Vozes no gabinete

Construção de túnel na região do Jabaquara, em SP, inviabilizaria melhorias em bairro

Prefeito Fernando Haddad 'adiou' obra, prioritária para Kassab, e disse que vai apostar em construção de moradias. Decisão foi tomada após pedido de moradores

Mateus Bruxel/Folhapress

Túnel custaria R$ 2,4 bi, desapropriaria milhares de pessoas e seria exclusivo para carros, assim como Ponte Estaiada

São Paulo – Uma comissão de três moradores do Jabaquara, na zona sul de São Paulo, reuniu-se por 100 minutos no último dia 26 com o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), e três secretários de governo para apresentar estudos apontando a inviabilidade econômica da construção do túnel que faria a ligação entre a Avenida Roberto Marinho e a Rodovia dos Imigrantes. Ontem, a prefeitura surpreendeu os moradores ao afirmar que vai adiar a obra.

“Na Operação Urbana Água Espraiada, há um conjunto grande de obras. Não há recursos para isso tudo e para o túnel. Então, as pessoas se manifestaram nas audiências públicas e disseram: ‘Vamos inverter. Em vez do túnel, vamos priorizar todas essas obras, e quando vendermos mais Cepac, sobretudo na região do Jabaquara,. Você pode retomar a ideia de fazer o túnel, que já está licitado e licenciado’”, explicou o prefeito Fernando Haddad na nota.

Cepacs são Certificados de Potencial Adicional de Construção, títulos negociados em bolsa pela prefeitura nas áreas onde há operações urbanas. Basicamente, o documento permite às construtoras verticalizar além dos limites estabelecidos pela legislação sobre ocupação do solo na capital. Em troca, a administração municipal deve reinvestir o dinheiro arrecadado com o Cepac em melhorias para a população dessas áreas.

“Dissemos a ele que era uma obra muito cara, inviável, que iria ficar inacabada. Um túnel em que só ia passar carro. Foi uma vitória para o nosso movimento”, afirma José Luiz Nodar Ribeiro, um dos moradores presentes à reunião. “Até nós nos surpreendemos que em menos de 24 horas depois ele tenha adiado a obra.”

O túnel é uma das intervenções previstas na Operação Água Espraiada. No entanto, no projeto original, de 2002, ele teria apenas 400 metros. Em 2007, a extensão foi modificada em 2,3 quilômetros pelo então prefeito Gilberto Kassab (PSD), o que obrigaria a prefeitura a realizar a remoção de 40 mil moradores de uma região com diversas favelas e casas de alto padrão. Ao todo, o projeto custaria R$ 2,4 bilhões.

O valor é superior ao que seria arrecadado com a venda de todos os Cepacs no setor Jabaquara da Operação Urbana, mesmo que os certificados fossem vendidos pela cotação mais alta já obtida em um leilão, R$ 1.282, o que possibilitaria uma arrecadação de R$ 64,1 milhões. “Nós temíamos que os empreiteiros priorizassem a construção da ponte em vez da construção de moradias e outros melhoramentos reais”, afirma Ribeiro.

Desde 2004 já foram arrecadados cerca de R$ 3,3 bilhões nesta operação urbana. No projeto de lei que institui a operação urbana está prevista a construção de oito unidades habitacionais. Até hoje, apenas o conjunto residencial do Jardim Edith foi concluído. A Ponte Estaiada, atualmente um dos principais pontos turísticos da cidade, também foi construída com recursos provenientes da venda de Cepac. O projeto milionário é questionado por permitir apenas o trânsito de veículos particulares.

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