Justiça

Tribunal condena PM a 36 anos de prisão por participação nos Crimes de Maio

Promotoria espera que sentença estimule novas denúncias e testemunhos sobre assassinatos cometidos em 2006. De mais de uma centena de crimes, houve apensas seis denúncias e um julgamento

Elza Fiúza/ABr

Débora Silva coordena movimento Mães de Maio. Ela teve seu filho morto pela PM e luta contra a impunidade

São Paulo – O policial militar Alexandre André Pereira da Silva foi condenado ontem (10) a 36 anos de prisão, em regime fechado, e perda de cargo público, pelas mortes de três jovens em maio de 2006, na zona norte da capital paulista, num dos episódios que ficaram conhecidos como Crimes de Maio.

A sentença foi dada no fim da noite. Silva foi considerado culpado pelo homicídio qualificado de Murilo de Moraes Ferreira, Felipe Vasti Santos de Oliveira e Marcelo Heyd Meres. Os três estavam conversando em uma esquina do Jardim Brasil quando homens em motocicletas passaram atirando. O réu poderá recorrer da decisão em liberdade

Durante o julgamento, cinco testemunhas foram ouvidas: duas pela acusação e três pela defesa. Entre as testemunhas de acusação, uma foi ouvida de forma protegida, com presença apenas do juiz Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo, da promotora Cláudia Ferreira MacDowell e do advogado.

Essa testemunha, apelidada de Assurbanipal, estava presente na noite em que os três jovens foram assassinados, mas conseguiu fugir junto com outras duas pessoas. Ela foi a única testemunha a reconhecer dois dos policiais que participaram da chacina: o réu Alexandre André Pereira da Silva e um outro, chamado Wiliam Vicari, que foi morto dias depois do fato.

A decisão dos jurados agradou às mães de várias das vítimas dos Crimes de Maio, que fazem parte do grupo Mães de Maio. Emocionadas, elas comemoraram a decisão na frente do Fórum de Santana. Quem mais se emocionou foi Angela Maria Moraes Ferreira, mãe de Murilo, que amanhã completaria 28 anos. “Acho que foi justo. Era isso que eu estava esperando. Sempre acreditei na Justiça. Sempre fui atrás. Foram oito anos batalhando”, disse.

Para lembrar, leia na Revista do Brasil:
ONG Justiça Global denunciou 122 homicídios com indícios de execução praticados por policiais em maio de 2006.
Apenas seis agentes do estado foram denunciados, e menos de 13% desse crimes foram esclarecidos pelo estado e apenas um caso foi a julgamento.

Débora Maria da Silva, coordenadora do grupo Mães de Maio, disse que a condenação mostrou que a luta do movimento não foi em vão. “Nós, mães, temos o dever de lutar pela justiça em nome dos nossos filhos. O Mães de Maio é uma transformação no enfrentamento à violência policial. É inaceitável, em um país democrático, uma polícia militarizada e sendo testemunha dela própria”, falou.

“Perdemos nossos filhos e não temos uma resposta do Estado. Vimos hoje que o Judiciário deu uma resposta, e é ela que queremos para os 600 jovens [número de  assassinados em maio de 2006, segundo o próprio movimento] que foram mortos. Os assassinos dos nossos filhos têm nome, sobrenome, residência fixa e local de trabalho, e receberam ordem para matar”, completou.

Apelação

O advogado Eugênio Carlo Malavassi, que defende o soldado Alexandre André Pereira da Silva, disse logo após o encerramento do julgamento que vai pedir a anulação da sentença. “Já interpus recurso, que foi recebido, e vou levar ao Tribunal de Justiça. Tomara que o tribunal analise e anule esse julgamento. Vou pedir a anulação alegando que a prova que serviu para condenar o réu não é idônea, na minha concepção, porque contraria a prova documental”, disse o advogado.

Para Malavassi, os jurados votaram baseados no depoimento da testemunha Assurbanipal, que ontem voltou a reconhecer o réu como um dos culpados pelas três mortes. “Diante da fragilidade da prova e do que foi decidido no Conselho de Disciplina da Polícia Militar que analisou a mesma prova, os jurados optaram diferentemente da PM, razão pela qual entendo que eles votaram contra as provas dos autos”, explicou ele.

Para a Promotoria, o  julgamento de ontem, o único sobre os Crimes de Maio, pode induzir novas pessoas a quererem testemunhar e levar ao desarquivamento de vários processos que se referem ao período.

Com reportagem da Agência Brasil