sem acordo

Governo Alckmin ignora famílias e mantém leilão de casas na zona sul de SP

Resta às famílias a decisão dos desembargadores do Tribunal de Justiça amanhã (5). Cerca de 150 pessoas podem ser expulsas de suas casas, depois de anos pagando taxas públicas regularmente

Márcia Minillo/RBA

Elizabeth Santos, com o marido e as filhas. Uma das quatro famílias que vivem no 709 da rua Sônia Ribeiro

São Paulo – O governo de Geraldo Alckmin (PSDB) se mostrou intransigente e reafirmou a intenção de realizar o leilão de 42 imóveis, onde vivem dezenas de famílias, nos bairro do Brooklin e Campo Belo, zona sul da capital. Durante audiência pública realizada na noite de ontem (3), na Assembleia Legislativa de São Paulo, o Secretário Técnico Executivo da Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Regional, Felipe Sartori Sigollo, disse que “Não há como regularizar a situação com os ocupantes. A única forma democrática é a concorrência pública”.

Cerca de 150 pessoas que residem nos imóveis que serão leiloados lotaram o auditório Teotônio Vilela para reivindicar a suspensão dos pleitos. O governo pretende usar a arrecadação dos leilões para capitalizar a Empresa Paulista de Parcerias, que vai realizar ações público-privadas (PPP). São 42 imóveis, dos quais 22 foram visitados pela reportagem da RBA que constatou pelo menos 42 famílias vivendo neles.

A primeira tentativa de leilão foi no ano passado, com 60 imóveis. O pleito foi suspenso pela Justiça paulista. Porém, em dezembro passado, o agora ex-presidente do Tribunal de Justiça, Ivan Sartori, autorizou o governo a realizar os leilões. A secretaria de Planejamento alega que os 18 retirados estavam ocupados e vão receber atendimento da Secretaria da Habitação. Porém, os outros, conforme relatado, também têm famílias.

“Vocês têm pai e mãe?” perguntou o comerciante Geraldo Manoel de Andrade, morador do número 401 da rua Arizona. E completou. “Quando nós chegamos aqui era só mato e rato. No mesmo terreno moram nove famílias. Nós não somos cachorros pra ser tratados assim, somos trabalhadores.”

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No entanto, a pressão não foi suficiente. Sigollo foi firme na reafirmação de que o leilão será realizado. E culpou a ação judicial da Defensoria Pública pela falta de diálogo. “As negociações foram comprometidas pela judicialização do processo. Nós estamos abertos, o secretário pode recebê-los se quiserem”, afirmou.

Porém, as tentativas de deixar encaminhada uma reunião esbarraram na falta de vontade política. “Nosso encaminhamento é manter o leilão dos 42 e levar o resultado desta audiência ao secretário”, arrematou.

A Conselheira Tutelar Néia Arantes cobrou o representante do governo estadual sobre o compromisso assumido pelo secretário do Planejamento, Júlio Semeghini, de se reunir com os moradores em setembro do ano passado. “Ele nunca mais veio conversar com a gente. Encaminhei ofício à secretaria relatando o número de crianças e adolescentes no local e também não fui respondida”, afirmou.

A defensora pública Sabrina Nasser, que acompanha o caso, questionou o direito do Estado sobre as moradias, que ficaram tantos anos entregues aos moradores sem qualquer questionamento. “Embora seja o dono das casas, o governo do estado jamais deu função social a elas”, destacou. Sabrina criticou a falta de diálogo do governo estadual, que, segundo ela, se recusa a recebê-la.

Sabrina apresentou um estudo realizado por uma socióloga ligada à Defensoria, que aponta 60% dos moradores das áreas como de baixa renda. “Estes ganham até dois salários mínimos. Outros 23% recebem algum benefício social”, afirmou. Além disso, em 66% dos lares há crianças ou adolescentes.

“A solução não é a remoção, mas a regularização. Retirados de lá vão para a extrema periferia. Talvez nem em São Paulo consigam ficar”, prosseguiu Sabrina, lembrando que a comunidade está consolidada por seus anos de existência e que ali os moradores têm acesso a diversos equipamentos públicos. A defensora pretendia ingressar com um pedido de Concessão de Uso Especial para Fins de Moradia, que garante a posse sobre propriedade pública para quem nela vive há mais de cinco anos, desde que tenha completado o tempo antes do ano de 2001.

O deputado estadual Carlos Giannazi (Psol), organizador da audiência, ameaçou obstruir todas as sessões plenárias da Assembleia Legislativa até que o governador receba os moradores e a defensora. “Já temos um grande déficit habitacional na cidade. Esta ação vai piorar a situação colocando mais gente na rua. Nós vamos travar o governo na Casa e pressioná-lo. E vocês devem manter a mobilização”.

Outra possibilidade reside na decisão que o colegiado de desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo deve tomar amanhã (5). Eles podem revogar a decisão de Sartori, que autorizou os leilões, e suspendê-los novamente.

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