Desenvolvimento em foco

Caso da startup XporY mostra como uma empresa pode monetizar sua capacidade ociosa

Na onda da inovação, plataforma cria sistema que valoriza a economia colaborativa por meio de permutas multilaterais, um ganho principalmente para micro e pequenas empresas

geralt / Pixabay
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Ferramenta tecnológica para economia colaborativa permite encontrar recursos ociosos que podem ser compartilhados

Em nota técnica na 24ª Carta de Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS) tratei da Economia Colaborativa, destacando o caso da startup XporY. Aqui uma síntese daquela nota, cuja íntegra pode ser acessada em https://www.uscs.edu.br/noticias/cartasconjuscs.

 A economia colaborativa – também chamada de Economia compartilhada ou Economia em Rede – consiste naquela em que os bens ou serviços são compartilhados, reutilizados e economizados, seja no consumo, seja na produção (aluguel de equipamentos, partilha de espaços de trabalho entre outros). Assim, eles “podem ser partilhados entre pessoas ou entre empresas, os bens podem ser utilizados de forma gratuita ou sob o pagamento de uma taxa”.

Trata-se de uma nova área de atuação e investigação, criando um interesse crescente, em função do seu diálogo com a busca de soluções para problemas econômicos, sociais, culturais e ambientais contemporâneos. Este diálogo passa, entre outros aspectos, pela cooperação e utilização compartilhada de insumos e produtos, com redução de custos, de consumo e de necessidade de materiais. O processo da economia compartilhada pode se dar de diversas maneiras, tais como aluguel, empréstimo, troca e doação, e não propriamente pela aquisição de bens. Startups como Uber, Airbnb, Blablacar e Yellow Bike são exemplos de empresas da economia colaborativa.

A economia colaborativa não é propriamente uma “novidade”, já que a troca direta e o uso comum dos recursos já estavam presentes nos primórdios da atividade econômica. O que é novo é o expressivo e crescente volume de transações envolvidas na economia colaborativa, especialmente a partir das últimas três décadas, e sobretudo da crise global de 2008, associada à intensa utilização de ferramentas tecnológicas (como é o caso das tecnologias de geolocalização) para o incremento dos negócios relacionados à economia colaborativa.

Atuando na área da “economia colaborativa” ou “economia do compartilhamento”, a fintech XporY apresenta uma solução inovadora para um grande problema de todas as empresas, especialmente as pequenas, que é a falta de utilização dos recursos da empresa criada pela ociosidade produtiva, com o consequente aumento de custos e queda da produtividade. Apesar da solução e da ferramenta proposta por esta fintech servir para empresas de qualquer porte (micro, pequena, média e grande empresa), o foco é a micro e pequena empresa.

Sinteticamente, a xpory.com funciona da seguinte forma:

  • A pessoa se cadastra utilizando CNPJ ou CPF e anuncia suas ofertas na plataforma em X $;
  • Um dos milhares de clientes da plataforma pode se interessar pela oferta;
  • O interessado compra pelo site ou aplicativo, e qualquer detalhe da negociação é feito diretamente entre vendedor e comprador;
  • O vendedor recebe seu pagamento na hora, pela moeda digital “X $”;
  • A partir daí, o vendedor pode comprar qualquer produto ou contratar qualquer serviço de clientes cadastrados na plataforma, utilizando o crédito em X $ recebido;
  • Quem detém o crédito em X $ paga 10% do valor da compra em reais para a XporY.com.

A seguir reproduzimos alguns trechos de entrevista que realizamos com Rafael Barbosa, sócio fundador e CEO da xpory.com:

Você pode começar a contar seu modelo de negócio, sua startup… Como funciona o seu modelo de negócio?

