políticas públicas

Organizações apresentam relatório parcial sobre tráfico de pessoas e saúde das mulheres

A cada quatro anos, o Brasil presta contas de suas ações a comitê da ONU. Estudo apresentado em Porto Alegre nesta semana será entregue às Nações Unidas em 2014

ela fiúza/arquivo abr

Documento cobra legislação que contemple garantia de direitos de pessoas traficadas e prevenção do crime

Porto Alegre – Diversas organizações e coletivos feministas finalizam a elaboração do Relatório Alternativo da Sociedade Civil para o Comitê das Nações Unidas da Convenção sobre Eliminação de Todas as Formas de Discriminação à Mulher (Cedaw). O documento está sendo produzido desde o início do ano e sua proposta preliminar será apresentada nesta semana em Porto Alegre durante a 3ª reunião do consórcio nacional do Projeto de Monitoramento da Cedaw.

O relatório busca subsidiar a ONU em diversos temas que dizem respeito a políticas públicas para mulheres no país. A cada quatro anos, o Brasil presta contas de suas ações ao comitê – ao qual o país aderiu em 1984, mas a quem só foi dar esclarecimentos pela primeira vez em 2002. O documento em discussão neste ano será enviado em 2014 à ONU, já que o Cedaw institui que fará acompanhamentos a cada dois anos sobre a situação dos países que o compõem.

Télia Negrão, do Coletivo Feminino Plural, afirma que o relatório deste ano está focado em dois temas: tráfico de pessoas e saúde da mulher. No primeiro tópico, o documento cobra a elaboração de uma legislação que contemple os diversos aspectos do problema – como a garantia de direitos das pessoas traficadas e mecanismos de prevenção e punição desses crimes. No segundo aspecto, as entidades criticam o programa do governo federal Rede Cegonha e cobram a ampliação da assistência à saúde da mulher.

“Não existem dados suficientes que nos permitam ter uma magnitude desse problema no Brasil. Sequer podemos afirmar o número de pessoas traficadas”, lamenta a ativista. Ela explica que o país possui legislações isoladas sobre o tema, mas nenhum estatuto que o abarque integralmente.

Para Estela Márcia Rondinha, do Instituto Brasileiro de Inovação Pró-Sociedade Saudável, o relatório elaborado pelas organizações da sociedade civil buscou dados concretos junto às diversas regiões do país sobre o tráfico de pessoas. Ela aponta como uma das preocupações o tráfico de trabalhadores dentre os estados brasileiros.

“Não temos política de prevenção para situações que são promotoras do tráfico de pessoas, como as grandes obras de infraestrutura. Elas só ocorrem mediante trabalho em situação análoga à escravidão, com a vinda de trabalhadores das regiões mais pobres. Foi assim com o Complexo de Madeira, com Belo Monte e com as destilarias de álcool do Mato Grosso e de Goiás”, expõe. Ela aponta que o BNDES, maior financiador desses empreendimentos, poderia ser mais exigente neste aspecto.

O documento a ser apresentado pelas organizações à ONU crítica a implementação do programa Rede Cegonha por parte do governo federal. Instituída no governo Dilma Rousseff, a medida prevê políticas públicas para amparo a mulheres gestantes e à recém nascidos.

“O programa acabou focalizando apenas o período materno-infantil, quebrando com uma visão de atenção integral à saúde das mulheres, em todos os ciclos da vida. As mulheres que não engravidam ou que não desejam se manter grávidas estão de fora dessa política”, critica Télia Negrão. Ela considera que o Rede Cegonha é um “atraso”, pois, na sua avaliação, representa uma “volta conceitual à década de 1960, sendo que a partir de 1980 já passamos a ter uma política de saúde integral para as mulheres”.

Outro trecho do relatório solicita que a ONU cobre do governo brasileiro ações que barrem o Estatuto do Nascituro, que tramita no Congresso Nacional. Além disso, o documento pede que o Executivo forneça suporte financeiro às organizações da sociedade civil para a elaboração dos próximos relatórios à CEDAW. “Já consta no comitê que os Estados devem apoiar a sociedade civil na elaboração de seus relatórios. O governo, para elaborar o seu, contrata consultorias e designa várias equipes. Nós temos que nos virar, fazendo tudo através de trabalho voluntário”, compara.

“Dessa vez o que fizemos foi fazer com que o Estado cumprisse com uma das recomendações que já consta na Cedaw que é de apoiar a sociedade civil na elaboração de seu relatório. O governo para elaborar seus relatórios contrata consultorias, designa várias equipes, a partir de estudos, IBGE e outras instituições. E a sociedade civil tem que se virar fazendo seu relatório através de um trabalho voluntário das organizações. Só que tem previsão da ONU que os estados tem que apoiar as organizações. Apresentamos um projeto de apoio para que a sociedade civil possa trabalhar de forma mais profissionalizada para elaborar um relatório à altura da necessidade e uma metodologia de trabalho permanente para essas organizações envolvidas.”

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