arbitrariedades

Excessos e prisões encerram semana de debates sobre transporte público em SP

Enquanto PM pratica medida não prevista no Código Penal, organizadores tentam conter depredações, em ato que marcou luta por políticas de mobilidade na capital paulista

CC / Mídia Ninja

PM detém manifestantes no centro de SP. Ato por passe livre marcado por violência e insatisfação com gestão do transporte público

São Paulo – “Isso voltou a ser uma ditadura”, gritava indignado em frente à 1ª Delegacia de Polícia (DP) de São Paulo, no bairro da Liberdade, Zen Samur, pai de uma jovem de 18 anos presa durante manifestação pela tarifa zero no transporte público, organizada pelo Movimento Passe Livre (MPL) na noite de ontem (25), em São Paulo. A estudante é uma das pelos menos 78 pessoas detidas para averiguação da participação em crimes – procedimento que a Rede Brasil Atual já mostrou que não está previsto no Código Penal.

Até as três da manhã de hoje (26), os detidos ainda aguardavam em pelo menos três delegacias da cidade a comparação de suas identidades com imagens gravadas. O objetivo é localizar os envolvidos na agressão ao coronel da PM, Reynaldo Simões Rossi, que teve a clavícula quebrada. Ele foi cercado e agredido durante o ato e foi socorrido por um homem que seria um policial infiltrado na manifestação. Durante a confusão a pistola do coronel foi roubada.  Em nota, a PM atribuiu a agressão a “criminosos travestidos de manifestantes” e a classificou como “covarde”.

Sem notícias

Entre os manifestantes detidos estão vários menores de idade. “Minha filha ficou horas incomunicável. Isso é de uma arbitrariedade sem tamanho”, reclamava Valdir da Silva, pai de uma secundarista de 15 anos, que pretendia prestar o Enem na tarde de hoje. Silva mostrava o registro de 30 tentativas de ligação para a filha até que ela conseguisse ligar para dizer onde estava. Até então, o pai havia procurado a jovem em pelo menos três outras delegacias – na 8ª DP na Moóca, na zona leste, na 78ª (Jardins, zona oeste), e na 2ª DP (Bom Retiro, na região central). A presença da adolescente na 1ª DP também não foi confirmada. “Ninguém deixa a gente entrar”, disse. Até o fechamento desta matéria, a reportagem não havia conseguido se comunicar com Valdir da Silva.

A maioria das pessoas levadas para, assim como a filha de Silva participam da chamada Fanfarra M.A.L, grupo autônomo que dá o ritmo das manifestações, com marchinhas e gritos de guerra e do qual fazem parte também algumas lideranças do MPL. Já na 8ª DP estariam alguns suspeitos de participação na agressão ao coronel Rossi.

Violência

O ato de encerramento da Semana de Luta por Transporte Público começou por volta das 18h. Os manifestantes deixaram a frente do Teatro Municipal e percorreram várias ruas do centro, chegando a fechar o túnel Papa João Paulo II, que faz a ligação norte-sul da cidade, no Vale do Anahngabaú.

Por volta das 20h, cerca de 3 mil pessoas se encaminharam para o Parque D. Pedro, tradicional ponto de protesto do Movimento Passe Livre. Lá chegando, os manifestantes quebraram catracas e forçaram a abertura de portas para que passageiros entrassem sem pagar. Um veículo chegou a ser incendiado e diversos caixas eletrônicos foram depredados.

A reportagem da RBA presenciou um grupo comemorando o roubo de lojas do terminal. Em seguida, o mesmo grupo começou a chutar portas de lojas fechadas por ruas do centro. Apesar de estarem com os rostos cobertos, eles não seguiam ordens dos praticantes da tática black bloc nem dos membros do MPL, que intervieram duas vezes para que bares não fossem depredados.

A polícia usou bombas de gás lacrimogêneo para conter o quebra-quebra. Houve correria, mas a marcha liderada pelo MPL se reagrupou e seguiu para a Praça da Sé, onde o ato foi oficialmente encerrado. Logo em seguida, bombas de gás voltaram a ser jogadas e houve nova confusão.

A manifestação encerrou a Semana de Luta pelo Transporte Público, realizada desde 2006. A edição de 2013, porém, é especial para os integrantes do movimento. “Esse ano, várias articulações feitas nas periferias viraram mobilizações. Justamente porque a gente conseguiu mostrar que vale a pena lutar”, afirma o integrante do MPL Marcelo Hotimsky.

Durante a semana houve manifestações no Grajaú, Campo Limpo e M’Boi Mirim, bairros da zona sul. “Em todos eles foram debatidas pautas locais, como a mudança de linhas, encurtamento de itinerários, falta de ônibus 24 horas. Hoje é para mostrar que a luta é a mesma, contra um sistema de transporte pensado para os empresários, e não para quem o usa. E esse é o mesmo motivo para existir tarifa. Por isso somos pelo passe livre”, explicou Hotimsky.

Antes da manifestação e dos conflitos, o ativista avaliou a ação policial. “É a mesma coisa de sempre. A polícia sempre tenta atrapalhar quem tenta se manifestar, quem tenta mudar as coisas. Mas a gente continua lutando.”