer que os povos do campo não terão o acesso à terra garantido.”

Em Minas Gerais, os moradores do acampamento Esperança MST, em Periquito, realizaram um trancaço na linha ferroviária que atravessa o município. O pedágio da BR-040, que liga Juiz de Fora e Três Rios também foi ocupado e o movimento fez uma convocação para a greve geral no dia 28 de abril.

Em São Paulo, a jornada teve início com a ocupação da fazenda Santo Henrique, no município de Borebi onde está instalada a empresa Cutrale, a maior exportadora de suco de laranja do mundo. De acordo com o MST, a empresa ocupa ilegalmente terras públicas, invadidas e griladas para o agronegócio da região, além de somar denúncias e processos de desrespeito ao direito dos trabalhadores e ao meio ambiente. A área, de 2.500 hectares já foi ocupada diversas vezes pelo movimento.

Em Taubaté, na região do Vale do Paraíba, cerca de 100 famílias do MST ocuparam a fazenda Guassahy, de 300 hectares, localizada às margens da Rodovia Presidente Dutra, que liga São Paulo ao Rio de Janeiro. No local, 21 bandeiras foram hasteadas em homenagem aos mortos do massacre de Eldorado dos Carajás.

Segundo Elvio Motta, da Federação de Trabalhadores da Agricultura Familiar (Fetraf), o massacre nunca parou. “Nós vivenciamos os trabalhadores de Eldorado dos Carajás 24 horas por dia no Brasil. A realidade ainda não mudou, se você olha para o estado do Pará é o mesmo barril de pólvora daquele momento”, afirma ao repórter Jô Myagui, da TVT.

De acordo com o MST existem, atualmente no Brasil, cerca de 150 mil famílias em acampamentos. Os trabalhadores rurais esperavam mais dos governos Lula e Dilma, mas foram poucos os assentamentos criados nesses últimos anos. “Tivemos um auge que foi a década de 90, muito em função da luta intensa que teve naquele período, depois um pequeno aumento no governo Lula, de 2005 até 2007, mas daquele ano para cá a reforma agrária vem decaindo”, diz Marcio Santos, coordenador nacional da MST.

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No dia 17 de abril de 1996, sem-terra foram atacados pela polícia militar de Belém: 21 pessoas morreram e 69 ficaram feridas

Violência no campo

O mapa da violência no campo da Comissão Pastoral da Terra (CPT) foi apresentado nesta segunda-feira, em Brasília, e mostra que o país vive uma onda de violência na luta de camponeses e comunidades tradicionais por seus direitos. Neste conflito desigual, 61 pessoas foram assassinadas, só no ano passado. Se forem somadas as tentativas de assassinatos, ameaças de morte e agressões, esse número chega a 845. 

Segundo o relatório, em 2016 foram 1.536 conflitos no campo, com 61 assassinatos, 11 mortes a mais do que em 2015. desde que o mapa divulgado pela CPT, nos últimos 25 anos, esse foi o segundo maior número de assassinatos no campo, abaixo apenas de 2003, quando 72 pessoas foram mortas.

Os dados apontam um aumento de violência de 22% em relação a 2015. Segundo Thiago, os números não eram tão altos desde 2003. Ele explica que a região norte é a que mais mata. “É onde concentra maior parte dos assassinatos, sendo o estado de Rondônia onde maior parte dos trabalhadores são mortos e também que possui mais conflitos.”

O coordenador da CPT diz que a violência do campo é resultado da “impunidade” e também de uma omissão do Estado. “Quando o Estado é omisso na garantia de direitos, outras forças passam a atuar e até expulsam comunidades.”

Para a CPT, um dos principais motivos para o aumento da violência no campo é a conjuntura política, desde o início do processo de impeachment de Dilma Rousseff, com a consequente retirada de direitos de componentes e comunidades tradicionais e o avanço do agronegócio.

“O momento político brasileiro via a continuar privilegiando uma minoria. Então a grande maioria, que são os camponeses, as comunidades tradicionais e quilombolas, não têm como se defender. Essa resistência dos camponeses tem feito com que também os ruralistas, os grandes latifundiários, se fortaleçam”, afirma Dom Enemésio Lazzaris, presidente da Comissão Pastoral da Terra, à TVT.

Rafael Azevedo/Mídia NINJAMST sessão solene
Sessão Solene pelo Dia Internacional da Luta Pela Terra, em Brasília, no Plenário da Câmara Legislativa do DF

O mapa é dividido em três tipos de ocorrências no campo: sobre a violência no trabalho, o dado caiu, em relação ao ano anterior. Foram 63 casos, mas a CPT explica que o número é prova de que há omissão dos órgãos fiscalizadores. A situação leva a crescente criminalização dos movimentos sociais: prova disso foram as 80 prisões efetuadas entre os representantes dessas entidades.

Valdir Misnerovicz, do MST, foi um dos que ficou encarcerado enquanto mediava um conflito em uma usina no estado de Goiás. “É uma usina que deve mais de R$ 1,2 bilhão, só para a União. A acusação que recai sobre mim é de organização criminosa. É o primeiro caso de acusação dessa natureza que enfrentamos.”

Valentim que não são só os sem-terra que sofrem com a violência do campo. “A violência tem aumentado nos últimos anos, destacando que é uma violência contra trabalhadores rurais e comunidades tradicionais, como indígenas, quilombolas e ribeirinhos. São muitos povos que tem seus direitos negados e sofrem violências e ameaças” denuncia.

Na luta pela terra, 2.639 famílias foram expulsas, em ações contra ocupações e posses. Só no Tocantins, foram 99 conflitos do gênero. O índice também triplicou, nos últimos seis anos, nos conflitos pela água.

Em 2011, foram 69 casos, em todo país, contra 172, no ano passado, envolvendo 45 mil famílias. Entre elas, a de Divanilce de Souza Andrade, filha da pescadora Nilce de Sousa Magalhães, defensora das comunidades atingidas por barragens das hidrelétricas do Rio madeira, em Rondônia. No ano passado, ela foi assassinada e teve o corpo jogado nas águas da usina. “Eu passei uma semana andando com os restos dos ossos da minha mãe dentro meu carro.”

“A violência no campo sempre existiu no Brasil, inclusive no período de redemocratização que a gente imaginava que ia ter um ambiente mais propício, mas os dados da CPT demonstram que de 1980 até os dias atuais mais dois mil trabalhadores foram assassinados no campo brasileiro, devido aos conflitos agrários”, afirma Marcio Santos.

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