Exclusivo

Valores de imóveis podem inviabilizar projetos habitacionais de São Paulo

Em entrevista à RBA, secretário de Habitação da capital paulista, José Floriano, fala sobre a política habitacional e adianta que algumas desapropriações, como a Prestes Maia, podem não sair do papel

Danilo Ramos / Arquivo RBA

Ocupação Prestes Maia, centro da capital: valor do imóvel pode fazer prefeitura recuar de desapropriação com fins sociais

São Paulo – Atualmente, 130 mil pessoas mantêm cadastro atualizado junto à Secretaria Municipal de Habitação de São Paulo e compõem oficialmente o déficit habitacional da cidade. Na realidade, porém, o índice é muito maior, dada a quantidade de pessoas que nunca se cadastraram ou que não atualizaram seu registro no último ano. A meta do governo Fernando Haddad (PT) de construir 55 mil unidades habitacionais até o final de seu mandato, em 2016, alimenta expectativas nas organizações sociais.

Responsável por comandar uma das políticas públicas mais urgentes e com maior mobilização social na cidade de São Paulo, o secretário municipal de Habitação, José Floriano, fala como um técnico e evita posicionamentos políticos. Apresenta números e tabelas e parece não se abalar com a pressão social que bate à sua porta desde que assumiu a pasta, no início da gestão Haddad – o tecnicismo é uma das características mais criticadas pelos movimentos sociais, ainda inconformados em ter como secretário um homem indicado pelo Partido Progressista de Paulo Maluf.

Em entrevista exclusiva à RBA, Floriano diz que apenas 25% dos moradores de prédios ocupados na cidade poderão ficar nesses locais depois da regularização. Informa que pretende acabar com o auxílio-aluguel, que consome por ano R$ 70 milhões, e que a desapropriação para a viabilização de habitação social de uma das maiores e mais representativas ocupações da cidade, no número 911 da Avenida Prestes Maia, na Luz, pode não “valer a pena” do ponto de vista financeiro – afirmação atenuada pela promessa de que a prefeitura fará um “esforço sobre-humano” para viabilizar o projeto.

Leia a seguir trechos da conversa com o secretário sobre o andamento da política habitacional.

Mesmo com a contínua afirmação da meta de 55 mil unidades construídas até o fim do mandato de Haddad, muitos movimentos de moradia têm se mostrado insatisfeitos. Por que o senhor acha que isso ocorre?

Houve um hiato muito grande entre o ritmo que vinha de gestões bem antigas de construção habitacional. Nos últimos oito anos, caiu muito o ritmo das obras e planejamento de habitação social. Esse vácuo deixou realmente a população bem estressada, sem horizonte. Nós estamos aqui na secretaria para garantir o cumprimento da meta. Mas demora para você planejar, desapropriar terrenos, viabilizar os financiamentos habitacionais.

Nesse primeiro ano, realmente todos os movimentos sociais e entidades ficaram preocupados e com motivos justos. Agora eles estão vendo que o que nós estamos planejando desde 2013 está sendo colocado em prática. A gente já tem mapeada a possibilidade real da execução dessas 55 mil unidades.

gerardo lazzarihabita
José Floriano disse que a prefeitura pretende acabar com o auxílio-aluguel, que consome por ano R$ 70 milhões

Como está o andamento da meta?

Já há 1.940 unidades concluídas. Estão em obras 11.207 e já estão viabilizadas 34.784 unidades. O que significa isso? Estão concluídas, contratadas ou em obras. Mais 10 mil estão em projeto com terreno próprio ou em desapropriação.

Essas unidades já tiveram os terrenos desapropriados?

No ano de 2013, nós pagamos R$ 82,5 milhões em desapropriações de terrenos, cujas áreas vão dar cerca de 9 mil unidades habitacionais. De fevereiro a junho, nós temos que cumprir uma meta ousada do prefeito Fernando Haddad, que é pagar mais R$ 220 milhões em desapropriação. Os recursos estarão disponíveis a partir de março.

Dinheiro do Tesouro?

Não. Será de várias fontes que o prefeito está conseguindo passar para a Sehab e para a Cohab. São vários fundos, operações urbanas e um pouco de dinheiro do Tesouro.

A prefeitura irá construir várias unidades em parceria com o governo do estado. Até agora, são 30 mil pelo Casa Paulista e mais 2 mil na parceria público-privada do Centro. Como vai ser a escolha de quem vai morar nos apartamentos construídos?

Vai ser equilibrada entre município e estado. Não existe um que prevaleça. Se na região as famílias em áreas de risco – que serão as primeiras a serem contempladas – estiverem em maior número, elas serão atendidas pela indicação da Sehab; se tiver uma parte pelo Estado, nós vamos sentar e resolver.

Mas como será a divisão com as pessoas que estão com os movimentos sociais?

Do total de 55 mil unidades, nós temos um planejamento de atender pelo menos 11 mil para as entidades. Isso vai ser feito. Vamos credenciá-las, fazer um chamamento e temos ainda de definir como será atendida cada uma delas.

