Número de ameaçados de morte no campo mais que dobrou em um ano, diz CPT

Para comissão, conflitos envolvendo trabalhadores rurais já assentados, como foi o assassinato do casal extrativista no Pará, é dado recente e preocupante

São Paulo — Em relatório sobre conflitos no campo no ano passado, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) destaca as políticas públicas – ou falta delas – do primeiro ano do governo Dilma e o crescimento do número de trabalhadores rurais ameaçados de morte.  O número saltou de 125 registros, em 2010, para 347, aumento de 177,6%. O número de assassinatos, apesar de leve diminuição (de 34 para 29), não muda o cenário de insegurança no campo, pois alguns deles também foram vítimas de ameaças, diz a CPT.

“O argumento da conquista colonial com o qual se buscou justificar a morte de tantos povos indígenas, foi substituído pelo argumento do desenvolvimento do país, que permite, como ontem, seguir atropelando direitos e a continuidade das violências”, escreveu o historiador Antonio Brand, autor de um dos artigos do documento.

Sobre o aumento considerável dos números de ameaçados, a CPT considera que o fato de a grande maioria dos trabalhadores vítimas de ameaças fazer parte de comunidades tradicionais — como quilombolas e extrativistas —  e estarem assentados devidamente em terras registradas é um dado novo e preocupante. Jane Silva, da coordenação nacional da comissão, alerta para o empenho do setor privado, principalmente agrícola, em disputar as terras pertencentes a essas comunidades.

“Essa é uma realidade que tem de ser considerada porque são povos e pessoas que não estavam sem terra, eles estavam em seus assentamentos, em seus territórios. E há conflito porque há interesse do agronegócio em disputar aquelas terras. Isso é uma coisa nova. Hoje a gente não vê sem terra ameaçado, a gente não vê posseiro ameaçado, a gente vê populações que historicamente viveram tranquilas por duas ou três gerações e agora estão sendo ameaçadas.”, afirma a coordenadora, citando como exemplo o assassinato do casal extrativista José Cláudio Silva e Maria do Espírito Santo Silva, em maio do ano passado, em Nova Ipixuna, no Pará. José e Maria eram líderes de um assentamento e lutavam contra a ação de madeireiras na região.

A preocupação, acrescenta Jane, se dá pela baixa pressão e ineficiente enfrentamento dos movimentos sociais. Ela diz que há certa diminuição das ações de quem pleiteia, principalmente novos assentamentos, fazendo com que isso fortaleça os latifúndios e os latifundários –  “assim o governo não se sente pressionado em fazer a reforma agrária.”

Somados todos os conflitos no campo (por terra, por água, trabalhistas), os números mostram crescimento de 1.186, em 2010, para 1.363 (14,9%). Apenas os conflitos por terra passaram de 85 para 1.035, aumento de 21,32%.

A entidade classifica como “decepcionante” o fato de 2011 ter sido, desde 1995, o ano com menor número de famílias assentadas. “As primeiras manifestações públicas do governo deixaram a reforma agrária na mais completa penumbra”, diz o texto.

Amazônia Legal

Os estados que compõem a chamada Amazônia Legal (Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia Roraima e parte do Mato Grosso, de Tocantins e do Maranhão) é a região onde se concentra o maior número de conflitos. Do total dos conflitos registrados em 2011, 69% ocorreram naqueles estados, enquanto 79,3% do total de assassinatos e 85% das ameaças de morte também foram registrados na região. “A louca corrida atrás de riqueza natural se dá com voracidade incalculável. Na Amazônia, o modelo colonizador se reproduz com predação dos recursos, expoliação das comunidades existentes, concentração da propriedade da terra e violência”, diz o relatório.

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