tragédia ambiental

Em Mariana, famílias tentam se organizar para planejar o futuro

Segundo integrante o Movimento dos Atingidos por Barragens Alexandra Maranho, Minas Gerais tem ao menos 50 barragens em situação de alerta com risco de rompimento

Secom – ES

Desastre despejou rejeitos no Rio Doce, que abastece municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo

São Paulo – Em entrevista à Rádio Brasil Atual, a integrante do Movimento dos Atingidos por Barragens, Alexandra Maranho, afirmou hoje (17) que as famílias atingidas pelo rompimento das barragens no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana-MG, no último dia 5, começam a organizar para pensar e criar ações para o futuro. Segundo ela, a comunidade quer continuar junta, mas lembra que será impossível reconstruir a vila como era antes.

Alexandra também conta que em Minas Gerais há pelo menos 50 barragens em situação de alerta, com risco de rompimento, e diz que as duas que romperam (Fundão e Santarém) não estavam na lista do perigo. A tragédia resultou, até o momento, em 11 mortos. O desastre despejou rejeitos tóxicos de mineração no Rio Doce, que abastece municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo.

Leia os principais trechos da entrevista.

Como está a situação dos moradores da região?

O pessoal está se organizando, após passar o primeiro momento, algumas famílias ainda estão debilitadas, mas surge algum princípio de perspectiva e planejamento do futuro. Ontem houve uma audiência pública organizado pelo grupo de direitos humanos do estado com algumas famílias, e que teve a duração de seis horas. Portanto, houve várias denúncias, foi um momento importante para toda a comunidade, para poder relatar e buscar uma saída.

Algumas famílias estão mudando para casas provisórias até que se faça um reassentamento da comunidade. Demos a orientação de que, se as pessoas estivessem inseguras onde estivesse instaladas (em hotéis da região), fossem para casas.

As famílias estão requerendo a construção de um outro local onde possam morar, longe das barragens?

Sim, estão. A princípio, haviam várias conversas da empresa, por parte do Ministério Público, da prefeitura. Com o tempo e o amadurecimento, dá pra perceber que a comunidade quer continuar junta. Acredito que dá pra trabalhar em torno disso, tanto o poder público, quanto os movimentos sociais. As próprias famílias estão dando ideias de onde seriam esses locai, que seriam bons para viver como comunidade.

Após a morte de pessoas, animais, o fim da qualidade da água do rio, aé onde vai o peso da Samarco nessa irresponsabilidade?

Vai ser impossível reconstruir tudo da forma como era. É um período que vai se prolongar muito, até ser recuperado o que tinha antes e, mesmo assim, não será como era.

Um dos atingidos pela tragédia disse ontem que “não foram eles que construíram a comunidade embaixo da barragem, foi a barragem que foi construída acima deles”. É uma relação discrepante entre uma grande empresa e uma comunidade, que não é ouvida nos processos de construção de grandes obras. A comunidade não participa quando se instaura uma grande obra dessas e depois (dos acidentes) paga as consequências.

Quais são as informações sobre a possibilidade da terceira barragem se romper?

Há a outra barragem que fica próxima das que romperam que é a Germano, que é maior da América Latina. De fato, a Defesa Civil fez algumas vistorias no local, e comprovou que há rachaduras. A empresa não garante que não irá romper, então, como não somos especialistas, estamos em alerta, já que como houve o rompimento de duas, pode haver a terceira.

O Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) é responsável pela fiscalização dasbarragens, mas há poucos fiscais, ou seja, não dá para acompanhar todas as barragens. Além do quê, não é a primeira vez que acontece um rompimento…

Através de estudos, vimos que a cada dez anos, duas barragens de rejeitos se rompem. As barragens vão ficando mais velhas, mais cheias, e não há uma fiscalização efetiva sobre elas.

Em Minas Gerais, são mais de 700 barragens, e são 50 em estado de risco, sendo que as duas que romperam não estavam na lista de perigo de rompimento. De fato, não existe uma fiscalização. Na verdade há uma flexibilidade das leis ambientais.

Esse acidente serve como um marco para que se repense essas leis e a forma de construção das barragens, pois se duas rompem a cada dez anos significa que não são construídas de forma consistente e segura.

Como foi a sua reunião com a presidenta Dilma Rousseff e com o ministro Patrus Ananias?

Já havíamos conversado com as lideranças dos atingidos da região, então fizemos algumas propostas iniciais com esse grupo, sobre as demandas para a reconstrução da comunidade, o que seria necessário para que as famílias não tenham mais direitos violados.

Como já temos um processo bem longo de conversa com os governos estadual e federal, mais uma vez estivemos com a Dilma para cobrar que algumas propostas sejam efetivadas, entre elas, a participação das comunidades no processo de decisão sobre seu futuro.

Pelo nosso histórico de trabalho, sabendo como agem as empresas diante dos fatos, temos o conhecimento que as empresas buscam negociar de forma individual, o que é perigoso. Uma negociação coletiva dá mais segurança às famílias.

Já temos um longo histórico com o pessoal de Minas Gerais, com o povo que é retirado de sua terra para a construção de barragens e hidrelétricas, e que esse povo não é indenizado ou reassentado.

No Brasil, 70% dos atingidos por barragens não recebem indenização, porque nem sempre as pessoas têm a titulação da terra, pois são povos quilombolas ou ribeirinhos que não têm o título. Então, cobramos que exista um marco regulatório e uma política de tratamento para essas populações, para que possam ser reparadas.

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