ABC

Para Grana, adversário usa antipetismo para não discutir projetos

Candidato à reeleição em Santo André afirma que adversário aposta todas as fichas no 'ódio contra o PT', mas diz confiar no corpo a corpo com os eleitores para discutir realizações e reverter pesquisas

Diego Barros

Grana: ‘Estamos investindo em uma nova geração, formando cidadãos mais preparados e participativos’

São Paulo – Para o atual prefeito e candidato à reeleição de Santo André, no ABC paulista, Carlos Grana (PT), o segundo turno deste ano traz um terceiro elemento para o cenário eleitoral: ataques ainda mais “fulminantes” contra o PT por parte dos opositores, aproveitando da campanha nacional promovida pela imprensa tradicional. “Nossos adversários têm fomentado o ódio contra o PT, jogando todas as suas fichas nisso. O discurso é: ‘Já tiramos Dilma, agora vamos tirar o PT de Santo André’. Esse é o centro do ataque realizado a todo momento pelo meu adversário (Paulo Serra, do PSDB).”

Para ele, as dificuldades enfrentadas pelos candidatos de seu partido vêm menos das falhas da legenda para comunicar as ações realizadas nos governos petistas, mas sim de “fatores externos” que polarizam ainda mais a disputa. “Vamos lembrar que no primeiro turno foi anunciada a prisão de Guido Mantega (ex-ministro do Planejamento, com Lula, e da Fazenda, com Dilma), Antônio Palocci (ministro da Fazenda, com Lula, e da Casa Civil, no governo Dilma). Criou-se clima de terror.”

Em entrevista à RBA, Grana observa que a desindustrialização do município é um elemento que influencia na criação de um eleitorado menos alinhado com as pautas da classe trabalhadora. “Hoje, parte considerável dos trabalhadores (de Santo André) não está na produção, mas nos serviços. Isso influencia em uma forma mais individualista de lidar com o trabalho e com a sociedade, e com certeza tem impacto na política também. O operário convive em relações de trabalho mais coletivas”, diz.

“No segundo turno as regras são diferentes. Um dado interessante é que quase metade de cidade não votou: dos 560 mil eleitores, 47% se abstiveram ou votaram nulo ou branco. Por isso o segundo turno está aberto. Temos confiança na possibilidade real de invertermos o resultado. Acreditamos nessa discussão mais programática do destino da cidade e é nisso que estamos apostando.”

Confira a entrevista:

No primeiro turno, o candidato tucano, Paulinho Serra, foi o mais votado, com 35,85% dos votos válidos. O senhor chegou ao segundo turno com o apoio de 20,28% dos eleitores. Qual tem sido sua estratégia nessa etapa da campanha, já que o primeiro turno apontou preferência do eleitor pelo seu adversário?

O segundo turno é outra eleição. No primeiro você tem a disputa dos candidatos proporcionais. Aqui em Santo André tivemos mais de 500 candidatos a vereador e sete candidatos a prefeito. No segundo turno é possível discutir com mais profundidade porque são só dois candidatos na disputa.

De um lado estamos nós, com tudo o que representa o PT em Santo André, com duas gestões do Celso Daniel, uma de João Avamileno e a minha gestão, que está sendo avaliada pela população. Além disso, neste ano tivemos as novas regras das eleições, com um período menor de campanha, que antes era de 90 dias e agora é de 45, e a mudança, na minha opinião positiva, de não permitir financiamento empresarial de campanha. Foi uma experiência nova.

No primeiro turno indiscutivelmente teve uma influência da votação na capital até porque o ABC não tem canal aberto para propaganda eleitoral gratuita. No segundo turno as regras são diferentes. Outro dado interessante é que quase metade de cidade não votou: dos 560 mil eleitores, 47% se abstiveram ou votaram nulo ou branco. Por isso o segundo turno está aberto. Temos confiança na possibilidade real de invertemos o resultado. Acreditados nessa discussão mais programática do destino da cidade e é nisso que estamos apostando.

O fundamental no nosso trabalho é o corpo a corpo, passar de casa em casa e aproveitar também as redes sociais, que têm sido uma alavanca importante para informar as pessoas, já que não há acompanhamento da grande mídia. Tivemos dois debates, na rádio Bandeirantes e na Record News (de TV por assinatura) e temos a previsão de mais três, mas aparentemente meu opositor está fugindo porque não foi bem nesse embate direto.

É importante contextualizar que ele (Paulo Serra) foi meu secretário (de Mobilidade Urbana, Obras e Serviços Públicos) por quase três anos. Está há 12 anos na vida política, foi vereador por oito anos e, em 2012, foi abandonado pelo PSDB. Ficou sem legenda, eu o trouxe para a campanha, para o governo e, ano passado, mudou de cara e se reintegrou ao PSDB. Ele já passou por quatro partidos: PFL, PSDB, PSD e agora voltou para o PSDB. Fidelidade partidária não faz parte dessa trajetória.

