Homenagem

Em ato por Santo Dias, bispo critica quem defende volta da ditadura

'Precisamos acreditar neste país', pede dom Angélico Bernardino, que conviveu com metalúrgico assassinado em 1979. Padres e advogado recebem prêmio na Assembleia Legislativa

Nair Benedicto/N Imagens

Protesto pela morte de Santo Dias, em 1979, em frente à Catedral da Sé; operário foi vítima da Polícia Militar

São Paulo – Dois padres, Luis Giuliani e José Rezende (este, in memoriam), e o advogado Belisário dos Santos Júnior receberam ontem (8) à noite o Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos, única comenda oferecida pela Assembleia Legislativa paulista. Em sessão presidida pelos deputados Adriano Diogo (PT) e Bruno Covas (PSDB), o ex-bispo auxiliar de São Paulo Angélico Sandalo Bernardino lembrou a trajetória do metalúrgico assassinado em 1979, alvejado por um policial, ao criticar defensores da volta da ditadura ao país.

“Da Igreja da Consolação, levamos triunfalmente o corpo até a Catedral (da Sé). Essa luta ainda continua, árdua, quando vejo pessoas dizendo que querem de volta a ditadura militar. Não, de maneira alguma! Precisamos acreditar neste país”, pediu dom Angélico, de 82 anos. “Este prêmio faz com que a nossa memória não se perca.” A cerimônia no plenário da Assembleia contou com a presença de ministros dos governos Lula e Fernando Henrique Cardoso: Paulo Vannuchi (Direitos Humanos) e José Gregori (Justiça), respectivamente.

Nascido em Terra Rosa, interior paulista, ex-lavrador, o operário Santo Dias, funcionário da Metal Leve, era militante da oposição metalúrgica em São Paulo e foi morto durante piquete na fábrica da Sylvania, em Santo Amaro, zona sul de São Paulo, em 30 de outubro de 1979, pouco meses após a aprovação da Lei da Anistia, regulamentada dois dias após o seu assassinato. Tinha 37 anos. “Fizemos parte da Pastoral Operária da Arquidiocese”, lembrou dom Angélico, que foi avisado do assassinato pelo cardeal-arcebispo, dom Paulo Evaristo Arns. “Ele tinha compromisso com a libertação da classe trabalhadora.”

Para Belisário, advogado atuante na defesa de presos políticos e ex-secretário estadual de Justiça e Cidadania, a ação decidida de Ana Dias (viúva de Santo, presente ao ato de ontem) e dos religiosos impediu que o corpo sumisse e que “estivéssemos saudando um desaparecido”. O velório de Santo Dias tomou as ruas do centro de São Paulo. Ele foi enterrado no cemitério de Campo Grande, na zona sul.

‘Fazer juntos e juntas’

“A coisa mais importante é fazer juntos e juntas”, disse o padre Luis Giuliani, de 83 anos, há mais de 50 no Brasil. Italiano de origem, foi pároco na Vila Remo, periferia da zona sul de São Paulo. Também atuou em Manaus. Destacou atitudes que considera importantes: falar, agir, caminhar “juntos e juntas” e “confiar no poder da resistência”.

Advogado desde 1970, hoje na Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, Belisário defendeu a política de direitos humanos, uma “linguagem do presente e do futuro, em que pese autoridades dizerem que temos de parar de olhar pelo retrovisor”. “Temos o direito de saber o que aconteceu, de saber quem fez”, afirmou, pouco antes de receber seu diploma das mãos de Gregori e de Margarida Genevois, 91 anos, ex-presidente da comissão.

Ele fez ressalvas às circunstâncias em que foi aprovada a Lei da Anistia. “Diferente do que dizem alguns juízes, não havia um clima de transição pacífica.” Para ele, a Comissão Nacional da Verdade corresponde a um “início ou meio” de um trabalho, porque a busca da memória começou há muito tempo. “Alguns chefes militares pensam que está em jogo o prestígio das Forças Armadas”, disse Belisário, para acrescentar que isso passa pelo “reconhecimento da verdade histórica e um pedido de desculpas”.

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