A secretaria tem a preocupação de desenvolver mecanismos que contornem a alta valorização imobiliária, um dos principais problemas para as políticas habitacionais de todo o país?

A forma de contornar isso, para a gente atender à demanda da baixa renda, é subsidiar os recursos. Mesmo que a gente pague caro, mesmo que a gente veja que em alguns prédios do Centro a gente tenha de contemplar movimentos sociais que estão ali há muitos anos consolidados. Como a gente tem esse compromisso de 25% das pessoas que estão ocupando o centro da cidade nós deixarmos ali, então provavelmente vamos ter de adequá-las dentro de algum edifício que vai ser revitalizado – e vamos ter de subsidiar.

E como está o andamento das desapropriações no centro?

Temos 49 prédios com ocupações e temos alguns que não vão valer a pena desapropriarmos, mas a grande maioria vai entrar em desapropriação. Trinta e dois dos 49 já estão com ação ajuizada. Isso significa que tem interesse da prefeitura.

Só o decreto não garante que o processo de desapropriação será concluído. A prefeitura vai mesmo pagar pela desapropriação deles?

Dentro desses R$ 220 milhões que nós temos até junho para gastar, vamos pagar por esses prédios.

Neste ano serão pagas as desapropriações para dar início às reformas?

Vai estar na pauta. Vamos resolver.

O senhor diz que alguns não vão valer a pena…

É porque o custo da reforma passa de R$ 200 mil por unidade. Alguns chegam a ser R$ 250 mil, R$ 300 mil. Aí descartamos. Porque é inviável para produzir unidades para a população de baixa renda ou mesmo a de média renda, que recebe até seis salários e também vai ser motivo de ingresso no programa habitacional do Centro.

Valerá a pena desapropriar o edifício Prestes Maia e o Mauá, na região da Luz, duas das maiores e mais antigas ocupações da cidade, que estão com Decreto de Interesse Social?

O Mauá já está com planta expropriatória. Vai valer a pena, vamos fazer. O Prestes Maia tem uma avaliação de mercado que está muito acima do valor. Nós vamos propor a ação com valor bem menor do que o valor de mercado e vamos deixar o perito judicial avaliar qual é o preço correto. Aí, em cima desse valor, a gente vai ver se vale a pena ou não.

Então o Prestes Maia pode não ser destinado para habitação social?

Ele está nesse grupo de “talvez”. Mas existe uma chance enorme de ser porque tem essa ocupação de muitos anos, vai haver um esforço sobre-humano da prefeitura para realizar esse pagamento.

A prefeitura não pode descontar o valor da dívida dos proprietários do Prestes Maia?

Pelo critério contábil legal nós temos de depositar o valor de quanto vale a edificação e, em seguida, a Secretaria de Finanças entra com a solicitação de devolução do dinheiro para os pagamentos atrasados.

O programa de urbanização de favelas está em ritmo lento.Quando será retomado?

No orçamento deste ano vamos tentar recuperar o atraso destas obras. Em 2013, trabalhamos com o orçamento previsto pela gestão anterior. Então as obras andaram muito lentamente, principalmente na urbanização de favelas. Mas já houve uma revisão de estratégia e vamos aumentar a velocidade das obras que estão em andamento.

Vocês também não estão divulgando o andamento da meta da regularização fundiária. Como anda isso?

Até o meio do ano nós andamos de maneira tímida. Aí o prefeito pediu que os recursos fossem aumentados. Em 2014 vai haver um aumento de trabalho nessa área. Até 2016 vamos conseguir atender às 200 mil famílias, que foi o prometido pelo prefeito.

Atualmente, 22.394 famílias recebem auxílio-aluguel, uma política que era muito criticada nas gestões anteriores, e que vem sendo diminuída agora.A tendência é acabar com o benefício?

Essa política não resolve o problema. A tendência é acabar. Estamos com planejamento até 2017 ou 2018 para que os futuros gestores da cidade não tenham esse problema de pagar aluguel social nem parceria social.

Mas qual será a solução para as pessoas que precisam de assistência? Vai ter moradia para todo mundo?

Hoje nós temos 230 mil em situação precária de moradia que precisam de habitação. Nós estamos com um projeto de 55 mil (moradias), mas vamos deixar contratado ao longo desses anos que faltam para cumprir o mandato em torno de 140 mil unidades. Com isso acho que vai diminuir bastante o déficit habitacional de São Paulo.

Teremos muito cimento pela cidade nos próximos anos…

Eu falo que daqui a dois anos, dois anos e meio, São Paulo vai ser o maior canteiro de obras da América Latina. Vai mudar muito o panorama da cidade. Principalmente com as obras da nossa secretaria e com as de Mobilidade Urbana, que também vai ter recursos.

Quando o senhor diz que vai mudar a cara da cidade é no sentido de aproximar o centro da periferia? Essas obras vão dar qualidade de centro para as periferias?

Vai mudar porque não só no centro e no centro expandido vai haver muita concentração habitacional, mas também porque na zona leste e principalmente na zona sul vai mudar drasticamente a urbanização dos bairros, tanto na infraestrutura urbana, quanto na construção habitacional.

Leia também

Últimas notícias