Sem defensoria, presos ficam esquecidos na cadeia

Defensores não dão conta da demanda em São Paulo e mutirões carcerários tentam amenizar a realidade do estado com a maior população carcerária do país; confira infográfico especial

Gabriela, do Rio, frequenta os presídios enquanto a colega Franciane, de São Paulo, não dá conta da demanda (Foto: Rodrigo Queiroz)

A defensora pública Gabriela Menezes Gulla trabalha no Rio de Janeiro, na Defensoria Pública mais antiga do Brasil (criada em 1954) e que ostenta o maior quadro de profissionais do país, 752, uma média de um defensor para cada 13 mil usuários potenciais.

A estrutura serve de referência. “A defensoria do Rio tem profissional em todos os presídios”, explica a colega paulista Franciane Fátima Marques, coordenadora da área de execução penal da capital da Defensoria Pública de São Paulo.

“No Rio, os presos já sabem que vão ser atendidos pelos defensores”, explica Gabriela que, ao contrário de Franciane, participa raramente de mutirões para libertar presos que cumprem pena a mais ou com direito a algum benefício. “O mutirão é necessário em situações de crise. Aqui no Rio ocorre, mas não tem tanta necessidade”, afirma.

Prisão é regra, liberdade é exceção

A Lei Orgânica Estadual da Defensoria Pública (988/06) de São Paulo estabelece que a instituição tenha sala própria em cada estabelecimento penal, a exemplo da do Rio, que conta com defensores para uma população carcerária de 26 mil presos.

Edição 38A defensoria pública é a porta à Justiça para a população que não pode custear um advogado particular, como retrata a reportagem da Revista do Brasil (edição 38), que está nas bancas e traz a luta da defensoria de São Miguel Paulista em São Paulo para barrar a reintegração de posse em um terreno ocupado por dezenas de famílias carentes que não teriam para onde ir. 

As penitenciárias paulistas não têm salas para os defensores, o que compromete o cumprimento da lei e o acesso à justiça.

Segundo o Ministério da Justiça, até dezembro de 2007, da população carcerária brasileira que totaliza 422 mil presos, 153 mil estavam em São Paulo. “Não damos conta de tudo”, diz Franciane que precisa atender a mais de 5 mil processos simultaneamente, média de cada um dos 12 defensores criminais na capital.

Segundo dados de 2008, apenas na capital 51 mil processos estavam em andamento.

Há superlotação de presos – mais de 50 mil – para uma estrutura que comporta somente 96 mil. A ausência dos “advogados públicos” no dia a dia inviabiliza a solução de uma dura realidade, a dos presos esquecidos. “Ou você vai ao presídio ou faz os seus milhares de processos. A gente não consegue ter esse contato fundamental com o preso”, desabafa Franciane. 

Os defensores realizam mutirões na tentativa de desafogar esse quadro. No dia 19 de maio, por exemplo, uma força-tarefa revisou a situação processual de 1400 presos do Centro de Detenção Provisória III de Pinheiros, São Paulo. Os dados do mutirão solicitados pela Rede Brasil Atual à Defensoria ainda não estão disponíveis, no entanto, a defensora Franciane, coordenadora do mutirão, adiantou que muitos presos estavam em situação irregular. “Direito a benefício ou cumprindo pena a mais do que o determinado são situações comumente encontradas”, afirma.

Mutirões coordenados pelo Conselho Nacional de Justiça no período de um ano libertaram 4781 presos a partir da análise de 28.052 processos em 13 estados. Desse total, 17,36% dos presos envolvidos foram soltos incluindo 310 menores.

“É muito interessante o que revelam esses mutirões, porque o sistema de justiça, principalmente o Supremo Tribunal Federal, vem dando muita ênfase à importância da defensoria pública. Dentro do sistema de justiça temos esse reconhecimento, menos por parte do Executivo.  A falta de vontade política em não fortalecer a defensoria é um grande erro porque à medida que a população tomar consciência isso será cobrado”, finaliza Franciane.

 

Leia também

Últimas notícias