Agricultura orgânica é refém das certificadoras, diz pesquisadora da USP

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arquivo RBA

Produtores enfrentam forças capitalistas para garantir alimento sem agrotóxicos

São Paulo – Os agricultores que conseguem resistir às pressões da indústria dos fertilizantes e dos agrotóxicos e se dedicam à produção de alimentos orgânicos têm pela frente outro desafio: a exploração das certificadoras. “Essas empresas cobram altas taxas, empurram produtos desnecessários e fazem reféns aqueles que querem vender sua produção”, acusou.

Sidneide esteve entre os participantes da mesa que ontem à noite (4) discutiu o sistema de monocultura no seminário “Terra, Alimento e Liberdade – o que você alimenta quando se alimenta?”, que vai até esta sexta-feira (7), na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP. O evento é promovido pelo coletivo ComerAtivaMente, que defende a reflexão crítica do modelo de produção agrícola dominante, dos hábitos de consumo por ele produzidos e reproduzidos. O grupo atua na organização de compras coletivas de alimentos e produtos de higiene e saúde diretamente do produtor.

A professora, que coordenou pesquisas no assentamento Milton Santos, em Americana (SP), destacou também as dificuldades encontradas pelos agricultores assentados em regiões degradadas pela monocultura da cana, que pela legislação passaram a ser responsáveis pelo passivo ambiental. Ou seja, têm de arcar, por exemplo, com todos os esforços para recuperação do solo que se tornou infértil pelo sistema agrícola baseado nesse tipo de agricultura.

“Encontramos ali um solo que tem todas as características de semiárido devido ao tratamento”, disse. Segundo ela, os danos ao solo são causados principalmente pelo uso de vinhoto como fertilizante. Trata-se de um resíduo pastoso e malcheiroso da destilação fracionada do caldo de cana de açúcar fermentado para a obtenção do etanol. E altamente poluente quando despejado em rios e córregos.

Pensamento único

Sideneide apontou problemas também com outra monocultura muito comum no Brasil, a soja. Produzida em grandes extensões de terra no Centro-Oeste, em territórios originalmente cobertos pelo cerrado, é exportada principalmente para a produção de ração animal, mas que tem diversas outras aplicações até mesmo na indústria farmacêutica, como na fabricação de pílulas anticoncepcionais.

“O dano ambiental causado por esse tipo de agricultura pode ser considerado uma catástrofe, já que a vegetação nativa não vai mais ser recuperada. As plantas do cerrado levaram milhares de anos para criarem estrutura, com longas raízes capazes de buscar os nutrientes naturais nesse tipo de solo”, disse Sidneide, ressaltando que tamanha produção de grãos não visa alimentar a população que tem fome, e que seus excedentes geralmente são destruídos para manter a alta dos preços.

“A monocultura da cana de açúcar, que utilizou mão de obra escrava no passado, tem hoje nos cortadores a mesma força de trabalho escravo, com rotinas pesadas e adoecimento. No Brasil ou em qualquer outro lugar em que haja esse tipo de produção, os cortadores são os que morrem mais cedo”, disse o economista e ativista colombiano Héctor Mondragón, que é assessor de movimentos sociais naquele país. “Lutar contra a monocultura é lutar contra a expropriação que priva os produtores rurais, os camponeses, de suas terras. É lutar para recuperar nossos corpos, nossa liberdade, contra todo tipo de violência”, disse.

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