contra violadores

Organizações de direitos humanos esperam mudanças da PM de Alckmin após punição

Para Conectas e Artigo 19, a sentença condenatória ao estado por uso indevido de força é positiva: 'Primeira vez que uma instituição do Estado reconhece que as polícias têm cometido violações'

Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo

Para a Conectas, decisão ‘passa um claro recado à Polícia Militar e ao governo do estado de São Paulo’

São Paulo – “A decisão judicial é extremamente positiva, pois parte de uma compreensão alinhada com os principais padrões internacionais de direitos humanos”, afirmou em nota a advogada Camila Marques, da ONG de defesa de direitos humanos Artigo 19, sobre a sentença que condenou a gestão de Geraldo Alckmin por uso indevido de força policial nas manifestações de junho de 2013. A Justiça determinou uma multa de R$ 8 milhões além de cobrar uma correção de procedimentos da Polícia Militar.

“Trata-se ainda da primeira vez que uma instituição do Estado brasileiro reconhece, de maneira significativa, algo que toda a sociedade tem testemunhado: que as forças policiais têm cometido graves violações de direito de manifestação e à liberdade de expressão”, completou. A Artigo 19 fez parte do pedido de punição ao estado, como parte interessada, assinado pela Defensoria Pública de São Paulo.

A avaliação positiva também é compartilhada pela outra parte integrante do processo, a organização não governamental Conectas Direitos Humanos. “As forças de segurança do estado não possuem carta branca para violar direitos”, afirmou Rafael Custódio, coordenador do programa de Justiça da Conectas, sobre a decisão que considerou “histórica” e que “passa um claro recado à Polícia Militar e ao governo do estado de São Paulo”.

“O papel da PM em protestos é preservar o direito constitucional de reunião e de livre manifestação, isolando eventuais excessos de manifestantes, mas nunca por isso dispersando o protesto”, disse Custódio. Entre as correções de procedimento exigidas pela Justiça estão o fim do uso de balas de borracha e gás lacrimogêneo, a não ser em “situação excepcionalíssima”, em que a violência tenha virado regra no ato. Fica também imposto que a PM deve informar ao público as circunstâncias de sua atuação e que os policiais devem estar todos identificados. Filmagens da PM também devem estar disponíveis para consultas.

“Infelizmente, o que notamos foi sempre uma atitude arbitrária e desproporcional do uso da força no sentido de intimidar e pôr fim aos protestos, sempre sob argumento de vandalismo, mas que bem sabemos que eram direcionados a determinados espectros políticos e não outros”, afirma Custódio. A utilização política da força policial também foi alvo da sentença proferida pelo juiz Valentino Andrade. “Tolerar, pois que o governo do estado de São Paulo adote um plano de atuação de sua Polícia Militar que quiser adotar como se fosse uma coisa dele, desrespeitando os direitos fundamentais como os direitos de livre manifestação é viver em um Estado que não pode ser chamado de Estado Democrático de Direito”, disse Andrade em seu argumento judicial.

No dia anterior, em outra corte

A decisão da Justiça foi decretada na quarta-feira (19) pela 10ª Vara da Fazenda Pública da Capital. No dia anterior, a 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo havia adiado o julgamento de uma liminar da Procuradoria-Geral do Estado sobre outra liminar obtida anteriormente pela Defensoria. Na prática, o Tribunal de Justiça (TJ) poderia ter decidido sobre a utilização de armamento não letal em protestos, além da criação de um protocolo a ser adotado pela polícia.

Entretanto, a decisão de Andrade agora deve prevalecer ao julgamento do TJ que, na ocasião, alegou “falta de interesse processual” para não dar andamento à discussão.

“Essa decisão é relevante porque o Judiciário vinha adotando uma postura de criminalização de protestos em suas últimas decisões, chegando inclusive a culpabilizar vítimas da violência policial.Os casos mais ilustres são os dos fotógrafos Alex Silveira e Sérgio Silva, que foram considerados responsáveis por terem sido atingidos nos olhos por balas de borrachas”, afirmou Camila.

“Esperamos que, a partir dessa decisão, o governo do estado finalmente se disponha a dialogar com a sociedade, apresentando protocolos claros de como a polícia deve atuar. E que cenas de violência, como jornalistas e manifestantes cegos pela polícia, fiquem no passado”, disse Custódio, fortalecendo o discurso da advogada.