Revisão, dez anos depois

Indefinição de prioridades provocou baixa efetividade do Plano Diretor de São Paulo

Apesar do nível de reduzido de implementação, planos regionais foram fundamentais para garantir as Zonas Especiais de Interesse Social, consideradas um dos grandes avanços do plano elaborado em 2002

Alf Ribeiro. Folhapress

O plano setorial de transportes foi um dos poucos criados, mas nem assim tudo foi efetivamente implementado

São Paulo – A não elaboração da maior parte dos planos setoriais, que definem os investimentos prioritários a serem realizados na cidade, determinaram a pouca efetividade do Plano Diretor Estratégico de São Paulo em regular as intervenções urbanísticas realizadas na capital. Junto a isso, a elaboração dos planos regionais contou com pouca participação das comunidades e foi feita sem diálogo entre as subprefeituras, o que provocou distorções de zoneamento nas fronteiras entre os distritos. As avaliações foram realizadas no 5º encontro de revisão do Plano Diretor e contou com cerca de 250 participantes, na tarde de hoje (11), no campus Barra Funda da Universidade Nove de Julho (Uninove), região central da cidade.

A secretária-adjunta Municipal de Desenvolvimento Urbano, Tereza Herling, lamentou a inexistência destes planos, fundamentais para efetivação do planejamento urbano. “Não existe Plano Diretor se ele não orientar os investimentos públicos e privados no sentido da cidade que queremos desenvolver”, disse. E chamou atenção para o papel dos governantes nesse processo. “O poder público tem o dever de respeitar e seguir as diretrizes propostas no plano”, afirmou.

Estavam previstos 13 planos setoriais que deveriam definir a prioridade de investimento em cada área. Desses, somente os de Circulação e Transporte, Turismo e Gestão de Resíduos Sólidos foram elaborados, mas o primeiro não foi aplicado e o último foi concluído apenas no fim do ano passado. Os planos de Educação e Habitação ainda tramitam na Câmara Municipal – o habitacional com indicações de ser arquivado, em virtude da defasagem de seus dados e propostas. Os documentos sobre Saúde, Assistência Social, Cultura e Controle e Redução da Violência ainda precisam ser verificados. Não foram produzidos os de Gestão de Áreas Públicas, Aeroportuário Metropolitano e de Aplicação dos Recursos do Fundo de Urbanismo.

No caso deste último, a não elaboração foi diretamente responsável pela falta de direcionamento na aplicação dos recursos obtidos pela outorga onerosa. Esse dinheiro é pago por construtoras à prefeitura pelo direito de ampliar a área edificada em determinado terreno, e deve ser direcionado para investimentos em infraestrutura em regiões que carecem de urbanização, melhoria em transporte e equipamentos públicos. Esse ponto foi o principal alvo de críticas nas discussões sobre habitação e instrumentos de política urbana.

O vereador e ex-presidente da Câmara Municipal José Police Neto (PSD) percebe outro fator determinante aos poucos avanços. “Não basta colocar no plano tudo o que se quer fazer na cidade, é preciso pensar no preço das coisas. Fizemos um cálculo, em 2009, que estimou em cerca de R$ 720 bilhões a verba necessária para implementação de tudo o que havia”, afirma. Para ele, além de planejamento integrado, é preciso pensar na viabilidade econômica. “Temos de pensar em ações que dinamizem a economia e tragam investimentos para a cidade, de forma que aumento a capacidade orçamentária do município”, avalia.

A militante da Marcha Mundial de Mulheres e ex-conselheira do orçamento participativo Nobue Fujimura defendeu a retomada do orçamento participativo como instrumento para a população garantir a destinação de verbas para as ações prioritárias. “É uma ferramente importante para sanar essa questão do entrave no orçamento. Isso não pode ser desculpa para não desenvolver as políticas”, afirmou.

O diretor do Departamento de Urbanismo da Secretária Municipal de Desenvolvimento Urbano, Kazuo Nakano, expõe que dentre as ações que deveriam ter sido efetivadas está o desenvolvimento de centralidades. “São áreas que concentram atividades e empregos nas regiões fora do centro expandido e que poderiam ser potencializadas como parte do ideal de aproximação emprego moradia”, explica. Porém, em dez anos, nenhuma ação foi implementada neste sentido. Os parques lineares, menina do olhos da gestão de Gilberto Kassab (PSD), também ficaram muito distante da proposta original. Na maior parte dos casos, foi produzido apenas um pequeno trecho de cada parque planejado.

No caso dos Planos Regionais das Subprefeituras, eles deveriam definir as intervenções urbanas, as prioridades orçamentárias, a implantação de equipamentos públicos e áreas verdes, a abertura e reestruturação de ruas e avenidas, entre outros, no plano local. Todas as subprefeituras têm seus planos regionais, mas muito desvirtuados dos objetivos originais e elaborados praticamente sem participação das comunidades. Os planos de bairro não foram desenvolvidos, embora em alguns planos regionais, como no distrito de Perus, onde houve participação popular, existam diretrizes para sua implementação.

As subprefeituras também não dialogaram na produção regional, o que acarretou que as divisas muitas vezes têm um zoneamento em um distrito e outro no vizinho. Isso complica ainda mais o mosaico de Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis) existente na cidade. Essas zonas definem o tipo de construção ou investimento a ser realizado, de acordo com as características da região. Mas foram estabelecidos tantos tipos de Zeis, aliados a essa definição por distrito, que ficou difícil elaborar políticas objetivas para cada parcela de área.

Nakano avalia, no entanto, que os planos regionais foram fundamentais para garantir o mapeamento das Zeis. “Sem eles, os parâmetros para definir as Zeis e avaliar quais empreendimentos poderiam ser realizados em cada local teria sido impossível”, disse. No entanto, segundo Nakano, é difícil saber se investimentos e ações de caráter local foram efetivados. “Nós defendemos a criação dos Conselhos de Representantes das Subprefeituras que, além de participar na elaboração das propostas, teriam um papel importante na fiscalização destas ações”, completa.

Para o coordenador do movimento Defenda São Paulo, Antônio Cunha, deve-se dar poder às associações de bairro na elaboração e fiscalização dos planos regionais e de bairro. “O poder público tem de apoiar financeiramente as associações de moradores para que nós, residentes nos bairros, possamos definir o que e como queremos: os investimentos, as intervenções urbanas e os equipamentos públicos”, reivindica. Para Cunha, é preciso que os planos regionais sejam prioridade após a revisão do plano, porque isso possibilitará uma cidade realmente para todos os habitantes.

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