urbanismo

‘Nosso grande problema não é o déficit de moradia, mas sim o déficit de cidade’

Arquiteta Raquel Rolnik diz que produção massiva de moradias, transforadas em mercadoria, não atende às necessidades das pessoas

Guilherme Santos/Sul21

‘Se for no México ou na China, encontrará milhões de casas e apartamentos vazios, e muita gente sem lugar para morar’

Sul21 – Entre 2008 e 2014, a urbanista Raquel Rolnik, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP), foi Relatora Especial para o Direito à Moradia Adequada do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Nesta condição, Rolnik viajou pelo mundo e conheceu de perto a realidade das políticas habitacionais de diversos países. E fez isso justamente no período da crise financeiro-hipotecária de 2007-2008 que teve um grande impacto na economia mundial e, especialmente, na vida de milhares de pessoas que perderam suas casas por não conseguir pagar as hipotecas. Enquanto essas pessoas foram para a rua e ainda ficaram devendo para os bancos, estes receberam uma bilionária injeção de dinheiro público para não irem à falência.

No dia 8 de junho, Raquel Rolnik esteve em Porto Alegre participando de um debate na Faculdade de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) sobre o seu mais recente livro, “Guerra dos Lugares. A colonização da terra e da moradia na era das finanças” (Boitempo Editorial). Antes do debate, a urbanista visitou a Ocupação Lanceiros Negros, no centro de Porto Alegre, onde conversou com moradores e com um grupo de jornalistas. Nesta conversa, Raquel Rolnik falou sobre o que define como uma “nova colonização” que transformou a habitação em uma mercadoria e um ativo financeiro. Esse modelo é caracterizado, segundo ela, pela produção massiva de moradias que não atendem, necessariamente, as necessidades das pessoas. “Se você for no México ou na Chin, hoje, encontrará milhões de casas e apartamentos vazios, e muita gente sem um lugar para morar ou vivendo em assentamentos informais”, relata.

A urbanista também fala sobre a situação da política habitacional no Brasil e defende que o problema principal enfrentado pelo país não é o de déficit de moradia. “Isso é uma falácia. Nós temos um problema de déficit de cidade. Não temos produção de cidade suficiente para acolher a totalidade das pessoas”, defende.

Como consultora da ONU para o tema da moradia digna, você conheceu de perto a realidade habitacional de muitos países. A partir dessa experiência, qual a sua avaliação sobre o atual estágio das políticas habitacionais?

A ideia de implantar programas habitacionais massivos de construção de moradias, em nome da ideia de fazer moradias de interesse social, foi implantada mundialmente nas últimas décadas, com resultados muito parecidos. Se você for ao México hoje, na região metropolitana do Distrito Federal, encontrará milhões de casas vazias. Se você for a China, encontrará milhões de casas e apartamentos vazios. Ao mesmo tempo, encontrará muita gente sem um lugar para morar ou vivendo em assentamentos informais construídos pelas próprias pessoas, o que está aumentando cada vez mais. Esse é um fenômeno mundial, especialmente nos países do Sul global, na América Latina, na África e na Ásia. Nestas regiões encontramos essa contradição, uma espécie de descolamento entre o processo de produção do espaço construído e as necessidades das pessoas. Essas duas dimensões tornaram-se coisas completamente independentes, como se fazer cidades não tivesse como objetivo principal satisfazer as necessidades das pessoas.

Leia a entrevista completa no portal Sul21

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