ilegalidade

Falta de comunicação não justifica violência nem proibição a manifestação

Especialistas afirmam que ação da Polícia Militar contra manifestantes em São Paulo, referendada pela Secretaria da Segurança Pública, é totalmente ilegal

Rovena Rosa/Agência Brasil

PM utilizou bombas, balas de borracha, spray de pimenta e cassetetes para impedir marcha dos manifestantes

São Paulo – O argumento do governo de Geraldo Alckmin (PSDB), de que os manifestantes não respeitaram “preceitos legais” de comunicar o poder público sobre a realização e o trajeto do ato de ontem (12) contra o aumento das tarifas do transporte coletivo em São Paulo não justifica o bloqueio da manifestação. Muito menos a violenta repressão, em que dezenas de pessoa ficaram feridas e 12 foram detidas.

A advogada Jessica Carvalho Morris, diretora executiva da ONG Conectas Direitos Humanos, e o tenente-coronel da reserva da Polícia Militar (PM) paulista Adilson Paes de Souza, contestam a conduta e a explicação do governo.

O inciso 14 do artigo 5º da Constituição Federal determina que “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”.

Esse tem sido o centro do argumento do governo de Geraldo Alckmin (PSDB) para impedir manifestações organizadas pelo Movimento Passe Livre (MPL), que pretende derrubar o aumento das tarifas do transporte coletivo, de R$ 3,50 para R$ 3,80, em vigor desde o último sábado (9).

“Não se pode impedir uma manifestação porque não seguiu o trajeto determinado pelo poder público ou porque não o informou antecipadamente. O poder público devia deixar a manifestação sair, controlar os efeitos e identificar e atuar sobre os vândalos, que são minoria. O caráter da manifestação é tornar pública uma insatisfação coletiva. E é claro que para isso vai se buscar locais que chamem atenção. Limitar isso fere o direito constitucional de livre manifestação”, explicou Souza, que questiona também o argumento de que a ação policial estaria se antecipando a supostas ações de vandalismo.

Para ele, a polícia tem todas as condições de acompanhar o ato, evitar vandalismo e conter pontualmente aqueles que praticaram tais atos ou qualquer outro crime. No entanto, utilizou táticas e armamentos excessivos para a situação. O especialista observou que houve uso indiscriminado de munição química – bombas de gás lacrimogêneo e de efeito moral. E a ação da Tropa de Choque devia dispersar os manifestantes e não confiná-los para reprimi-los.

A diretora do Conectas considerou “inaceitável” a afirmação do secretário da Segurança Pública paulista, Alexandre de Moraes, de que a tática utilizada ontem, de cercar os manifestantes e determinar o trajeto que a manifestação vai seguir, “vai ser a estratégia usada em todas as manifestações” em que os ativistas não informarem previamente o trajeto.

E ressaltou que a repressão praticada contra os manifestantes viola recomendações internacionais e colocou em risco a vida de cidadãos. “Não há justificativa nenhuma para a polícia agir da forma que agiu: atacando manifestantes de forma violenta, sem nenhuma possibilidade de fuga ou proteção. Cercar daquela forma, num local onde se pode sofrer uma grave queda – a Praça do Ciclista tem uma abertura sobre o túnel que liga as Avenidas Paulista e Rebouças – usando bombas de efeito moral e balas de borracha naquela quantidade. É inaceitável”, afirmou Jéssica.

“A ação foi excessiva, desproporcional e abusiva. Fere até mesmo as normas internas da corporação”, completou Souza. “Balas de borracha foram disparadas paralelas ao solo, em altura que buscava atingir membros superiores e órgãos vitais dos manifestantes. A norma é clara sobre acertar áreas não vitais. E ser usada não para dispersar, mas para conter um agressor. O spray de pimenta não foi usado para evitar agressões, mas para impedir qualquer forma de diálogo”, disse o tenente-coronel.

Ambos cobraram uma ação mais efetiva do Ministério Público Estadual no controle externo da ação policial e na investigação e punição de agentes do Estado que cometem arbitrariedades e também sobre atos de vandalismo.

“Após a repressão de 13 de junho de 2013, as próprias autoridades reconheceram que houve excesso e prometeram punição. Até hoje não veio. Assim como o inquérito sobre os black blocs, que devia ter apurado casos de vandalismo, também não produziu nenhum resultado. O poder público devia esclarecer o que houve com essas investigações. Essa impunidade só alimenta a espiral de violência”, afirmou Souza. “O Ministério Público tem de ter maior empenho nessa que é uma atribuição constitucional”, completou a advogada.

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