São Paulo

Gestão Doria complica participação da população no Programa de Metas

Prefeitura exige CPF do para cadastro, reserva o direito de utilizar dados pessoais como bem entender e limita participação a uma contribuição

Suamy Beydoun/Agif/Folhapress

Doria já havia anunciado que seu Programa de Metas seria elaborado por uma consultoria

São Paulo – A gestão do prefeito da capital paulista, João Doria (PSDB), abriu nesta terça (21) um novo site para que a população envie propostas para o Programa de Metas, plano que define as prioridades do poder público para todas as regiões da cidade nos próximos quatro anos (2017-2020). No entanto, em vez de facilitar a participação dos cidadãos, o site tem uma série de limitações ao envio das contribuições, dentre elas, a exigência de cadastro com número de CPF, a cessão total dos direitos sobre tudo que os participantes fornecerem de informação – inclusive dados pessoais –, sobre a qual a prefeitura poderá “livremente dispor” para “qualquer uso” e a limitação a uma contribuição por pessoa.

O Programa de Metas foi criado a partir de uma mobilização encabeçada pela Rede Nossa São Paulo, que culminou na aprovação da Emenda nº 30 à Lei Orgânica do Município de São Paulo, em 2008. Com isso, o prefeito eleito tem 90 dias, no primeiro ano de mandato, para apresentar as metas prioritárias da gestão. Essas metas devem ser objeto de audiências públicas em todas as prefeituras regionais, mais cinco temáticas e uma geral.

O primeiro Programa de Metas foi realizado na gestão de Gilberto Kassab (PSD, 2009-2012). Teve 223 metas, das quais 55% foram concluídas. Na gestão de Fernando Haddad (PT, 2013-2016) foram 123 metas, das quais 58% foram cumpridas. A gestão Doria havia sugerido, em dezembro, que a elaboração do plano seria entregue a uma consultoria privada, o que poderia deixar dados do município relativos a orçamento e planejamento à disposição do mercado.

A questão da cessão dos direitos está inserida nos termos de uso do site. Inicialmente, a prefeitura se reservava o direito de repassar os dados a terceiros, sem definir se estes seriam outros governos, empresas ou organizações sociais. A expressão foi retirada, mas a permanência dos termos “livremente dispor” e “qualquer uso” abre a possibilidade de os dados pessoais serem repassados mesmo assim.

Para o pesquisador da Rede Nossa São Paulo Américo Sampaio, esse tipo de condição para a participação é um desserviço à sociedade. “Queremos que as pessoas participem e não há problema em solicitar dados, desde que tenham a ver com a consulta que está sendo feita. Um CEP, o bairro de moradia, é compreensível. Mas o número de CPF não faz sentido. Junto ao uso indiscriminado dos dados pessoais, isso intimida as pessoas e desestimula a participação”, afirmou.

A gestão anterior, de Fernando Haddad (PT), também impunha a necessidade de cadastramento para participar, mas não havia cessão indiscriminada de direitos e dados, nem limite às contribuições. Quando o Programa de Metas da gestão Haddad foi concluído, havia recebido cerca de 15 mil sugestões. A necessidade de cadastro foi posteriormente retirada, quando das consultas ao Plano Diretor Estratégico e outras políticas desenvolvidas.

A proposta inicial da gestão Doria para o Plano de Metas ainda não foi divulgada. Para Américo, isso também dificulta a participação, porque a população não sabe quais são as diretrizes do governo municipal. Além disso, o site não tem uma organização das áreas – educação, transporte, lazer, por exemplo – para que a população direcione sua contribuição. Outro problema é que o cidadão só pode participar uma vez. Ao concluir o processo, o site não libera uma nova entrada para fazer outra proposta.

“Ter um site é algo que contribui muito para a participação. Mas não pode limitar a uma única contribuição. A população não tem só a unidade de saúde, ou só o transporte, ou só uma praça no bairro. Tem tudo isso e mais. Então tem de poder fazer propostas em várias áreas ou várias para a mesma área”, defendeu Sampaio.

Além dessas limitações, não há links no portal da prefeitura nem no site da Secretaria de Gestão – responsável pelo programa – que direcionem para o site do Programa de Metas. A busca em programas de localização também não encontra o site atual, somente o da gestão anterior.

Américo também questionou o uso do termo “sonho” como chave para que a população apresente suas propostas para o Programa de Metas. “As metas devem ser prioridades. Uma coisa é a cidade dos sonhos. Outra coisa é a necessidade urgente, factual. Tratar dessa forma pode complicar a absorção dessas manifestações ao Programa de Metas”, avaliou.

Em nota, a Secretaria Municipal de Gestão informou que “a identificação por CPF foi escolhida apenas para impedir a criação de perfis falsos”. “As pessoas poderão acessar a página da Consulta Pública, se cadastrar e contribuir com várias ideias e projetos, em diferentes temas. O número de acessos foi restrito para evitar duplicatas e não poluir as amostras. Sobre a utilização dos dados pessoais, a pasta informa que o Termo de Uso foi alterado, assegurando a privacidade e segurança do cidadão”, diz a nota.

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