Famílias pobres são mais vulneráveis ao desaparecimento de crianças e adolescentes

De 1.257 desaparecidos nos últimos nove anos, pouco mais da metade foi encontrada; 609 continuam sumidos

Brasília – Nos últimos nove anos, pelo menos 1.257 crianças e adolescentes brasileiros desapareceram. Segundo estatística disponível no site da Rede Nacional de Crianças e Adolescentes Desaparecidos (ReDesap), pouco mais da metade (648) conseguiu ser encontrada e 609 permanecem desaparecidas.

As unidades da Federação com mais registros de desaparecidos no período são Distrito Federal (297), Rio de Janeiro (144), São Paulo e Sergipe (ambos com 126), Goiás (94) e Minas Gerais (72). O problema é mais comum em regiões metropolitanas do que no interior dos estados.

Apesar de expressivos, os números devem estar subestimados, avalia o antropólogo Benedito Rodrigues dos Santos, coordenador da rede e secretário executivo do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

Segundo ele, a informação é colhida por telefone e ainda não há um sistema para cadastramento em tempo real dos casos registrados nos serviços de SOS Criança e nas delegacias de proteção às crianças e adolescentes.

Santos acredita que a maioria dos casos de desaparecimento começa com fuga do lar por motivo de conflito familiar, envolvendo violência física e até sexual. “A fuga é um sinal de sanidade para escapar da violência. O problema é que entre fugir de casa e o local onde a criança ou adolescente vai ficar podem acontecer muitas coisas e os desaparecidos ficam vulneráveis às redes de aliciamento para exploração e tráfico.”

Para o antropólogo, é preciso mudar a cultura do castigo físico e educar as crianças com base no diálogo. O Poder Público também deve estar mais próximo. “A educação das crianças dentro de casa ficou reservada ao mundo privado das famílias, e nós estamos percebendo que elas têm muita dificuldade nisso”, diz Santos, ao analisar que os novos arranjos familiares (com novos casamentos dos pais ou famílias com apenas um dos pais) devem ser considerados no entendimento do problema de violência doméstica, assim como a perda de autoridade de pais biológicos ou padrastos.

Conforme o secretário executivo do Conanda, as crianças pobres, mais vulneráveis socialmente, sofrem mais. “A classe média tem ainda alguma imunidade. Guarda relações de parentesco, pelas quais as crianças podem circular”, avalia. Segundo ele, os meninos e as meninas pobres que fogem acabam encontrando “formas de sobrevivência em redes clandestinas”, como tráfico de drogas e exploração sexual.

Santos chama atenção para os casos de “desaparecimento enigmático” de crianças que somem na rua ou são levadas de dentro de casa. Estima-se que esses casos, que são pouco solucionados, representem de 10% a 15% do total. “Esse é o tipo mais dramático porque é um percentual muito pequeno de crianças que são achadas. E é elevado o número de crianças encontradas mortas, com sinais de violência e sevícias [maus-tratos e crueldade]”, alerta.

Para o secretário executivo do Conanda, o sumiço de crianças é mais “um fenômeno social” do que caso de polícia. Mas ele alerta que é fundamental entrar em contato com a polícia e não esperar 24 horas para comunicar o desaparecimento. “Uma ação imediata da polícia pode ser crucial.”

Benedito Rodrigues dos Santos participou nesta quarta-feira (22) de audiência pública na comissão parlamentar de inquérito (CPI) da Câmara dos Deputados que trata do desaparecimento de crianças e adolescentes. Um projeto de lei proposto pela CPI, já aprovado na Câmara, tramita no Senado Federal para criar o Cadastro Nacional de Crianças Desaparecidas.

Nos dias 6 e 7 de outubro, será promovido em São Paulo um seminário sobre desaparecimento de crianças e adolescentes para fins de tráfico e exploração sexual.

Fonte: Agência Brasil

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