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Em SP, Justiça ‘legaliza’ prisões por averiguação e abusos da PM contra advogados e imprensa

Mandado de segurança movido por Advogados Ativistas contra kettling e ações policiais preventivas em manifestações é derrubado pelo TJ, que não vê inconstitucionalidade. Defensores lamentam

Levi Bianco/Brazil Photo Press/Folhapress

PM deteve 262 pessoas e agrediu 19 membros da imprensa na manifestação de 22 de fevereiro

São Paulo – O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) indeferiu hoje (13) mandado de segurança movido ontem pelos Advogados Ativistas na tentativa de impedir ações preventivas da Polícia Militar e garantir, assim, o direito de reunião e expressão dos manifestantes que a partir das 18h se concentram no Largo da Batata, zona oeste da capital, para protestar contra a Copa do Mundo.

A ação também pedia que os policiais fossem impedidos de realizar prisões por averiguação – medida que não encontra guarida no ordenamento jurídico brasileiro, mas que tem se tornado uma constante nos protestos ocorridos na cidade. O mandado de segurança ainda solicitava que jornalistas pudessem registrar livremente os procedimentos policiais, e que advogados tivessem garantidas suas prerrogativas de acompanhar os detidos à delegacia.

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Foram, ao todo, oito pedidos, que, segundo os Advogados Ativistas, procuravam fazer valer os direitos fundamentais expressos na Constituição, notadamente o direito de reunião. (Leia peça na íntegra.) Mas não foi esse o entendimento do desembargador Roberto Mortari, autor do acórdão publicado hoje às 13h30 derrubando todos os pontos do documento.

O magistrado compreendeu que a tática conhecida como kettling ou caldeirão de Hamburgo, em referência à cidade alemã onde nasceu, não viola o direito constitucional de reunião. Mortari afirma que episódios como o visto no último 22 de fevereiro no centro de São Paulo – quando um efetivo de 2,3 mil PMs cercou 1,5 mil manifestantes, agrediu centenas e prendeu 262 pessoas sem acusação – são apenas “medidas destinadas a assegurar que determinada reunião seja pacífica, ordeira e não cause transtornos para a coletividade”.

O desembargador argumenta que “os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no artigo 5º da Constituição Federal não podem ser utilizados como escudo protetivo para a prática de atividades nocivas para a sociedade, tampouco como argumento para afastar a atuação estatal, pena de rompimento das bases de sustentação do Estado Democrático de Direito”. O artigo 5º abre o capítulo constitucional relativo aos direitos e deveres dos cidadãos, afirmando que está garantida “a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

Ao terminar seu despacho, Mortari conclui que “a atuação policial preventiva, com vistas à manutenção da ordem pública, é legítima, e não pode ser afastada, sem prejuízo de rigorosa apuração e punição de eventuais abusos, se acaso constatados”. O veredicto termina sem qualquer menção aos demais pedidos expressos pelo mandado de segurança dos Advogados Ativistas, com destaque para a liberdade profissional de advogados e membros da imprensa – também feridas na ação policial do último dia 22 de fevereiro.

De acordo com levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), ao menos 19 comunicadores foram agredidos, presos, impedidos de trabalhar ou tiveram seus equipamentos danificados durante a inauguração do kettling em São Paulo. Os Advogados Ativistas relatam que profissionais do Direito foram impedidos de prestar assistência aos manifestantes detidos. Ao menos um advogado teve o celular “confiscado” por policiais.

“Entramos com mandado de segurança exatamente porque aconteceu o caldeirão de Hamburgo na outra manifestação e todos os responsáveis – comando da PM, secretário de Segurança Pública e governador – disseram que a ação foi êxito total por haver impedido depredações”, comentou à RBA Luiz Guilherme Ferreira, membro dos Advogados Ativistas.

“Eles atuaram de maneira preventiva porque acharam que os manifestantes iriam atacar a polícia. Ou seja, interromperam manifestação legítima com base num achismo. Além de prenderem pessoas por crime algum, impediram o direito à manifestação”, continua. “Com isso, o que está em jogo é o direito à manifestação. Por isso, entramos com mandado.”

Para Ferreira, a decisão do TJ-SP é preocupante. “Baseamos nosso pedido na realidade das ruas, porque acompanhamos as manifestações e sabemos o que está ocorrendo. O desembargador está se baseando apenas na letra da lei”, diferencia. “Recebemos esse acórdão com preocupação, porque o desembargador não analisou pontualmente todos os pedidos. E porque chancela a ação preventiva da PM.”

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