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Entidades se mobilizam para derrubar veto de Haddad a plebiscitos para grandes obras

Lobby da construção civil teria agido nos bastidores para impedir regulamentação de lei que determina a participação da população nas decisões

arquivo/EBC

População seria chamada a decidir sobre obras de grande valor ou significativo impacto ambiental e social

São Paulo – Organizações da sociedade civil preparam uma intensa mobilização para convencer os vereadores paulistanos a derrubar o veto ao Projeto de Lei (PL) 476, de 2015, que regulamenta o artigo 10 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, que prevê a realização de plebiscitos para grandes obras. O PL foi vetado pelo prefeito, Fernando Haddad (PT), “após pressão de empresários da construção civil e de outros setores”, segundo relato do presidente da Câmara, vereador Antonio Donato (PT).

“Nós surpreendeu o veto porque a articulação não foi alheia ao Executivo municipal. Houve um grande lobby do setor da construção civil, alegando que o plebiscito iria ‘dificultar mais a vida’ em tempo de crise. Mas já são tantas licenças para grandes obras, e isso leva tempo, que não teria problema fazer plebiscito em paralelo”, defendeu Donato.

O integrante do grupo de trabalho Democracia Direta, da Rede Nossa São Paulo, que participou da articulação pela aprovação do projeto, Américo Sampaio, criticou severamente as entidades “que preferem atuar nas sombras, sem participar dos debates, sem se mostrar à população, com o objetivo de obter ganhos privados”. Para ele, o veto de Haddad foi carregado de lobby. “Um lobby, não à favor da cidade, mas do lucro, do mercado”, afirmou.

No final de novembro, o Sindicato da Construção Civil de São Paulo (Secovi) solicitou desligamento da Rede Nossa São Paulo, por discordar da defesa do projeto dos plebiscitos encampado pela organização.

O PL 476 foi aprovado por unanimidade na Câmara, em junho deste ano. O projeto foi elaborado por uma frente parlamentar com vereadores de sete partidos: PT, PSDB, PV, Rede, Psol, PSD e PSB. Essa foi a terceira tentativa de implementar essa medida, prevista na Lei Orgânica, que equivale à constituição da cidade. O ex-prefeito e atual deputado federal Paulo Maluf (1993-1996) foi o primeiro a vetar. Em 2005 foi a vez do atual ministro das Relações Exteriores, José Serra (PSDB) negar a proposta.

Ambos argumentaram de forma bem próxima ao que fez Haddad. Com pequenas distinções, todos alegaram que o projeto travaria o funcionamento da máquina pública, impondo ao poder público mais uma burocracia a ser vencida, além do custo de realizar o plebiscito, e abrindo mais uma possibilidade de questionamentos judiciais.

Segundo Sampaio, esses argumentos não são reais. “Os artigos 44 e 45 da Lei Orgânica dizem que as grandes obras ‘podem’ ser objeto de plebiscitos. E a lei federal que trata da democracia direta diz que plebiscitos ‘devem’ ser realizados junto com as eleições. Então, como isso pode atrapalhar a máquina pública? Não há sequer a obrigação de realizar o plebiscito”, afirmou.

Segundo o PL aprovado na Câmara, poderiam ser objeto de plebiscitos obras de grande valor econômico, consideradas aquelas que fossem dois desvios padrão superiores à média das demais obras. Segundo Sampaio, algo em torno de R$ 1 bilhão. Também se enquadram as obras que causem significativo impacto ambiental ou social. Para fins da Lei, consideram-se as que mudam severamente um bairro ou região em curto espaço de tempo. Os plebiscitos poderiam ser convocados pelo prefeito, pelos vereadores ou por 2% do eleitorado – cerca de 180 mil pessoas.

A batalha agora é para convencer os vereadores a derrubar o veto. Algo incomum na Câmara Municipal de São Paulo. “O executivo tradicionalmente atua para impedir as derrubadas de veto. A Câmara nem realiza mais sessão ordinária para não cair na pauta dos vetos. Tem alguns aqui desde o tempo do Jânio (Quadros, prefeito da Capital paulista entre 1985 e 1989)”, disse Donato.

As organizações pretendem atuar nos últimos dias da atual legislatura para aproveitar certo “vácuo de poder”, quando a base do prefeito anterior está desarticulada, mas a do novo ainda não se estabeleceu. A favor deles têm o fato de que o projeto foi aprovado por unanimidade e rechaçado pelo Executivo. “É preciso que isso vire um problema. Que se torne pauta da população. Essa Casa funciona melhor de fora pra dentro”, afirmou Donato.

A Câmara entre em recesso após a votação do orçamento municipal, que deve ocorrer até o dia 23 deste mês.

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