Movimentos contam sete desaparecidos do Pinheirinho

Após mais de uma semana da reintegração de posse, moradores ainda falam sobre possíveis mortes durante a operação

São Paulo – Entre as denúncias de violência contra os ex-moradores da comunidade do Pinheirinho, em São José dos Campos, estão também as histórias de possíveis mortes durantea  ação policial na reintegração de posse ocorrida no último dia 22. Passados oito dias, as pessoas continuam a relatar os casos. A reportagem ouviu moradores que ainda estão nos abrigos à espera de encaminhamento para moradia. Os movimentos sociais falam em sete desaparecidos.

“O menino de uma das minhas vizinhas não apareceu mais desde aquele dia”, contou uma das abrigadas no Jardim Morumbi, Maria Lucia das Neves, de 43 anos. “Ouvi muita gente falando que estavam escondendo essas informações da gente”, disse. As possíveis mortes são tratadas com convicção pelas pessoas que moravam no local, mas, diante da falta de dados oficiais, vão virando lenda.

O presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), Ivan Akselrud de Seixas, declarou que esses relatos ainda não podem ser confirmados, já que não existem provas e poucas pessoas estão dispostas a dar testemunho. “A população mostra medo da retaliação”, disse. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São José dos Campos afirmou na última semana que houve assassinatos, inclusive de crianças. 

De acordo com um dos líderes do movimento de moradores do Pinheirinho, Valdir Martins, conhecido como Marrom, os feridos gravemente durante o que chamou de “massacre” não conseguiram ser localizados pelos moradores desde então. Um caso, em específico, chama a atenção: uma criança teria sido ferida por bala de borracha e, ensanguentada, foi levada a uma ambulância. “A gente acompanhou a criança e a mãe até a porta da ambulância, e fomos impedidos de ter mais informações”, disse. Segundo Marrom, um paramédico o advertiu que ali “eles entravam e saíam sem identificação”.

Em outro caso, dez pessoas que moravam no terreno afirmam ter visto uma criança morrer pela inalação de gás lacrimogênio, utilizado pela Polícia Militar para conter moradores na reintegração. Muitas das bombas foram atiradas dentro das casas, segundo os relatos. Algumas, que não estouraram, foram guardadas pelas pessoas como provas.

A Polícia Militar e a prefeitura desmentem as acusações. “Diferentemente do que foi divulgado por alguns órgãos de imprensa e redes sociais, não foi registrada nenhuma morte, de criança ou adulto, durante a operação de reintegração de posse”, diz nota da prefeitura à imprensa, que afirma ainda que apenas um homem ficou ferido, sem risco de morte. O coronel Manoel Messias Melo, comandante da operação, também negou que haja mortos e afirmou que a ação agiu somente contra “vândalos e anônimos que praticaram incêndios na região”.

Em mutirão realizado na última segunda-feira (30) pelo Condepe para coleta de relatos dos moradores foram obtidas 507 denúncias de vítimas de violência e danos materiais (como perda de móveis e documentos durante a ocupação). Dessas, 23 pessoas entraram com pedido de exame de corpo de delito.

Seixas, do Condepe, ressaltou que houve registros de denúncias de tentativa de homicídio. “Algumas pessoas explicitaram a intenção de matar por parte de guardas municipais e policiais militares”, disse.

Atingido por arma de fogo, David dos Santos prestou depoimento em áudio aos conselheiros do Condepe enquanto se recuperava no hospital municipal. Ele se encaminhava à casa de seu irmão, no Campo dos Alemães, após ser despejado do Pinheirinho.

Com ele estavam sua esposa e um casal de amigos, que presenciaram o ato. “Eles estavam de arma em punho, despreparados e muito nervosos. Não havia necessidade de eles estarem com aquelas armas, nem mesmo se alguém estivesse jogando pedra eles teriam razão”, disse David. O tiro atingiu as costas, na região lombar. O socorro partiu dos amigos do rapaz.

Danielle da Silva Napoleão também foi atingida por um tiro de borracha na boca e levou 12 pontos. Ela prestou depoimento na segunda (30), durante audiência pública da Câmara Municipal. “Eu estava na rua esperando notícias quando a Tropa de Choque atirou. Não tive assistência de policial nenhum. No meu ponto de vista, que sou leiga, penso que eles miraram na minha cara. A marca ficou por fora e por dentro. Eu espero justiça”, frisou.

 

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