Ele tem um discurso que quer se aproximar de João Dória (PSDB), dizendo que é uma cara nova, com um projeto novo, mas que é um modelo de política tradicional, apoiado por uma boa parte da elite da cidade.

A crise política no país, que seletivamente tem como alvo o PT, tem sido um grande desafio na campanha? Outras questões locais também pesam?

Nossos adversários se aproveitaram muito para fomentar o ódio contra o PT, jogando todas as suas fichas nisso. O discurso é: “Já tiramos Dilma, agora vamos tirar o PT de Santo André”. Esse é o centro do ataque realizado a todo momento pelo meu adversário, querendo aproveitar a rejeição em relação à conjuntura nacional.

São ataques fulminantes, embora nosso governo seja aprovado. Mesmo com toda essa crise econômica realizamos muito e trouxemos melhorias em todas as áreas, como creche, serviços de saúde e equipamentos de segurança. Entregamos quase 3 mil moradias e retiramos pessoas que moravam em áreas de risco. Santo André praticamente não tem mais morador de área de risco. Hoje eles estão no aluguel social ou em moradias do Minha Casa, Minha Vida. Tivemos uma boa avaliação, por isso estão apostando nesse ódio contra o PT.

A cidade tem uma história de alternância de poder entre progressistas e conservadores desde o início da redemocratização, com Lincoln Grillo (MDB), em 1978. As três eleições de Celso Daniel (1988, 1996 e 2000), com a última concluída por João Avamileno, depois reeleito, foram uma exceção de continuidade. Com esse legado, porque o PT não conseguiu se firmar como referência na cidade? Por que tem de enfrentar agora, mais do que o adversário, a rejeição?

A cidade é muito polarizada. Tem 30% que ama o PT, 30% que odeia e no meio fica esse movimento que, ora firma posição a favor do PT, ora contra. Nos últimos 30 anos sempre foi assim. Os indecisos se movimentam pelo momento. Há também uma influência da capital: quando Erundina ganhou em São Paulo, Celso ganhou aqui, quanto Marta ganhou, ele ganhou de novo, quando eu ganhei, Haddad ganhou. Muita gente tem a vida cotidiana colada com São Paulo: mora aqui, mas trabalha, estuda ou tem vida cultural lá. É uma influência direta na cidade.

O PT não assimilou a importância da comunicação?

Acho que fez relativamente bem essa divulgação das realizações, mas o que leva a essa disputa polarizada não passa pela avaliação do governo, passa por um conjunto de fatores externos. Vamos lembrar que, dias antes do primeiro turno, teve a prisão do Mantega e do Palocci e foi “anunciada” a de Lula. Criou-se um clima de terror.

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‘PEC 241 será nefasta. Municípios não têm capacidade de novos investimentos’

Dos três prefeitos petistas, dois, o senhor e Avamileno, têm origem operária. Sem contar os vices – Ivete Garcia e José Cicote –, também crias do movimento operário. A desindustrialização na região do ABC, em Santo André particularmente, estaria formando na região um eleitorado menos classista?

Eu creio que sim. O setor de produção tem hoje uma presença menor na economia local. A indústria perdeu peso, isso desde a década de 1980, em um processo que se intensificou em 1990 e agora mais ainda. Os setores de serviços e o comércio tiveram ascensão grande na cidade, causando uma mudança do perfil econômico. Isso é fato. Hoje, parte considerável da classe trabalhadora não está na produção, mas nos serviços.

Isso influencia em uma forma mais individualista de lidar com o trabalho e com a sociedade que, com certeza, tem impacto na política também. O operário está convivendo em relações de trabalho mais coletivas. Hoje, o serviço individualizado cresceu. Além disso, os sindicatos perderam força e estão, todos, bem menores que no passado.

Das prioridades com as quais você se comprometeu na campanha em 2012, quais você conseguiu realizar?

Retomar o diálogo na cidade que havia sido interrompido. Fizemos o PPA (Plano Pluri Anual) participativo, o Orçamento Participativo (OP), retomando dezenas de conselhos municipais e criamos uma grande inovação que é o OP Criança. Os 35 mil alunos de 4 a 10 anos da nossa rede também participam. Eles decidem duas prioridades, uma para a cidade e outra para a escola, e levam ao gabinete do prefeito. Recebo todos, organizados em uma comissão de 20 crianças. Essa iniciativa levou a cidade a receber o prêmio de Prefeito Amigo da Criança, em 2016. Estamos investindo em uma geração, estamos formando cidadãos muito mais preparados e participativos.

Quais suas maiores frustrações em sua gestão e por que acha que não conseguiu realizá-las?

