política da discriminação

Prisões de jovens e negros impulsionam crescimento da população carcerária no país

'Mapa do encarceramento', que será lançado nesta quarta-feira pelo governo federal, mostra que jovens e negros predominam nas prisões do país; pesquisa derruba defesa da redução da maioridade penal

ABr

População carcerária no país passou de 296,9 mil pessoas, em 2005, para 515,4 mil em 2012, com elevação de 74%

São Paulo – O encarceramento de jovens e negros no Brasil nos últimos anos impulsionou o crescimento da população carcerária, que passou de 296,9 mil pessoas, em 2005, para 515,4 mil em 2012, com elevação de 74%.

Os jovens, ou seja, os presos com idade entre 18 e 29 anos, representam 54,8% desse universo, enquanto os negros são 60,8% do total, segundo mostra o estudo Mapa do Encarceramento – Os jovens do Brasil, que é lançado nesta quarta-feira (3), em Brasília, pelo governo federal, por meio da Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) e Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

O estudo foi conduzido pela socióloga Jacqueline Sinhoretto, da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar). “Esse crescimento tem a ver com escolhas de política criminal, com o tipo de delito que as polícias estão vigiando e que o sistema de justiça está dando prioridade. O foco é a prisão de jovens e negros. Nesse período, o encarceramento cresceu em todos os estados”, afirma Jacqueline.

A pesquisa traz um recorte racial e etário da população carcerária no país. Os dados permitem uma análise comparada com informações de ocorrências de homicídios, pondo em dúvida a eficácia do encarceramento massivo para a redução desse tipo de crime. O relatório deve ajudar o governo federal e gestões estaduais sensíveis à questão a adotar ações e políticas para reduzir a vulnerabilidade dos jovens.

“Esse crescimento foi impulsionado por crimes que não são os mais graves. A imagem de que a cadeia está lotada de monstros não condiz com a realidade que estamos mostrando na pesquisa”, afirma Jacqueline. Ela diz que os governos estaduais estão priorizando, em primeiro lugar, “prender pessoas que cometem crimes contra o patrimônio; em segundo lugar com drogas; e em terceiro lugar, crimes contra a vida”.

A pesquisa também permite questionar a redução da maioridade penal, de 18 para 16 anos, defendida pelas bancadas conservadoras do Congresso Nacional, onde tramita a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171. “Fizemos o levantamento sobre adolescentes cumprindo medidas de privação de liberdade e aí vemos que o perfil não é o que está sendo propagado pela mídia, de criminosos contumazes, de homicidas desbragados”, diz Jacqueline. Segundo ela, o perfil predominante se relaciona a crimes de pequena monta.

“Prender jovens já é o que o país está fazendo, é o que as políticas públicas estão fazendo e isso por si só não tem o potencial de reduzir o crime violento”, afirma. “A gente compara as taxas de encarceramento com as taxas de homicídio e o que vemos é que na maior parte dos estados cresceu o número de presos e poucos estados conseguiram reduzir os homicídios. Portanto, colocar os jovens na cadeia não é igual a reduzir homicídios”. Para Jacqueline, não há nenhuma lógica que leve a acreditar em efeitos positivos da redução da maioridade na criminalidade.

Jacqueline defende que a redução da maioridade vai agravar o problema do crime e da violência no Brasil. “Você vai colocar pessoas que têm um perfil vulnerável, por serem muito jovens, em prisões precárias, superlotadas, em que você tem a presença de organizações criminais, onde você tem um número de pessoas que são mortas dentro dessas prisões, que ainda é maior do que a violência que você tem nas ruas. Vai aumentar a superlotação e a força das organizações criminais para recrutarem esses jovens”, assegura.

Um dado que chama a atenção na pesquisa é o crescimento exponencial da população carcerária no estado de Minas Gerais no período, à razão de 624%. Para Jacqueline, esse aumento é uma “aberração”. Ela afirma que “a população carcerária cresceu como um todo, e num primeiro momento eles tiveram um efeito de redução de homicídios, mas no período em que analisamos o homicídio voltou a crescer, estão prendendo muito e não estão conseguindo reduzir a criminalidade”.

O dado mais preocupante, segundo a pesquisadora, é a influência da privatização do sistema carcerário, levada adiante pelo governo de Aécio Neves (PSDB). “É um detalhe preocupante, Minas é um estado que tem presídios privados e, portanto, existe um negócio em torno do crescimento do número de vagas no sistema prisional, de gente que lucra para ter muitos presos”, diz.


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