conflito pela terra

Movimentos marcham pela demarcação das terras indígenas no Mato Grosso do Sul

Organizações querem que o governo federal revogue medidas que seriam favoráveis aos interesses do agronegócio

Rodolfo Buhrer/Fotoarena/Folhapress

Índios Kaingang ocupam a sede estadual do PT no Paraná em protesto contra a ministra Gleisi Hoffmann

São Paulo – Militantes de movimentos populares iniciaram na manhã de hoje (3) uma marcha reivindicando que o governo federal ouça as populações tradicionais e retome o processo de demarcação de terras indígenas e quilombolas. Segundo o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber César Buzatto, os povos estão reagindo a uma série de ataques contra seus direitos, patrocinados por ruralistas e pelo governo federal.

A marcha teve início no município de Anhanduí, Mato Grosso do Sul, e seguirá por 60 quilômetros até Campo Grande, capital do estado.

Intitulada Marcha dos Povos da Terra, conta inicialmente com 1 mil pessoas e segue pela BR-163. A caminhada até Campo Grande deve durar quatro dias. Participam a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a CUT e outras organizações.

Os protestos pedem, além da atenção às terras tradicionais, a revogação da Portaria Interministerial 419, de 2011, da portaria da Advocacia Geral da União nº 303, de 2012, e do Decreto 7957, de 2013, que, segundo Buzzato, pioram a situação dos conflitos pela terra. “Essas medidas instituem precedentes lesivos aos povos indígenas, que podem ser utilizados para justificar remoções, por exemplo”, avalia Buzatto.

A portaria 419 dispõe de regras para atuação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e outros órgãos na elaboração de pareceres para licenciamento ambiental. O Decreto 7957 institui o Gabinete Permanente de Gestão Integrada para a Proteção do Meio Ambiente, regulamentando a ação das Forças Armadas na proteção ambiental. E a portaria 303 define as salvaguardas para terras indígenas, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o território Raposa Serra do Sol, em Roraima, estabelecido em 2011. Neste último, uma das preocupações é o impedimento à ampliação da terra indígena demarcada.

O secretário reclama também que a presidenta Dilma Rousseff, em dois anos de mandato, “não ouviu os povos indígenas nenhuma vez, mas está interferindo seriamente na vida das comunidades”. E prossegue: “O governo só está ouvindo o agronegócio. As medidas anunciadas para mudar o sistema de demarcações terão como efeito a maior burocratização. Na prática, vão impedir a demarcação. Hoje, leva-se cerca de 20 anos para efetivar uma demarcação. Com as mudanças, envolvendo todos esses órgãos, vai levar muito mais”, avalia.

No mês passado, a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, participou de audiência na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados sobre a demarcação de terras indígenas. Na ocasião, declarou que a Funai não pode responder sozinha pela demarcação de territórios e que o Supremo Tribunal Federal deve se posicionar quanto às regras.

O governo quer envolver outros órgãos no processo, como o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), pois muitas reivindicações estão sobre áreas produtivas.

Além destas ações, há diversos projetos tramitando na Câmara Federal e no Senado, propondo alterações no modo como são definidos os territórios indígenas. Dentre eles, Buzzato destaca a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215 de 2000, que transfere para o Congresso a competência de legislar sobre demarcações.

“A bancada ruralista está usando o Congresso para benefício próprio. Essas ações têm por objetivo tomar o controle do processo para impedir novas demarcações. E o governo Dilma, em uma situação só comparável ao período da ditadura (1964-1985), está parando as demarcações”, afirma.

Conflitos

Nos últimos dias, os conflitos relativos à demarcação de territórios se intensificaram no Mato Grosso do Sul. No dia 30 de maio, o índio da etnia terena Oziel Gabriel, de 35 anos, foi morto a tiros durante a tentativa de desocupação da fazenda Buriti, em Sidrolândia, a 60 quilômetros da capital Campo Grande, ocupada desde o dia 15 de maio.

Três adolescentes foram apreendidos e 14 adultos detidos no processo. Porém, a reintegração de posse não foi realizada. Como protesto pela morte, os terenas ocuparam outra fazenda, em Aquidauana, a 140 quilômetros da capital do estado, no dia 31 de maio. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, prometeu rigor na apuração.

Ontem (2), a juíza federal substituta Raquel Domingues do Amaral deu prazo de 48 horas para a União e a Funai convencerem os indígenas a deixarem a fazenda. Segundo o Cimi, a área da fazenda foi declarada como de ocupação tradicional pelo Ministério da Justiça, em 2010. O território teria 17 mil hectares, mas os índios ocupam somente três mil.

A situação se estende a outros estados, como o Paraná, onde 30 lideranças e caciques de diversos povos indígenas ocuparam a sede estadual do PT, na capital Curitiba, também na manhã de hoje. O ato foi um protesto contra a decisão da ministra Gleisi Hoffmann, de suspender todos os processos de estudos para demarcação de terras indígenas no estado.

Segundo a Casa Civil, haverá uma audiência entre a ministra e os povos indígenas do Paraná, com a participação do ministro José Eduardo Cardozo. Mas não há data definida para o encontro. Já sobre os conflitos no Mato Grosso do Sul, não há nenhuma perspectiva de conversa entre governo e povos tradicionais.

Belo Monte

Os indígenas que permanecem no escritório central do canteiro de obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, prometeram deixar o local amanhã (4), para se reunir com representantes do governo federal, após uma semana de ocupação. Cerca de 150 índios estão no escritório central. No entanto, eles avisaram que, caso não haja avanços nas negociações, vão ocupar novamente o local.

Dentre as principais reivindicações dos índios está a suspensão de todas as construções de hidrelétricas na região amazônica, até que seja regulamentado o processo de consulta prévia às comunidades tradicionais, previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Os trabalhadores voltaram ao canteiro de obras na última sexta-feira (31), mas a situação só se normalizou hoje.

Com informações da Agência Brasil

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