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Conselho de Transporte criado em 2013 reclama de ser excluído de discussão de tarifa

Em dez reuniões realizadas, o tema jamais foi discutido com os conselheiros. Em carta enviada a secretário, eles dizem: 'Um conselho que não decide e sequer é consultado é apenas um arremedo de democracia participativa'

Jailton Garcia/Folhapress

Segundo conselheiro, somente discussões burocráticas são levadas ao conselho, como instalação de faixas exclusivas

São Paulo – Criado pelo prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), em julho de 2013, como resposta às mobilizações contra o reajuste da tarifa dos ônibus – de R$ 3 para R$ 3,20 – ocorrido em junho daquele ano, o Conselho Municipal de Transporte e Trânsito (CMTT) não participou das discussões que levaram ao aumento de R$ 3 para R$ 3,50 em vigor a partir de hoje (6). O grupo não tem poder decisório, mas uma de suas atribuições é “apreciar a proposta de alteração tarifária do Sistema de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros na Cidade de São Paulo”.

O assunto não foi discutido em nenhuma das dez reuniões realizadas desde a criação do CMTT. O governo estadual não tem conselho temático para discutir o transporte coletivo metropolitano.

Segundo conselheiros ouvidos pela RBA, na última reunião do ano passado, realizada no dia 4 de dezembro, foi perguntado ao secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto, sobre a possibilidade do reajuste que vinha sendo noticiada pela imprensa. Tatto afirmou que o assunto não estava sendo discutido pelo governo e que isso só entraria em debate após a divulgação do resultado da verificação das contas do transporte realizada pela consultoria Ernst&Young.

Em 11 de dezembro, dia da divulgação do relatório da consultoria, Tatto novamente evitou falar em reajuste. “Isso não está sendo discutido no momento”, afirmou a jornalistas. A Ernst&Young concluiu que o contrato de concessão precisa ser reformulado, prevendo revisões dos custos com mão de obra, combustível e equipamentos, além de melhorias de fiscalização, que poderiam levar a uma redução nos custos de aproximadamente R$ 693 milhões.

Quatro conselheiros e três suplentes enviaram uma carta a Tatto no final de dezembro, avaliando que reajustar a tarifa sem consultá-los é esvaziar o papel do CMTT. “Foi uma desagradável surpresa que, no apagar das luzes de 2014, a prefeitura tenha anunciado que o valor da passagem passará de R$ 3 para R$ 3,50. Quando uma decisão tão importante é tomada de forma alheia ao conselho, a prefeitura o esvazia. Um conselho que não decide e sequer é consultado é apenas um arremedo de democracia participativa”, diz um trecho do documento.

A conselheira pela região central da cidade, Bárbara Lopes, lamentou que a prefeitura tenha preferido não discutir a tarifa com os paulistanos. “Fomos pegos de surpresa. Esse é o tipo de decisão que deve ser discutido com a população. O secretário nos disse que discutiria após a divulgação do relatório da Ernst&Young”, relatou. Porém, ainda não há previsão de quando o conselho voltará a se reunir.

Os conselheiros pediram ainda que o aumento seja suspenso pelo menos até que o conselho e a população possam discutir o tema. Mas para o conselheiro Felipe Fernandes, ciclista, a prefeitura mostrou que não tem disposição para o diálogo. “A prefeitura desmoralizou totalmente o conselho ao tomar uma atitude como esta sem absolutamente nenhum diálogo”, afirmou.

Segundo Fernandes, somente discussões operacionais, como traçado de ciclovia, trajeto de linhas de ônibus específicas e instalação de faixas de pedestres, passam pelos conselheiros. “Para as questões que realmente importam eles se fecham e tomam as decisões sem fazer nenhuma consulta ao conselho”, protestou.

“A sociedade lutou mais de dez anos para ter um conselho com representação dos diversos setores da sociedade e quando tem uma decisão importante não somos consultados?”, questionou a representante dos estudantes no CMTT e presidente da União Estadual dos Estudantes (UEE) de São Paulo, Carina Vitral.

Para ela, a proposta de tarifa zero estudantil é uma grande vitória das mobilizações de junho do ano passado, mas deve ser estendido a todos os estudantes. “O transporte é complementar no direito à educação. Logo, também é um direito. Essa ação de conceder a tarifa zero demonstra que está sendo compreendida essa questão. Vamos manter a mobilização para que chegue a todos os estudantes”, defendeu Carina.

O CMTT é formado por três segmentos de 15 membros cada: representantes do poder público, das empresas, dos trabalhadores e da sociedade. Desses, somente os últimos são eleitos, os demais são indicados pelo devido segmento. Ainda participam do conselho um representante do Ministério Público Estadual e um do Tribunal de Contas do Município.

Quando da criação do conselho, o Movimento Passe Livre (MPL) negou o convite para participar, afirmando que o mesmo não mudaria a lógica do sistema de transporte da capital paulista, definido em razão do lucro dos empresários. “A relação com os empresários não é consultiva. São esses que realmente decidem como funciona o transporte coletivo”, defendeu o movimento à época.

A Secretaria Municipal de Transportes não respondeu aos questionamentos da reportagem.

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