Mães de vítimas de policiais em maio de 2006 esperam por Justiça

Histórias dos dias que se seguiram aos ataques do PCC serão contadas em filme

Quando acompanhou uma jornalista estrangeira que cobria os ataques do crime organizado e a reação policial entre 12 e 21 de maio de 2006, Ali Rocha não sabia, mas estava dando início a um projeto que tomaria os anos seguintes de sua vida.

Depois de meses questionando qual seria a melhor maneira de não deixar o caso cair no esquecimento, encontrou a saída: produzir um filme. Desde então, Ali Rocha acompanha a luta de pessoas que têm algo em comum: filhos mortos em meio a fatos confusos e com casos pouco ou nada esclarecidos. Por meio de imagens de arquivo, jornais, entrevistas e animações, as histórias serão recontadas. O filme, que ainda espera por um nome e por verba para finalização, deve ser lançado até o fim do ano.

A produção narra vidas como a de Débora Maria da Silva, que depois da morte do filho resolveu fundar a Associação Amparo de Mães e Familiares de Vítimas da Violência, em Santos, litoral paulista. Hoje, são 17 pessoas, todas “debilitadas de tanto clamar durante três anos. Ninguém ouve a gente”, relata Débora Maria. Sem querer deixar as mães abandonadas, Ali Rocha muitas vezes tem que lidar com uma situação difícil porque “é tudo muito pesado, são histórias trágicas”.

Como a do gari Édson Rogério Silva dos Santos, morto aos 29 anos. Quando parou para abastecer a moto em um posto de gasolina de Santos, ele foi violentamente abordado por policiais e assassinado alguns metros depois. As duas testemunhas do caso, o frentista do posto e um amigo de Édson, desapareceram com medo de represálias. A vítima, no caso, era filho de Débora Maria, que há três anos busca investigação e agora acredita que a única alternativa é a federalização das investigações.

As câmeras do posto de gasolina poderiam ter solucionado o caso, mas os policiais resolveram recolher os equipamentos com um mês e 18 dias de atraso. O resultado é que as gravações já haviam sido apagadas. No Comando de Operações da Polícia Militar de Santos, todas as ordens foram omitidas ou esquecidas. Todos os policiais negam que uma viatura tenha passado pelo posto de gasolina em que começou o crime. Em um primeiro momento, o condutor da viatura afirmou que foi chamado ao local para atender um homicídio. Depois, mudou a versão para acidente de moto. Os crimes ocorridos na cidade do litoral paulista, conta Ali Rocha, têm um perfil parecido: são cometidos por homens encapuzados, uma pessoa morta é “socorrida” no hospital para que a cena do crime não seja preservada, as balas desaparecem e logo chegam viaturas que ninguém chamou.

Até hoje, há quatro desaparecidos. Em um dos casos, a família só conseguiu registrar o Boletim de Ocorrência mais de um ano depois do crime. O futuro Paulo Alexandre Gomes, então com 23 anos, foi definido quando uma viatura da ROTA entrou na comunidade em que ele estava. Testemunhas viram o carro entrando na viela onde estava o rapaz. Outras pessoas notaram um saco preto na parte de trás do carro quando os policiais deixavam o local. Todos os casos contados por Ali Rocha em seu filme têm algo em comum: “há a criminalização da pobreza. Todos que foram mortos eram pobres. A polícia tem um perfil que eles já prejulgam”.