Direito à memória

Ex-secretário de Direitos Humanos considera homenagem a Tuma uma ‘afronta’

Rogério Sottili lembra que ex-senador também dirigiu o Dops, 'um dos mais violentos centros de repressão' da ditadura

José Cruz/Agência Brasil

Sottili: ‘Me assusta que não houve resistência na Câmara’

São Paulo – Para o ex-secretário nacional e municipal (em São Paulo) de Direitos Humanos Rogério Sottili, o projeto que homenageia o senador Romeu Tuma é uma “afronta” ao Estado de direito, às famílias de vítimas da ditadura e ao próprio decreto que criou o Programa Ruas de Memória na cidade de São Paulo. Ele lembra que Tuma, morto em 2010, dirigiu “um dos mais violentos centros de repressão” do período autoritário, referindo-se ao Dops, e “não pode ser referência para as novas gerações”.

O Projeto de Lei 22/2017, do vereador Eduardo Tuma (PSDB), sobrinho do senador, foi aprovado em votação simbólica pela Câmara de São Paulo, em segunda discussão, em 21 de março, com dois votos contrários (Isa Penna e Sâmia Bomfim, ambas do Psol) – o líder do PT, Antonio Donato, registrou sua abstenção. Um mês antes, o PL teve parecer favorável, conjunto, de quatro comissões temáticas, com 15 votos a favor e um contrário (Toninho Vespoli, também do Psol). Um dos votos favoráveis foi do vereador Reis, do PT (Paulo Batista dos Reis, em seu primeiro mandato, pela legalidade da matéria, sem entrar no mérito do tema), conforme o SPLegis, sistema de acompanhamento legislativo da Câmara paulistana.

Pela proposta, enviada para sanção do prefeito João Doria (PSDB), a Ponte das Bandeiras, na marginal Tietê, zona norte da capital paulista, passa a ter também o nome Senador Romeu Tuma. Um abaixo-assinado circula na internet para pedir o veto ao projeto. Até as 16h15 desta quarta-feira (5), estava com 486 assinaturas. Ontem, Eduardo Tuma esteve com o prefeito, conforme imagem postada em rede social, para, segundo o vereador, debater “projetos de melhoria para a cidade”. 

“Me assusta que não houve resistência na Câmara”, comenta Sottili. “Eu lamento profundamente que um vereador do PT tenha votado pela aprovação do projeto”, acrescenta o ex-secretário, criticando também o resultado da votação no plenário. Segundo ele, isso se contrapõe ao “compromisso de luta pelo direito à memória e à verdade de que o PT tem sido protagonista desde a sua origem”.

Sottili lembra ainda que a Comissão Memória e Verdade da Prefeitura de São Paulo, cuja criação foi aprovada pela própria Câmara Municipal, incluiu entre suas recomendações a troca de nomes de logradouros públicos, onde houver referência a pessoas identificadas com a ditadura e em ações contra os direitos humanos. “Todos os países que passaram por regimes autoritários já fizeram seu dever de casa. São Paulo está muito atrasada. Esse projeto vem completamente na contramão.”

Na última sexta-feira (31), a Comissão Memória e Verdade entregou a documentação produzida durante suas atividades ao Arquivo Histórico Municipal de São Paulo.

Em texto disponível na internet, escrito há anos, a ativista Suzana Keniger Lisbôa, mulher do desaparecido Luiz Eurico Tejera Lisbôa, cujo corpo foi localizado em 1979, enterrado no Cemitério Dom Bosco, em Perus, zona noroeste de São Paulo, sob o nome falso de Nelson Bueno, fala sobre o envolvimento de Tuma com episódios da ditadura. “Romeu Tuma integrou o aparelho de repressão da ditadura e esteve presente no palco dosacontecimentos relativos ao desaparecimento dos presos políticos. Como Diretor do DOPS em São Paulo e, posteriormente, na PF, foi ele quem ‘arrumou’ os arquivos do órgão antes de serem tornados públicos.”

 

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