TIROS, BOMBAS E SURRAS

Violência policial liquida primeiro ato contra o aumento das tarifas em São Paulo

Apesar da forte repressão, o Movimento Passe Livre já marcou nova manifestação para a próxima terça-feira (12) e garante que não sairá da rua até barrar o aumento

Paulo Pinto/Fotos Públicas

Concentração começou pacífica em frente ao Teatro Municipal. Contingente policial foi desproporcional

São Paulo – Na primeira grande manifestação do ano na capital paulista, a Polícia Militar mostrou ontem (8) que nada mudou em relação à repressão aos movimentos sociais jovens. O primeiro ato contra o aumento das tarifas de Metrô, trens e ônibus de R$ 3,50 para R$ R$ 3,80, organizado pelo Movimento Passe Livre (MPL) terminou em uma chuva de bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha e viaturas policiais a toda velocidade pelas ruas do centro de São Paulo, e com várias pessoas detidas e feridas – inclusive policiais. O MPL estimou em 10 mil pessoas o engajamento no ato.

O centro de São Paulo se tornou uma praça de guerra e mesmo quem estava apenas voltando para casa após o trabalho de 2016 ficou aterrorizado com a quantidade de bombas e balas de borracha disparadas pela Tropa de Choque na região do Viaduto do Chá. Muitos PMs usavam máscaras para cobrir o rosto e identificação alfanumérica. Pessoas imploravam para entrar na estação Anhangabaú, da Linha 3-Vermelha do Metrô, fechada pelos funcionários após o início da repressão.

Segundo a militante do MPL Laura Vieira, pelo menos dez manifestantes foram detidos e muitas pessoas se feriram. A PM não informou o número de manifestantes detidos. Alguns policiais também se machucaram, atingidos por pedras. “A PM atacou o ato gratuitamente. Foi uma repressão muito violenta, mas que só vai fazer crescer a nossa mobilização contra o aumento das tarifas”, disse Laura, que anunciou novo ato na próxima terça-feira (12), as 17h, ainda sem local definido.

Desde a saída do ato do Teatro Municipal, onde os manifestantes se concentraram, o que se viu foi um jogo de gato e rato com a PM, que reuniu um grande efetivo de agentes da Tropa de Choque, da Força Tática e das Rondas Ostensivas com Apoio de Motocicletas (Rocam) e seguiu o protesto ostensivamente em duas filas laterais. Sem revelar o destino final da marcha, os ativistas seguiram primeiro para o Largo do Paissandu. Depois paravam em toda esquina, parecendo redefinir por onde seguir. O que fazia os policiais que seguiam terem de correr para recompor a formação a todo momento.

Cris Faga/Fox Press Photo/Folhapressrepressão
Repressão começou na Avenida 23 de Maio, próximo ao terminal Bandeira, e se alastrou pelo centro

Enfim, a marcha seguiu pelo Vale do Anhangabaú, sem nenhum incidente de depredação ou confusão. A caminho do Terminal Bandeira, um grupo de manifestantes mascarados tentou tomar o sentido centro da via, em direção à prefeitura de São Paulo. A PM fechou o cerco sobre eles. Bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha foram disparadas na direção dos demais manifestantes. Vários foram feridos, um deles com um tiro de bala de borracha no rosto.

Houve muita correria e parte dos ativistas revidou com pedras e rojões contra a PM. Um grupo de policiais ficou isolado do Batalhão de Choque e tentou se defender das pedradas com escudos. Alguns policiais ficaram feridos. Pequenos grupos de manifestantes correram em várias direções e foram perseguidos pela Tropa de Choque.

A PM lançou bombas contra cidadãos que cruzavam a passarela do Terminal Bandeira. E também em direção ao Viaduto do Chá – do Vale do Anhangabaú – e à Rua Xavier de Toledo – da Ladeira da Memória –, sem ter como observar quem seria atingido. Muitas pessoas que voltavam para casa do trabalho foram atingidas pelo gás lacrimogêneo.

