'grande desrespeito'

Defensoria pede que Doria explique permissão para que GCM recolha cobertor de sem teto

“É a mesma coisa que você andar com um celular e a polícia exigir que você tenha a nota fiscal para não tomar ele de você”, diz presidente de movimento de moradores de rua

Calberto/Flickr

“Com o decretoGCM pode tirar todos os bens que dos moradores de rua, como papelão ou cobertores”

São Paulo – Movimentos de moradores em situação de rua aliados à Defensoria Pública de São Paulo e às Secretarias Municipais de Direitos Humanos e de Prefeituras Regionais vão protocolar um ofício ainda esta semana, cobrando que o prefeito de São Paulo, João Doria, esclareça a alteração no decreto de Fernando Haddad, que permite que a Guarda Civil Metropolitana (GCM) volte a recolher cobertores e colchões dos sem teto da cidade.

Os integrantes do movimento pedem que o prefeito participe da próxima reunião do Comitê Intersecretarial de Políticas Públicas, marcada para daqui a duas semanas, ou que Doria receba representantes do grupo em seu gabinete antes disso. O comitê congrega representantes do poder público, da defensoria e da sociedade civil para discutir políticas públicas para a cidade.

“Com o decreto a GCM pode tirar todos os bens que acharem que é dos moradores de rua, como papelão ou cobertores. É a mesma coisa que você andar com um celular e a polícia exigir que você tenha a nota fiscal para não tomar ele de você”, critica o presidente do Movimento Estadual da População em Situação de Rua do Estado de São Paulo, Robson César Correia de Mendonça. “Estamos solicitando uma posição do Doria. Isso é inconstitucional e um grande desrespeito.”

A alteração no decreto de Haddad foi publicada no Diário Oficial do município no último dia 21 e retirou o parágrafo que proibia os guardas-civis de retirar cobertores e recolher colchões de pessoas em situação de rua. Em entrevista, Doria disse que o texto “não ficou claro” e que “os guardas não estão autorizados a recolher os pertences porque seria uma desumanidade”.

Segundo o prefeito, a alteração serve “apenas para preservar legalmente o direito da GCM de poder ajudar as secretarias de Desenvolvimento e Assistência Social e de Direitos Humanos e Cidadania para não haver a ilegalidade do ato. Jamais retirar pertences ou cobertores dessa população, mas ajudá-los, auxiliá-los, abrigá-los.”

“Achamos uma atitude ditatorial alterar uma medida assim, sem consultar os criadores do decreto, que fomos nós e a Defensoria Pública”, diz Mendonça. “Uma medida como essa pode se refletir até em lutas corporais dos moradores de rua com os guardas. Eles vão retirar o único pertence que eles possuem, que é um cobertor”, lamentou.

Em junho de 2016, após uma série de denúncias de que guardas municipais teriam recolhido cobertores e papelões de sem-teto durante frio recorde na cidade, Haddad redigiu o documento em parceria com a Defensoria Pública e com movimentos de pessoas em situação de rua e reforçou a proibição da retirada de pertences pessoais.

Desde então, a prática, que era considerada comum, reduziu, de acordo com o membro da Pastoral do Povo de Rua, padre Júlio Lancelloti. “É uma prática de muitos anos que estava sendo mitigada. No dia 2 de janeiro, no entanto, já houve uma ação na prefeitura regional da Mooca, que ensejou uma reunião com a prefeitura regional, a Secretaria de Assistência Social, com comandante da GCM e todos afirmam que a prática não iria continuar”, disse o padre. “Se isso voltar a ocorrer, vamos cobrar.”

O prefeito de São Paulo não explicou por que retirou do decreto o trecho que proibia o recolhimento de “itens portáteis de sobrevivência”, como cobertores e colchões, após ser questionado pela imprensa em uma visita à Vila Maria, na Zona Norte de São Paulo, durante a Operação “Mutirão Mário Covas – Calçada Nova”, realizada no domingo (22).

O novo decreto mantém a proibição de que os guardas apreendam bens pessoais, como documentos e mochilas, além de instrumentos de trabalho, como carroças. O novo texto mantém a autorização de retirada de objetos “que caracterizem estabelecimento permanente em local público”, como camas e barracas.

“Achamos uma atitude ditatorial alterar uma medida assim, sem consultar os criadores do decreto, que fomos nós e a Defensoria Pública”, diz Mendonça. “Uma medida como essa pode se refletir até em lutas corporais dos moradores de rua com os guardas. Eles vão retirar o único pertence que eles possuem, que é um cobertor”, lamentou.

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