na avenida paulista

Ato contra decisão que suspende construção de ciclovias agrega usuários em SP

Em manifesto, mais de 20 entidades que militam por uma política pública cicloviária classificam a decisão da Justiça como 'retrocesso' e prometem mobilização

Paulo Pinto/ Fotos Públicas

Decisão acatou argumentação do MPE de que a prefeitura não apresentou os projetos básico e executivo

São Paulo – Ciclistas e cicloativistas protestaram ontem (19), na Avenida Paulista, na Praça do Ciclista, contra a decisão da Justiça de São Paulo, que determinou a paralisação de novas obras de ciclovia, na capital. O ato foi realizado por cerca de 300 ciclistas. Segundo a Polícia Militar, 80 manifestantes estiveram presentes.

Daniel Guth, diretor da Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade), entidade que defende e promove o uso de bicicletas, e colaborou na organização do ato, conta que muitos estiveram pela primeira vez em uma manifestação desse tipo, o que, segundo ele, demonstra o surgimento de novos usuários, a partir da ampliação das ciclovias. O grupo percorreu todas as ‘ghost bikes’, na Avenida Paulista, que prestam homenagem a usuários de bicicletas que foram mortos no trânsito, como forma de conscientização de novos usuários.

A decisão, em caráter liminar, acatou, parcialmente, a argumentação do Ministério Público Estadual (MPE) de que a prefeitura não apresentou os projetos básico e executivo, nem realizou audiências públicas para a implementação das ciclovias na cidade. A medida deixa de fora a construção da faixa para bicicletas que está sendo feita na Avenida Paulista.

Thiago Benicchio, gerente de transportes ativos do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP – sigla em inglês), vê a decisão da Justiça com “certa preocupação”, e faz questão de lembrar o prêmio recebido pela prefeitura, concedido por entidades internacionais há mais de dez anos para inovações urbanas em destaque, em todo o mundo, por conta do projeto de expansão da malha cicloviária.

“A gente acredita que este é o caminho para todas as cidades do mundo que querem melhorar a mobilidade urbana”, diz Benicchio, acrescentando que esse tipo de retrocesso é muito raro de acontecer, comparado a outros casos semelhantes no mundo.

As reações da sociedade são naturais, do pessoal que está perdendo as vagas, o pessoal que acha que está prejudicando o trânsito. Mas a justiça se colocar a favor desse lado e bloquear um processo de melhoria, a gente vê com preocupação e coloca a cidade em um sentido contrário, faz a gente andar para trás”, destaca o gerente do ITDP.

Para Daniel Guth, a decisão da Justiça foi um “golpe”, pois questiona toda a política pública para o setor. “Está colocando muita coisa em xeque, inclusive a vida das pessoas, e com isso não se pode brincar”. O diretor da Ciclocidade teme pelo surgimento de novos “ghost bikes”, caso a medida seja mantida.

Ele também diz que “a animosidade político-partidárias tem contribuído (para acirrar os ânimos), sim. É muito grave parte da sociedade politizar a questão, que a ciclovia é coisa do PT, é coisa do Haddad. Não. Bicicleta é apartidária”. Ele também destaca que a prefeitura está “cumprindo o que está na lei. Coisa que outros não cumpriram. Não é uma benesse. São políticas, do ponto de vista ideológico, que mexem com questões muito profundas, de privilégio, de um século de dominação da indústria automobilística. Um rico ou um pobre, em cima de uma bicicleta, são iguais”.

A Ciclocidades, juntamente a outras 22 organizações que defendem o uso das bicicletas, divulgou um manifesto em que classificam a decisão como “retrocesso”.

“Queremos melhorar a política cicloviária paulistana e transformá-la em uma política de Estado. Entendemos que há erros pontuais na implantação, mas o programa é uma exigência legal amparada por legislações federais, estaduais e municipais, e não aceitaremos nenhum passo no sentido contrário ao de uma cidade mais ciclável, humana, segura, inclusiva e justa”, diz o documento.

Segundo o manifesto, a decisão da Justiça “questiona não apenas o método de implantação de tais estruturas, mas a importância da política pública em si”, e que os avanços conquistados, em especial no último ano, com a malha cicloviária saltando de 63 quilômetros para 200, “não pode ser colocado em xeque mediante uma liminar unilateral e profundamente questionável”.

Os cicloativistas reconhecem “problemas e casos pontuais” na implementação das ciclovias e ciclofaixas, cobram a solução, mas afirmam que “tais falhas não deveriam comprometer a política pública em si”, como sugere a ação do MPE.

Os entrevistados refutam  o argumento de que faltou diálogo sobre a implementação das ciclovias, afirmam que a política conta com respaldo popular e lembram que a medida foi apresentada pelo então candidato Fernando Haddad, durante sua campanha, incluída no Plano de Metas apresentado pela prefeitura e discutida em Conselho de Transporte da cidade em audiências públicas.

Os representantes da Ciclocidade e do ITDP acreditam que a decisão deve ser derrubada, em instância superior, quando a prefeitura recorrer da medida, mas Daniel afirma que os ciclistas se preparam para o pior cenário. Por meio de uma petição à Justiça, a Ciclocidade pede que seja incluída como parte interessada no processo.

Daniel Guth destaca ainda a necessidade de mobilização: “Quando nós temos políticas públicas importantes sendo questionadas, colocadas em xeque, só as ruas para que a gente possa ser ouvido e fazer valer o nosso direito de garantir aquilo que o arcabouço de legislações já nos garante”.

Os grupos e entidades que defendem a política cicloviária na cidade marcaram novo protesto para a próxima sexta-feira (27), às 19h, novamente na Praça do Ciclista.

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