Justiça rejeita liminar para retirar símbolos religiosos de órgãos públicos

Para representante de associação de ateus, resultado da liminar já era esperado, mas manifestações de juíza preocupam

A Justiça de São Paulo rejeitou liminar pedindo a retirada de símbolos religiosos dos locais de atendimento público dentro de órgãos federais. Na decisão anunciada nesta quinta-feira (20), a juíza Maria Lúcia Lencastre Ursaia, da 3ª Vara Cível Federal de São Paulo, manifesta que um símbolo religioso, como crucifixos, é algo comum em um país de tradição cristã como o Brasil e “nada representa, assemelhando-se a um quadro ou escultura, adereços decorativos”, disse a juíza.

Daniel Sottomaior Pereira, presidente da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (Atea), considera que a decisão sobre a liminar era esperada. Ele reconhece que a questão era delicada. Sottomaior, que acompanha o caso, lembra que o importante é o julgamento do mérito da questão, e aí sim há motivos para preocupar-se com a posição da juíza.

Ele aponta que há um livro datado de 1891 que registra reclamações contra a colocação de crucifixos em repartições públicas. “Há 120 anos que pessoas se opõem a esses símbolos, de maneira que dizer que isso não acontece é fechar os olhos”, afirma.

No entendimento do Ministério Público Federal, a colocação de crucifixos em lugares públicos desrespeita o Estado laico. Para a juíza, o Estado laico não deve ser entendido como uma instituição antirreligiosa ou anticlerical. “O Estado laico foi a primeira organização política que garantiu a liberdade religiosa. A liberdade de crença, de culto e a tolerância religiosa foram aceitas graças ao Estado laico, e não como oposição a ele.”

O presidente da Atea prefere fazer uma comparação com o futebol para explicar a questão: “Digamos que em vez do crucifixo tivesse a flâmula do Corinthians. E eu quisesse que a flâmula fosse retirada. Será que eu sou antifutebol porque quero que a flâmula seja retirada? É óbvio que não. A flâmula dá mostra claras, incontestáveis de partidarismo. É a circunscrição de uma posição. Se você não quer que o Estado seja partidário, como manda a Constituição, não cabe ao Estado dizer que um time é melhor que todos.”

Ele aponta que a colocação de um símbolo coloca em suspeição a isenção dos Poderes. Sottomaior cita como exemplos o julgamento de um divórcio ou de um aborto, questões polêmicas para as religiões cristãs. A associação entende que a juíza deve estudar melhor o tema da laicidade na hora de julgar o mérito da questão.

“É preciso abrir os olhos para o óbvio. O Brasil foi um Estado não-laico durante quatro de seus cinco séculos de existência. Como eram as repartições públicas neste tempo? Exatamente iguais às de agora. O Estado virou laico, mas as repartições ficaram iguais”, questiona Sottomaior.