Governo contesta competência do TCU para rever valores de anistia

Para Ministério da Justiça, definição do tribunal é “inoportuna e injustificável”, quebrando a confiança na retomada do Estado Democrático

São Paulo – O governo federal apresentou recurso à decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de rever os valores pagos aos anistiados do regime militar (1964-85). No documento, ao qual a Rede Brasil Atual teve acesso, o Ministério da Justiça e a Advocacia Geral da União contestam a competência do TCU para avaliar o caso.

O argumento apresentado pela Corte em agosto é de que os valores são muito altos e, na prática, constituem um acúmulo de aposentadorias para aqueles que recebem também pela Previdência Social. Aqueles que obtêm a condição de anistiado, após processo via Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, no geral recebem o direito a um pagamento mensal e continuado. Na visão do TCU, isso significa um acúmulo de pensão previdenciária. Mais de 7.000 beneficiários podem ser atingidos.

No entendimento do governo, a decisão do tribunal é “totalmente inoportuna e injustificável”. A avaliação, no recurso apresentado na semana passada, é de que a medida rompe o consenso estabelecido com a sociedade na tentativa de restabelecer a democracia. “Em um ato complexo que pode abalar irremediavelmente a confiança cívica que as vítimas depositaram no Estado democrático”.

A leitura é de que não se trata de um pagamento previdenciário comum, uma vez que decorre de uma situação excepcional e regulamentada. De acordo com a Lei 10.559 de 2002, todos os que foram atingidos por ações decorrentes de motivação política entre setembro de 1946 e outubro de 1988, tendo sido impedidos de exercer atividade profissional, têm direito a uma reparação.

A Comissão de Anistia do Ministério da Justiça entende que o TCU “apegou-se em pequena parcela de seu regime de execução, mas deixou de considerar inúmeras características do regime constitucional previdenciário, de todo incompatível com a prestação da Lei de Anistia”.

Em outras palavras, o entendimento é de que o trabalho gera a compensação da aposentadoria; a lesão provocada pelo Estado gera o direito à indenização. É inconstitucional, na visão do ministério, imaginar que qualquer lesão autorize uma pensão previdenciária.

Se aposentadoria e indenização não são a mesma coisa, o governo entende que o TCU não pode analisar o caso. Baseia-se, para isso, no texto da Constituição que define a competência do tribunal. O artigo 71 indica que o TCU tem o poder de analisar “aposentadorias, reformas e pensões”. As ações indenizatórias, portanto, estariam excluídas da alçada do tribunal.