Defensoria Pública trabalha no limite

Falta de defensores e estrutura vai contra a democratização do acesso à justiça para os mais carentes como prega a constituição; confira reportagem especial na Revista do Brasil de agosto, que está nas bancas

Rafael Português é Defensor Público, para ele ideologia de defensor são os excluídos (Fotos: Gerardo Lazzari)

Nos corredores do maior Fórum da América Latina na Barra Funda, São Paulo, a defensora pública Franciane Fátima Marques responde a um assistido enquanto caminha para sua sala de trabalho.

O dia será cheio no plantão. “É uma loucura, são centenas de pessoas por dia”, explica Franciane, que antes de defensora foi da Procuradoria Geral do Estado, órgão que “supriu” por anos a falta de assistência judiciária gratuita à população de São Paulo.

Apesar da Constituição de 1988 solicitar a criação das defensorias ao poder executivo dos Estados, somente em 2006 e por força de intensa mobilização popular e apoio de mais de 300 entidades da sociedade civil os paulistas conquistaram a sua que é a mais recente do país.

Os “advogados públicos” são profissionais formados em direito que prestam concurso específico para atuar na defesa dos mais carentes – cível, família, criminal e execução criminal, além dos vários núcleos especializados. “No meu caso é ideológico, gosto de fazer isso”, discursa Franciane.

Os defensores precisam driblar as adversidades do dia a dia como falta de investimentos, baixos salários e poucos defensores. O atendimento pleno e com estrutura é “insuficiente”, segundo números do Ministério da Justiça, publicados no II Diagnóstico da Defensoria Pública, de 2006, que mostra que, em média, os estados gastam 24,37% do orçamento do Judiciário com o Ministério Público e 3,33% com a Defensoria.

Reintegração de posse em Artur AlvimA defensoria pública é a porta à justiça para a população que não pode custear um advogado particular, como retrata a reportagem da Revista do Brasil (edição 38) que está nas bancas e que traz a luta de defensores de São Miguel Paulista para barrar a reintegração de posse em um terreno ocupado por dezenas de famílias carentes que não teriam para onde ir. Também o site publica três textos complementares sobre o tema nos próximos dias, a começar por este.
 

Faltam defensores

Coordenadora da Área de Execução Penal da Capital, Franciane corrobora com o diagnóstico. “O número de defensores na execução criminal, por exemplo, é pequeno para a demanda, um problema que é de todas as áreas”; “a gente trabalha sempre no limite”, diz.

Na área criminal o número de habeas corpus a favor de réus presos chega a 15 mil por ano. No Superior Tribunal de Justiça de 7 habeas corpus 1 é da defensoria pública de São Paulo.

No total são 400 defensores (mais 100 vagas foram anunciadas pelo governo) para todo o Estado que tem média de 850 mil atendimentos anuais e 23 milhões de potenciais usuários da defensoria (maiores de 10 anos e que comprove renda mensal familiar de até três salários mínimos).

A defensoria está presente em apenas 22 comarcas de 360. “A capital ainda é ‘privilegiada’ porque somos 12 defensores criminais, mas tem lugar como Presidente Prudente que a demanda é altíssima e tem apenas um defensor”, explica Franciane.

Edição 38E mais: a Chernobyl da Amazônia equatoriana; como os bancos conquistaram o jornalismo brasileiro; como a terceirização degrada o trabalho; e como o cinema reconstrói a história

Para que todas as áreas sejam bem atendidas seriam necessários “1700 defensores”, explica o defensor Rafael Vernaschi da Associação Paulista dos Defensores Públicos (APADEP). “Quem acusa é o promotor, quem defende é o defensor e quem julga é o juiz. Então, no mínimo, a gente teria que estar equiparado com o Ministério Público no número de cargos”, diz.

Em todo o Brasil atuam aproximadamente 5 mil defensores numa proporção de 1,8 defensor para cada 100 mil habitantes. Quase todos os estados possuem suas defensorias; Goiás, Paraná e Santa Catarina não criaram as suas.

 “Sem ampliação da estrutura e sem defensor suficiente não dá para dizer que existe uma assistência jurídica nos moldes que a constituição prega. A gente tenta fazer a nossa parte”, finaliza Franciane.

“A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do artigo 5º, LXXIV.” ( Artigo 134 da Constituição Federal)

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