Lenine faz manifesto ecológico no álbum ‘Chão’

Podem parecer cascos de árvores, passos de pessoas numa estrada de terra e até sons do garimpo, os ruídos que são ouvidos no início da ótima canção “Chão”, que faz […]

Podem parecer cascos de árvores, passos de pessoas numa estrada de terra e até sons do garimpo, os ruídos que são ouvidos no início da ótima canção “Chão”, que faz parte do décimo álbum do cantor e compositor pernambucano Lenine, que a compôs com Lula Queiroga. “Chão segue debaixo do mar / O assoalho do planeta e do terceiro andar / Chão onde a vista alcançar / Todo e qualquer caminho pra percorrer e chegar”, canta nessa que apenas principia uma espécie de manifesto ecológico, formado pelas outras nove canções.

A tentativa de se aproximar de todas as maneiras dos sons da natureza marca a maior parte das faixas desse álbum quase experimental. Esse é o caso do canto dos pássaros na linda balada “Amor é pra quem ama”, parceria com Ivan Santos, co-autor também de “Seres estranhos”, que é mais urbana e trata de dois personagens – o diabo da capa, que solta os cachorros, e Madame Satã, que é avoado e brilhante.

O que dizer então do som da árvore sendo derrubada por uma serra elétrica separando “Envergo mas não quebro”, composta por Lenine com Carlos Rennó; do fortíssimo lamento “Malvadeza”? “Malvadeza / Judiar assim / Tenha dó do meu coração / Que desatinou, roeu que deu pena / Amargou essa solidão / Desabou a chorar por ti, ô, Serena / Pronto pro teu perdão”. Verdadeira obra-prima. Rennó é parceiro também em “Isso é só o começo”, também marcada por sons da natureza: “Estranhos dias vivemos / Dias de eventos extremos / E de excessos em excesso / Mas se com tudo que vemos / Os olhos viram do avesso / Outros eventos veremos / Outros, extremos, virão / Prepare seu coração / Isso é só o começo”. Melhor manifesto ecológico impossível.

Duas quase cantigas encantam pela docilidade. São elas “Uma canção e só”, marcada pelo violão dedilhado por Lenine; e “Se não for amor, eu cegue”, outra parceria com Lua Queiroga: “Pode ser um lapso do tempo / E a partir desse momento / Acabou-se solidão / Pinga gota a gota o sentimento / Que escorrega pela veia / E vai bater no coração”.

“No início, havia apenas a palavra e meu principal significado de chão: tudo aquilo que me sustenta. Chão, quase onomatopeia do andar – que soa nasal, reverbera no corpo todo”, descreve Lenine, no release, buscando a essência do álbum que produziu com Bruno Giorgi e JR Tolstoi, entre março e agosto de 2011. A conclusão mesmo parece vir do término da letra da cativante “De onde vem a canção”, marcada pela inventividade de se utilizar os sons de um metrônomo e uma máquina de escrever tocados por Bruno Giorgi: “Para onde vai a canção / Quando finda a melodia? / Onde a onda se propaga? / Em que espectro irradia? / Pra onde ela vai quando tudo silencia? / Depois do som consumado / Onde ela existiria?”.

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