O problema dessa gestão foi a falta do financiamento que vinha do governo federal e que depois da conjuntura nacional de 2015 ficaram praticamente parados. Conseguimos dar continuidade a alguns projetos, mas a outros não, como a construção da estação de tratamento de água da cidade. Conseguimos tudo: terreno, licitação, captação de água da represa Billings, definição do consórcio. Só faltou o financiamento, que seria um empréstimo de R$ 89 bilhões via FGTS e que não foi liberado. Fizemos nossa parte, mas não veio recurso.

Estamos confiantes de recuperar esse projeto nesse segundo mandato porque Santo André é muito dependente da Sabesp. O Semasa (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André) é uma empresa de distribuição e só produz 5% da água que se consome no município.

Como solucionar a questão orçamentária da cidade? A prefeitura deve R$ 3 bilhões para a Sabesp. É uma dívida muito alta. A Sabesp de fato pode encampar o Semasa?

Existe uma disputa desde 1992 em relação ao preço que é cobrado pelo metro cúbico da água no atacado entre o Semasa e a Sabesp. Nós pagamos o preço que achamos justo e já entramos no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para ter um parecer a respeito.

A Sabesp defende a tese que nós temos uma dívida de R$ 3 bilhões, mas ela não foi ainda julgada. O Semasa vale mais de R$ 10 bilhões. Agora, se o prefeito e a Câmara Municipal forem frágeis, é possível sim que a Sabesp encampe o Semasa. Em outras cidades isso já ocorreu, principalmente se a gestão tem uma lógica mais privatista.

A Sabesp não é uma empresa pública, ela tem participação privada, com ações na Bolsa de Valores. Ela visa ao lucro. E tem mais: o Semasa não só distribui água, ele presta outros serviços e estes ficariam como? Coleta de lixo, varrição de ruas, liberação de licenças ambientais… Quem vai cuidar desses serviços? A Sabesp só manda água e conta. O município teria uma perda muito grande porque teria ter que tirar dinheiro de outras áreas para dar conta desses serviços.

De que modo a PEC 241, que impõe limites de gastos públicos em todas as áreas, pode afetar os futuros prefeitos, não só em Santo André, caso venha a ser ratificada pelo Senado?

É fulminante. Os municípios estão em um padrão orçamentário e de serviços que não têm capacidade de novos investimentos. Também não têm capacidade de aumentar tributos. Então, o governo federal é o único caminho dos municípios para trazer novos investimentos. Quando ele congela os recursos, está deixando claro para os municípios que não vai mais ter financiamento, sendo que anualmente se tem mais demandas por serviços, já que a população cresce e tem novas exigências. Será nefasto.

Voltando a falar da cidade. O que está acontecendo com as ciclovias? Por que os contratos devem ser readequados?

Temos duas modalidades: as ciclofaixas de lazer, que funcionam aos domingos, com quase 10 quilômetros no centro expandido. Ela tem um custo alto e permanente e, se não tiver financiamento privado, não temos como mantê-la. Já tivemos um primeiro contrato e agora temos um segundo, no qual readequamos o valor para 30% menos do inicial.

Quanto à ciclovia, ela já está instalada e não tem custo, a não ser o de varrição. Temos a grande ciclovia que interliga a região do Pedroso com o terminal ferroviário, porque muita gente usa a bicicleta como elemento de trabalho. Dessa ciclovia, sete quilômetros foram contratados pela prefeitura e três quilômetros foram contrapartida da empresa Brookfield, que concluiu a obra do Shopping Aston. Nessa faixa não haverá alteração. Temos muita dificuldade de ter um programa amplo de ciclovia por conta do relevo da cidade.

Houve um problema com uma das empresas prestadoras do serviço de transporte poucos dias antes do primeiro turno. O que ocorreu?

Em 23 de setembro, uma das empresas que presta serviço de transporte na cidade entregou um ofício à prefeitura avisando que interromperia a sua operação do dia 30, dois antes da eleição. Foi uma grande tentativa de golpe, mas conseguimos que essa estratégia fosse desativada. Foi atitude eleitoreira, porque parte dos apoiadores do meu opositor é ligado aos empresários de ônibus da cidade, que tentaram desestabilizar o serviço.

A empresa era responsável pelo transporte de 25% dos nossos 240 mil passageiros diários. São pelo menos 60 mil pessoas que iriam ficar sem transporte do dia para a noite e a culpa seria do prefeito.

Fui dialogar pessoalmente com os motoristas e eles aceitaram aguardar 14 dias sem salário até a situação se regularizar. Dia 3, assim que voltei para a prefeitura, contratei uma empresa emergencialmente. Convidei 26 empresas da região, apenas quatro compareceram e delas somente uma aceitou o contrato de concessão emergencial por 180 dias e conseguimos normalizar o serviço. A empresa contratou os mesmos trabalhadores da anterior, como havíamos prometido para eles.

Colaboraram Helder Lima e Paulo Donizetti de Souza