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Para militantes, contexto pós-junho demanda unificação dos processos de formação

MST reforça ideia de que não deve haver separação entre movimentos do campo e da cidade. Organizações acreditam que educação popular é importante para formar militantes e dialogar com a sociedade

Rivaldo Gomes/Folhapress

Para militante do MST, as pautas dos movimentos urbanos devem ser unificadas com as do campo

São Paulo – Militantes de movimentos sociais avaliam que o contexto político brasileiro após as manifestações de junho conduz à necessidade de unificar os processos de formação das entidades que atuam em diversos segmentos para garantir uma unificação de reivindicações e da resistência a tentativas de manutenção do status quo.

Em debate realizado esta semana em São Paulo, representantes de movimentos avaliaram que a ênfase na educação popular é fundamental para garantir o despertar de uma consciência sobre a necessidade de mudanças sociais.

Maria Cristina Vargas, militante e educadora do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), afirma que é preciso “unificar a classe trabalhadora” pois o país está vivendo um momento de grandes mobilizações desde junho do ano passado pela defesa dos direitos de cidadania.

Neste sentido, os novos desafios do MST na luta pela reforma agrária não têm mais fronteiras com a cidade, e as pautas dos movimentos urbanos devem ser unificadas com as reivindicações do campo. Por isso, Maria Cristina acredita que é preciso dialogar com os trabalhadores urbanos e criar uma formação conjunta no processo da educação popular e de conscientização das pautas de cada movimento.

“Quando o sujeito entra no movimento, ele tem que desenvolver o processo da luta pela terra, pela reforma agrária e pela transformação social. Para isso ele passa por uma formação coletiva que constitui a educação popular.” Atualmente, 47 instituições de ensino, escolas e universidades cedem para o MST espaços de formação de militância.

Maria Cristina avalia que, além disso, a educação popular está presente no MST no diálogo. “Como explicar para a sociedade as ações de queimar laranja?”, questiona Maria Cristina, referindo-se ao episódio de 2009 em que militantes ocuparam terras da Cutrale no interior paulista. A ideia da ação era chamar atenção para a grilagem da área pela gigante da citricultura, mas houve uma reação forte à estratégia. “A educação popular no MST é o MST”, afirma.

Raimundo Bonfim, coordenador estadual da Central de Movimentos Populares de São Paulo (CMP), entidade organizada em 16 estados que reúne diversos movimentos sociais, aponta que a importância da educação popular foi deixada de lado em muitos momentos, e destaca a necessidade de retomá-la nesse contexto político em que os movimentos estão ganhando força, especialmente os de luta por moradia. “A percepção de que há um conflito entre a luta por moradia e a especulação imobiliária nos últimos 3 anos fez com que os movimentos crescessem. As questões de junho continuam batendo”, argumenta.

Para o coordenador da CMP, a educação popular traz um panorama real das necessidades sociais que a escola tradicional não consegue apresentar. Ele considera muito importante que os indivíduos participem de coletivos voltados à consciência social. “Nos movimentos de comunidades, a maior parte das pessoas que participam não conclui o ensino médio.”

Dentre as articulações desenvolvidas pela CMP está a Organização do Plebiscito Popular pela Reformulação da Constituinte, que pretende realizar uma consulta popular antes das eleições deste ano, entre os dias um e sete de setembro. A proposta conta com 109 comitês espalhados pelos estados brasileiros e foi apresentada em setembro do ano passado por partidos políticos e movimentos sociais como resposta às manifestações de junho, mas é ignorada no Congresso Nacional.

Carmen Silva, da União Brasileira de Mulheres de Recife (UBM), destacou que a questão da Copa do Mundo no Brasil ganhou notabilidade depois de junho e, com isso, a questão urbana está “muito forte”.

Sobre os movimentos feministas, a militante acredita que é preciso “acolher o novo, que significa abrir o olho para o que está acontecendo de diferente no contexto político”. Segundo Carmen, as mulheres devem se ouvir para a construção subjetiva de cada militante dentro dos coletivos. “Outro desafio é a corporeidade, é preciso entender o corpo na constituição de si e o corpo político que luta contra a opressão”, explica.

A educação popular é um conceito que foi elaborado pelo educador Paulo Freire e compreende a formação como um processo contínuo que pretende transformar a realidade através dos sujeitos.