Sem reforma agrária, índios e lavradores tornaram-se ‘inconvenientes’, diz Casaldáliga

Em entrevista à Rádio Brasil Atual, o ex-bispo falou sobre governo, eleições e a Agenda Latino-Americana 2010

Casaldáliga vê continuidade do governo Lula caso Dilma vença eleição, e afiram que luta pela reforma agrária continua necessária (Foto: Divulgação/Prelazia de São Félix do Araguaia)

São Paulo – Para o dom Pedro Casaldáliga, ex-bispo que de São Félix do Araguaia (MT), o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficou aquém do esperado em relação à causa indígena e à reforma agrária. Conhecido por sua atuação em defesa dos direitos humanos e contra as desigualdades sociais no campo, Casaldáliga fez as afirmações em entrevista ao Jornal Brasil Atual.

“Duas decepções, duas cobranças que fazemos ao Lula são precisamente (referentes) a causa indígena e a reforma agrária”, resume. “Aí está falhando gravemente o governo. A bancada ruralista é muito forte e os índios e os pequenos lavradores são (considerados) ‘um inconveniente'”, critica.

Apesar das críticas, dom Pedro Casaldáliga aponta que considerava esperado que os resultados da gestão tivessem limitações. “A gente sabia que (o governo Lula) não poderia, de uma hora para outra, se desvincular de uma humanidade que é capitalista e neoliberal. Também, como o próprio Lula tem recordado, ele é apenas representa o governo de um país”, pondera.

Pere Maria Casaldàliga i Pla, ou Pedro Casaldáliga, como prefere ser chamado, é espanhol da Catalunha e veio para o Brasil como missionário. Em 1971, foi nomeado bispo de São Félix do Araguaia. Defensor da Teologia da Libertação, sua primeira carta pastoral, em que refletia sobre o compromisso da Igreja com a justiça e a paz, intitulou-se: “Uma Igreja da Amazônia em conflito com o latifúndio e a marginalização social”. Seu trabalho contra o latifúndio e a desigualdade social na região do Araguaia rendeu-lhe três indicações ao Prêmio Nobel da Paz, em 1992, 2002 e 2006.

Nos anos da ditadura militar, foi alvo de diversos processos de expulsão do país e ameaçado de morte. Nesse período, o papa Paulo IV afirmou “tocar em Pedro é tocar em Paulo”. Para alguns, a declaração do sumo pontífice evitou maiores pressões do governo sobre o então bispo.

Agenda:

A Agenda Latino-Americana é uma publicação anual lançada desde 1991 em mais de 30 países. A cada ano, ela traz um tema central, tratado por especialistas que abordam que o abordam por ângulos diferentes. A agenda orienta o trabalho de agentes de pastoral, educadores e lideranças de movimentos populares.

Mais tarde, distanciou-se da linha política seguida pelo Vaticano, ao qual já fez severas críticas. Aos 82 anos, ele continua com suas convicções sobre as questões sociais e a mente atenta aos acontecimentos da atualidade.

Este ano, foi o anfitrião da Agenda Latino-Americana, cujo título foi “Salvemo-nos com o planeta”. “A ecologia é um verdadeiro ministério, um ministério a serviço da vida, da identidade e da eternidade”, afirma.

Eleição

Para ele, uma vitória de Dilma Rousseff, candidata governista à Presidência da República, representaria a continuidade do governo Lula. ” Alguns, ironicamente, comentam que Dilma é apenas uma ponte ‘de Lula para Lula’, que a próxima campanha eleitoral não seria para um sucessor, uma sucessora, mas para o próprio Lula. Não sei. O certo é que reivindicamos, com amargura e indignação, essa reforma agrária que não se faz”, cobra.

Casaldáliga acusa ainda uma tendência a se criminalizar movimentos sociais. “Depois, se sataniza o MST e outros movimentos trabalhistas a favor dos índios e a favor dos lavradores”, protesta.

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