Parte dos manifestantes percorreu as ruas do centro espalhando lixo e ateando fogo, depredando ônibus, carros da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) e agências bancárias. Todas as lojas da região fecharam as portas. A polícia cercou um grupo grande na Rua da Consolação, que foi reprimido com bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha e cassetetes.

Os PMs utilizaram a Praça Roosevelt como praça de detenção. E ali protagonizaram uma cena de pura violência. Skatistas, transeuntes e alguns manifestantes estavam parados na praça quando dois veículos da Tropa de Choque, recém-comprados de Israel pelo governo de Geraldo Alckmin (PSDB), pararam e os policiais desceram atirando balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo contra todos que ali estavam, provocando correria. Em seguida, voltaram aos veículos e partiram. Viaturas subiam e desciam as ruas da região central em alta velocidade a todo momento.

manobra.jpgConfira o vídeo Nove Passos para Forjar uma Evidência, postado numa rede social do coletivo Jornalistas Livres. Durante ação policial, quatro estudantes foram revistados e interrogados. Um PM colocou na mochila de um deles um material suspeito, tido como explosivo, que havia sido encontrado junto a um poste. Um dos meninos, Matheus Machado Xavier, encontra-se agora na 78 DP.

Contra a tarifa

O ato reuniu milhares de manifestantes, entre ativistas de diversos movimentos, estudantes secundaristas – que no final do ano passado barraram a reorganização escolar proposta pelo governador de São Paulo – e sindicalistas.

Segundo a militante do MPL Laura Vieira, o objetivo dos protestos é reverter o aumento de R$ 3,50 para 3,80. “Não vamos sair da rua enquanto não atingirmos esse objetivo. E não adianta dizer que o aumento é abaixo da inflação ou que é uma parcela pequena que vai ser afetada por isso. Não combatemos a ação de um governo, mas uma política que prioriza o lucro dos empresários sobre o atendimento à população. Nada justifica esse valor de tarifa”, afirmou.

“Os ônibus estão sempre cheios, sempre demoram muito. Não tem um dia que o Metrô ou os trens não apresentem falhas”, completou ela, que lembrou que a tarifa é um mecanismo excludente. “Muitas pessoas não têm dinheiro para pagar a tarifa de hoje. Outras vão ser excluídas com a nova tarifa.”

O presidente do Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Altino de Melo Prazeres Júnior, destacou que o Metrô de São Paulo é um dos menores do mundo, quando comparado com outras metrópoles, e tem a tarifa proporcionalmente mais cara. “Mas esse valor não reflete na qualidade do serviço, nas condições de trabalho dos funcionários nem na expansão da malha ferroviária. É apenas extorsão de recursos da população. Nós também somos contra esse aumento e defendemos que o governo estadual subsidie a tarifa, fazendo com que ela diminua”, afirmou.

O estudante do ensino médio João Vitor Santos, de 17 anos, do Comando das Escolas em Luta, garantiu que os alunos que barraram a reorganização de Alckmin vão ajudar a barrar o aumento das tarifas. “Ainda que os estudantes tenham passe livre, que é bastante limitado, o aumento impacta na vida de todos. Aumenta o custo de vida, prejudica a vida do povo”, afirmou.

Segundo a Secretaria Municipal de Transportes, responsável pelos ônibus municipais, e a Secretaria Estadual dos Transportes Metropolitanos, responsável pelo transporte dos metrôs e trens estaduais, o reajuste ficou abaixo da inflação acumulada desde o último reajuste, ocorrido em 6 de janeiro de 2015. A inflação acumulada neste período foi de 10,49%, enquanto o aumento das tarifas foi estipulado em 8,57% para o bilhete unitário. A tarifa de integração entre ônibus e trilhos (metrô e trens) passarão de R$ 5,45 para R$ 5,92. Já os bilhetes temporais 24 horas, madrugador, da hora, semanal e mensal não terão seus preços aumentados.

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