PEC do Trabalho Escravo tramita há dez anos na Câmara e aguarda votação em segundo turno

Brasília – A Proposta de Emenda à Constituição 438/01, conhecida como PEC do Trabalho Escravo, tramita há dez anos na Câmara dos Deputados. A matéria já foi votada em primeiro […]

Brasília – A Proposta de Emenda à Constituição 438/01, conhecida como PEC do Trabalho Escravo, tramita há dez anos na Câmara dos Deputados. A matéria já foi votada em primeiro turno na Casa, mas precisa passar por uma segunda discussão. Caso haja alteração, ela volta ao Senado para nova apreciação, pois foi lá que a proposta começou a tramitar.

De acordo com o texto aprovado para discussão em segundo turno da matéria, “as propriedades rurais e urbanas de qualquer região do país onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observando, no que couber, o disposto no Artigo 5º” da Constituição Federal”.

O Artigo 5º determina que o direito à propriedade é garantido, mas que ela deverá atender à função social. Além disso, o artigo prevê que uma lei estabelecerá o procedimento de desapropriação, ressalvando-se os caos previstos na Constituição. É possível haver desapropriação sem indenização quando a propriedade é usada para plantação de drogas psicotrópicas. A PEC pretende incluir neste mesmo trecho (Artigo 243) a hipótese de desapropriação por causa da constatação de trabalho análogo à escravidão.

O deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS), contrário à proposta, disse que a preocupação dos setores do agronegócio quanto à matéria é que algumas questões precisam estar claras na lei para que não haja desapropriações injustas. “[Ainda falta clareza] sobre o que é trabalho degradante, sobre o que é uma jornada exaustiva. Temos que definir o que é esse tipo de coisa”, explicou. “[Há] pressão em cima dos produtores, como se estivessem praticando trabalho escravo. Em alguns casos há, mas na maioria não”, completou.

O deputado Federal Cláudio Puty (PT-PA), um dos que defendem a proposta, afirmou que é necessário a aprovação de uma legislação mais rigorosa contra a prática do trabalho escravo. “Precisamos de uma legislação mais dura contra esse instrumento que é reduzir custos nas empresas por meio da precarização do trabalho, chegando ao trabalho análogo à escravidão. Escravidão por dívida, por ameaças, por impedimento do direito de ir e vir”, disse.

Ele afirmou ainda que há um compromisso do presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), de colocar a matéria em pauta, mas ainda não há consenso. Somente neste ano, quase dez requerimentos foram feitos ao plenário da Câmara pedindo a inclusão na ordem do dia da proposta. A última vez que ela entrou em pauta foi em 2009, mas não chegou a ser apreciada.

Mais rigor para evitar a prática

O secretário de Assalariados Rurais da Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura (Contag), Antonio Lucas Filho, defende que os mecanismos em vigor para o combate ao trabalho análogo à escravavidão cumprem o seu papel, mas que é preciso medidas mais rigorosas para evitar a prática. “Temos consciência de que é preciso avançar nas políticas públicas para os trabalhadores assalariados do campo”, destacou. Para ele, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Trabalho Escravo pode ter um expressivo fator “simbólico” inibidor. “Acho que isso tem um simbolismo muito grande. Se conseguíssemos aprovar isso no Brasil, estaria de muito bom grado.”

Neste ano, a proposta completa dez anos de tramitação na Câmara dos Deputados e já passou por discussão no plenário da Casa. Ainda é necessário que a matéria seja discutida em segundo turno. Caso haja alguma alteração, ela será encaminhada para o Senado, onde começou a tramitar.

“Moradia, saúde educação, essas questões ainda não estão resolvidas. Mas só de se saber que o empresário que explora o trabalho escravo pode perder sua propriedade sem nenhuma indenização, criaria um fator inibidor dessa prática”, ressaltou o líder sindical.

Segundo informações do Ministério do Trabalho, só no ano passado mais de 2,6 mil trabalhadores foram resgatados de regimes de trabalho análogo à escravidão e 309 estabelecimentos foram inspecionados.

Para o membro da organização não governamental (ONG) Repórter Brasil e da Comissão Nacional Para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), Leonardo Sakamoto, proprietários que adotam o trabalho análogo à escravidão tem como objetivo a redução de custos. “Se a propriedade é o local onde a pessoa executa seu trabalho, sua produção e se vale dela para ter dinheiro fácil, por meio da exploração da dignidade das pessoas, nada mais justo perdê-la. A PEC está deixando isso claro. A propriedade no Brasil tem uma função de acordo com a Constituição, ela tem que servir para promover a dignidade”, explicou.

Ele disse ainda que nem todos os proprietários de terras são contrários à proposta e a demora na aprovação da matéria beneficia aqueles que se lavem da exploração do trabalho análogo à escravidão para competir de forma mais fácil no mercado. Sakamoto considera que muitos parlamentares, que desaprovam a proposta, são contrários à exploração do trabalho análogo à escravidão. Na verdade, eles têm receio é que a perda da terra possa ser estendida a outros casos em que a função social da propriedade não esteja sendo cumprida.

“Isso, para muitos parlamentares, abre um precedente. Por exemplo, com a aprovação da perda da propriedade em casos de trabalho escravo, alguém pode sugerir o mesmo em casos de desmatamento. Por isso, eles têm um receio muito grande. Esse medo do procedente é muito forte e por isso eles evitam [aprovar a PEC].”

Fonte: Agência Brasil.

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