Na contramão

Pastoral social denuncia precariedade de presídios em Minas Gerais

Principais problemas se relacionam com superlotação. Movimentos sociais criticam intenção do atual governo do PT de dar sequência a PPPs do sistema prisional iniciadas nas gestões do PSDB no estado

Peu Robles/Agência Pública

Experiência de privatização durante governos do PSDB revelam que prender é mais vantajoso que julgar

Belo Horizonte – Entidades da sociedade civil estão apreensivas com o sistema prisional de Minas Gerais. Em dez anos, a população carcerária triplicou. Conforme dados da Pastoral Carcerária, em 2003, havia 14 mil presos e em 2013 o número salta para 46.500. Atualmente, a entidade estima que esse número tenha superou a marca dos 60 mil. A superlotação é um drama que vem acompanhado de violações de direitos, como maus tratos, tortura, descumprimento de ordens judiciais, ausência da Defensoria Pública nos presídios; os presos conversam com seus advogados sob a vigilância de agentes penitenciários.

Uma saída que o governo tem proposto para solucionar o déficit de vagas no sistema (26 mil) é a construção de penitenciárias no sistema de parcerias público-privadas (PPP). O estado já conta com uma experiência do tipo: o Complexo Penitenciário Público-Privado de Ribeirão das Neves, município da região metropolitana de Belo Horizonte. O novo governo estadual, encabeçado por Fernando Pimentel (PT), deseja dar continuidade à proposta do seu antecessor, Antônio Anastasia (PSDB), de construir prisões em parceria com a iniciativa privada. Segundo anúncio realizado em abril pelo secretário de Defesa Social, Bernardo Santana, haverá em princípio duas unidades para homens, uma feminina e um centro socioeducativo de internação para adolescentes em conflito com a lei. A localização está a ser definida.

Paulo Malvezzi, assessor jurídico da Pastoral Carcerária, critica a iniciativa. “Somos absolutamente contrários à privatização do sistema carcerário, seja por ser escandalosamente ilegal, seja por uma atividade estruturante do Estado (a execução penal) para um ente privado, o equivaleria a substituir a polícia ou as forças armadas por milícias privadas, seja por alimentar uma indústria bilionária que promove o encarceramento em massa e o recrudescimento penal. Sem dúvida era esperada outra postura de um governo dito progressista”, afirma Malvezzi.

O advogado Greg Andrade, egresso do sistema carcerário, hoje atua no movimento social pelas pessoas em privação de liberdade. Segundo Andrade, o preso não pode ser encarado como uma mercadoria, e tampouco a cadeia como negócio. “O cárcere jamais pode dar lucro. Talvez os mais desavisados não tenham o conhecimento das mazelas da PPP dos Presídios, mas digo que tal iniciativa é exploração de mão de obra, bem como escravidão moderna e exploração de massas”, afirma.

Inaugurado em 2013, o complexo de Neves já registra casos de fuga. O modelo cria, segundo reportagens da Agência Pública, penitenciárias privadas de fato, enquanto que em outras situações a gestão ou determinados serviços são terceirizados, como a saúde dos presos e a alimentação. A administração é do consórcio GPA (Gestores Prisionais Associados), composto por cinco empresas: CCI Construções, Construtora Augusto Velloso, Empresa Tejofran de Saneamento e Serviços Ltda, N.F Motta Construções e Comércio e Instituto Nacional de Administração Prisional. Além de construir a penitenciária, o consórcio vai administrá-la pelos próximos 25 anos e receber, por preso, R$ 2.700 mensais.

Alternativas viáveis

Segundo Paulo Malvezzi, o que preocupa no sistema carcerário mineiro, além da superlotação e do índice alto de prisões provisórias (49%), são os números que podem não chegar aos conhecimento público ou que são muito pouco divulgados. “Quantos presos sofrem agressões nos presídios mineiros? Quantos presos morrem violentamente ou por falta de atendimento médico? Quantos estão tendo seu direito de progressão de regime, indulto e remissão de pena sonegados pela lentidão judicial e falta de atendimento jurídico? Se os números revelados assustam, aqueles que permanecem ocultos nos assombram ainda mais”, reitera.

Na sua visão, a saída da crise está em mudar radicalmente os pressupostos da política carcerária e da segurança pública. “Apostar na construção de novas vagas é correr atrás do próprio rabo. Não há falta de vagas, e sim excesso de presos. Precisamos pensar na despenalização de condutas, em especial aquelas relacionadas com a política de drogas, restringir ao máximo o uso de prisões cautelares, ampliação das garantias da execução penal, abertura do cárcere para a sociedade com mecanismos de controle e participação popular, entre outras tantas propostas. Em Minas Gerais, o primeiro passo seria uma pactuação entre Executivo, Judiciário e Legislativo, visando uma redução drástica da população prisional, com medidas de curto e médio prazo já apontadas em nota pública da Pastoral Carcerária.

Greg Andrade aposta nesse mesmo caminho. “Enquanto não chega o dia no qual não precisemos punir nosso semelhante com penas de segregação do convívio social, podemos ir exercitando a justiça restaurativa, auto-composição, mediação de conflitos e outras alternativas. Não será prendendo, e ganhando dinheiro com a miséria alheia, que conseguiremos uma sociedade mais justa e solidária”, afirma.

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