Violência contra moradores de rua em Goiás mostra situação ‘fora de controle’

Marconi Perillo nega atuação de grupos de extermínio, mas ativistas dos direitos humanos afirmam que governo do PSDB permitiu agravamento da situação e sugerem intervenção

Ilustração da ONG Casa da Juventude retrata violência contra população pobre de Goiás: 27 moradores de rua mortos em seis meses (CC/caju)

São Paulo – “A crise de segurança no estado de Goiás fugiu ao controle.” A constatação, motivada pelos recentes episódios violentos contra moradores de rua em Goiânia, se alastra. A mesma declaração foi dada à RBA pelo vereador de Goiânia Tayrone Di Martino (PT) e pelo coodenador do Centro de Referência em Direitos Humanos João Bosco Burnier, Eduardo Mota.

No último sábado (6), dois moradores de rua foram assassinados na capital – uma criança de aproximadamente 11 anos e um adulto de 31. Ambos foram executados a pauladas no crânio. Com eles, o número de moradores de rua assassinados no estado desde agosto do ano passado, quando foi registrada a primeira ocorrência do tipo, chegou a 27.

No mesmo sábado, uma força-tarefa da Secretaria Nacional de Direitos Humanos esteve em Goiânia e o secretário Gabriel Rocha, de acordo com informações da Agência Brasil, afirmou que há uma política de extermínio em curso naquele estado e que, em pelo menos parte das mortes há indícios de participação de agentes públicos nas execuções. A mesma interpretação é feita pelo presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Wadih Damous. 

Segundo informações dos jornais O Popular, pelo menos dez dos moradores de rua foram mortos a tiros. Outros relatam a presença de uma caminhonete de cor prata nos locais e horários onde ocorreram parte dos crimes.

Em menos de seis meses, o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), já promoveu duas trocas de comando nas forças policiais do estado. No final de novembro, a troca foi geral, nos comandos de Polícia Militar, Polícia Civil e na agência do Sistema de Execução Penal. No mês passado, apenas o comando da PM foi trocado. 

O governo, por meio da assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança Pública e Justiça, nega a existência de grupos de extermínio de moradores de rua no estado. “Modus operandi, armas utilizadas e motivações dos casos esclarecidos não têm conexão entre si. Portanto, até agora não há indícios da ação de grupo de extermínio de moradores de rua em Goiânia”, diz o comunicado.

De acordo com a assessoria, em 12 dos casos as pessoas foram mortas a tiros,  dez foram esfaqueadas e em cinco as vítimas foram mortas a pauladas ou pedradas. A assessoria informa que dois casos são suspeitos de terem sido cometidos por uma mesma pessoa.

Segundo a assessoria, no dia 6 a PM iniciou uma operação para tentar desarmar a população e considera a presença da Secretaria de Direitos Humanos no estado como benéfica, pois isso poderá ajudar nas políticas de ação social para moradores de rua.

Segundo Eduardo Mota, porém, além dos indícios de execução de moradores de rua na capital e cidades do interior de Goiás, também há demonstrações de intimidação por parte da Polícia Militar sobre grupos de direitos humanos e ameaças de morte a pessoas e organismos de combate à violência no estado.

Para ele, a situação de violência contra moradores de rua é o lado mais visível e cruel da crise de segurança que atinge Goiás nos três últimos anos – período em que os números da criminalidade não param de crescer.

O coordenador do centro João Bosco Burnier afirma que, assim como cresceram os casos de assassinatos de moradores de rua no estado, também aumentaram os casos de violência envolvendo agentes das forças públicas nos últimos anos. “Além destes casos, com vítimas encontradas, identificadas ou não, há muitos outros de pessoas desaparecidas, em que não há encontro de cadáveres e, portanto, não há configuração de homicídios.”

Mota diz que, durante recente reunião realizada na sede do centro de referência, antiga Casa da Juventude, com representantes de grupos de direitos humanos do Rio de Janeiro e de São Paulo, cerca de 20 viaturas da PM passaram em frente ao local com sirenes e luzes ligadas. Ele afirma que pretende encaminhar à Organização dos Estados Americanos (OEA) denúncia de violação dos direitos humanos contra o governo de Goiás.

Segundo o vereador Tayrone Di Martino, a situação da violência em Goiás extrapolou todos os limites nos últimos meses e chegou a uma situação inadmissível com os dois últimos assassinatos. “Nós chegamos a uma situação nunca vivida antes no estado. A violência em Goiás está fora de controle e precisamos rever a política de ação social em relação aos moradores de rua no país”, disse. A Câmara de Goiânia vai fazer amanhã (10) uma audiência pública para discutir a situação.

De acordo com Di Martino, já estão confirmadas as presenças de representantes da Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República, da Assembléia Legislativa, do Ministério Público estadual e de entidades de proteção aos direitos humanos.

Segundo informações da assessoria de imprensa da Secretaria de Segurança Pública e Justiça de Goiás, a polícia já concluiu e enviou ao Judiciário dez inquéritos sobre as mortes de moradores de rua. Outros oito casos estão em fase de conclusão, com autoria definida.