pró-direitos humanos

MJ entrega esteiras de raio-X a penitenciárias para evitar revistas vexatórias

Para ter acesso aos complexos, parentes de presos são obrigados a mostrar órgãos genitais a agentes penitenciários. Governo entregará também detectores de metal a todas as unidades da federação

Regina de Grammont/ RBA

MJ também realizará capacitações de agentes penitenciários para realizar procedimentos de revista humanizada

São Paulo – O Ministério da Justiça entregará, até o final de fevereiro, 121 esteiras de raio X para penitenciárias de nove estados, para evitar a realização das chamadas revistas vexatórias, uma prática que obriga parentes de pessoas presas a tirar a roupa e mostrar os órgãos genitais para agentes penitenciários antes de entrarem nos complexos. Os demais estados e o Distrito Federal já receberam equipamentos de inspeção eletrônica durante o segundo semestre de 2015.

Além dos aparelhos de raio-X, o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) também entregará 564 portais detectores de metal, 2.614 detectores manuais de metal e 1.120 detectores de metal tipo banqueta. Nesta última etapa serão contemplados os estados de Minas Gerais, São Paulo, Bahia, Sergipe, Paraíba, Amazonas, Acre, Pará e Amapá.

O Ministério da Justiça também está realizando uma série de capacitações de agentes penitenciários em todos os estados e no Distrito Federal, para operar os equipamentos e realizar procedimentos de revista humanizada. Ao todo, o investimento do governo federal no projeto será de R$ 17 milhões.

“Ao mesmo tempo em que aumentam a segurança, impedindo que objetos não permitidos entrem nas unidades, como armas, drogas e celulares, os equipamentos vão permitir que os visitantes de pessoas presas não sejam submetidos a tratamentos que violem sua integridade”, explica a diretora de Políticas Penitenciárias do Depen, Valdirene Daufemback.

Nos procedimentos de revista vexatória mulheres têm vagina e ânus revistados, crianças precisam ficar nuas na frente de adultos desconhecidos e idosas devem superam os limites físicos da idade para conseguir abaixar e levantar sem roupa, em cima de um espelho. As práticas são consideradas humilhantes e ineficazes por movimentos sociais ligados à defesa dos direitos humanos.

“A revista íntima é muito humilhante. As funcionárias querem que coloquemos as mãos em partes íntimas do nosso corpo. O normal é abaixar três vezes de frente e três vezes de costas, mas as funcionárias nos fazem até abaixar dez vezes”, diz a mulher de um preso de São Paulo, em carta envida para a organização social Conectas Direitos Humanos. Os nomes não são divulgados para preservar as identidades.

Teoricamente, os procedimentos de revista vexatória teriam sido adotados para impedir que drogas, armas, chips ou celulares entrem nas prisões. No entanto, das visitas realizadas entre fevereiro e abril dos anos de 2010 a 2013, em São Paulo – que tem a maior população carcerária do país – houve tentativa de adentrar as unidades com drogas ou celulares em apenas 0,03% das visitas. Nenhuma pessoa tentou levar armas para os internos, segundo uma pesquisa da Rede Justiça Criminal, elaborada a partir de dados fornecidos pela própria Secretaria de Administração Penitenciária.

“A revista íntima é a pior coisa que já vi no mundo, sofro e choro com a discriminação sofrida, elas (…) pedem para eu abaixar diversas vezes e cada vez que abaixo pedem para eu me limpar e fazer força, faço o que elas mandam, pois me sinto coagida”, diz a familiar de outro interno, também por carta. “Meu filho de 3 anos tem medo delas e me pede para eu parar de chorar (…) entristecido pela humilhação que a mãe dele passa.”

A prática não está prevista na lei. Ao contrário: a Constituição Federal garante o direito à intimidade. A partir desse histórico de violações, organizações da sociedade civil que trabalham em prol dos direitos humanos se engajaram em uma série de campanhas contra a revista vexatória. Como resultado, o país já soma pelo menos dez estados que proíbem a prática e cinco em que o tema é discutido em nível municipal.

Em nível nacional, o projeto de lei que proíbe a prática (PL 7.764/2014), da ex-senadora Ana Rita (PT-ES), está na Comissão de Segurança Pública, aguardando parecer do relator, João Campos (PSDB-GO). De lá, seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça da Casa e, se aprovado, irá à sanção da presidenta Dilma Rousseff. O projeto propõe que as revistas sejam feitas por equipamentos eletrônicos detectores de metais, aparelhos de raio X ou similares.

Em novembro do ano passado, o Senado aprovou o Projeto de Lei 451/2015, de autoria do senador Eduardo Amorim (PSC-SE), que acaba com a revista vexatória dos visitantes das unidades de internação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, que recebem adolescentes em conflito com a lei. A proposta foi enviada para a Câmara dos Deputados, onde deve ser apensado ao PL 404/2015, da deputada Luiza Erundina (PSB-SP), que também pede o fim das revistas vexatórias nas unidades de internação.

A aprovação de leis, no entanto, não garante o cumprimento das medidas. Em São Paulo, por exemplo, apesar de o governador Geraldo Alckmin (PSDB) ter sancionado uma lei que proíbe as revistas vexatórias em agosto de 2014, a prática continuava ocorrendo nos presídios paulistas, como denunciou o Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo à RBA, no ano passado. A justificativa do governo estadual era a falta de scanners corporais.