Rafael Barbosa: A XporY.com é uma plataforma de permutas multilateriais. Esta plataforma tem uma espécie de crédito interno, que faz com que estas permutas se realizem. Como a maioria das fintechs, começamos como uma startup, com uma ideia. Tivemos a felicidade de ganhar recursos da Finep, para desenvolver nosso modelo de negócio. A gente tem um crédito interno, como se como se fosse uma moeda, mas não é uma moeda. Com ela as empresas conseguem fazer permutas multilaterais. É um avanço ao que existe na permuta tradicional, já que ela permite que a empresa venda o seu produto ou serviço que está ocioso, receba este crédito interno do nosso site e compre o produto ou serviço de outra empresa – fazendo com que haja um incremento de sua eficiência, tornando mais provável fazer negócio. A empresa monetiza a sua capacidade ociosa. Tem-se assim um impacto positivo no fluxo de caixa. Nosso modelo de negócio se baseia na monetização da capacidade ociosa da empresa de qualquer tamanho, ou de profissionais liberais. De forma que, ela [a empresa] monetize o que ela está desperdiçando, o que não está vendendo. A empresa recebe o crédito em uma moeda alternativa, que é o crédito de nossa plataforma; e compra o que ela precisa. Quando o empresário desta empresa faz a operação de compra do que ela precisa, ele está, consequentemente, preservando o caixa [da empresa] em Reais. Com isso, a performance financeira da empresa fica melhor do que a da empresa que é similar mas que não faz permuta multilateral.

Você diria que o produto final de sua fintech é o crédito?

Não. O nosso produto não é o crédito. O nosso produto final é a capacidade    de a gente monetizar a capacidade ociosa e com isso melhorar a produtividade da empresa. Só que a gente faz isto através desse crédito alternativo que as empresas geralmente não têm no sistema financeiro. Com o nosso modelo, elas conseguem este crédito de uma forma colaborativa.

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O crédito é uma parte importante do modelo, sem dúvida. Mas a parte mais significativa é, de fato, a inteligência de fazermos com que a capacidade ociosa da empresa seja “consumida”, reduzida. Com isso, a redução da capacidade ociosa torna-se um resultado da empresa. Depois de 10 anos trabalhando junto com o Sebrae, hoje eu me atrevo a dizer que a capacidade ociosa da empresa é uma espécie de “câncer”. Esta palavra é um pouco forte, principalmente para quem teve parentes com esta doença na família, mas eu vejo desta forma. Fazendo uma analogia empresarial, a capacidade ociosa vai matando a empresa aos poucos. A verdade é que poucos empresários sabem diagnosticar e dimensionar a capacidade. E aqueles que o sabem, fazem vistas grossas. A gente vê que o empresário – seja ele pequeno, médio ou até grande – sair todo o dia para o trabalho querendo trazer mais dinheiro, mais faturamento para a empresa. Mas ele não tem uma visão muito clara das despesas. Nossa proposta é olhar pelo lado das despesas da empresa. Nós não propomos trazer faturamento em reais novo para a empresa. O que a gente faz é com que aquela capacidade ociosa que não está sendo utilizada e vendida seja reduzida e comercializada. Com este crédito, o empresário pode resolver todas aquelas despesas que estão “no fundo da caixa d’agua da empresa”. Estas despesas são os “furos da caixa d’água da empresa. O que ajudamos é fazer aumentar o nível da caixa d’água em reais, isto é, o fluxo de caixa da empresa. Assim, trazemos ao empresário uma nova forma de ver o fluxo de caixa da empresa. Este modelo traz um resultado na prática. Um resultado realmente eficiente.

Você tem uma parceria com a Cufa, a Central Única de Favelas. Queria que você contasse um pouco como é esta parceria, como funciona e como é lidar com este público, que em geral não é a prioridade dos grandes bancos.

Para a gente o fato de os moradores de favelas não serem prioridade dos principais bancos é até uma vantagem. Isto nos deixa uma “avenida” mais aberta para podermos trabalhar. Sabemos que existe uma carência maior deste pessoal. Estamos atuando com eles (Cufa) juntamente com o Sebrae. Então, a gente diagnosticou primeiro uma necessidade de vários treinamentos. Então, antes da gente aplicar a ferramenta de rodada de negócios, a ferramenta de transação, que é a própria ferramenta da xpor.com, entendemos, junto com o Sebrae e a Cufa, que há necessidade de uma série de treinamentos. O Sebrae está se incumbindo disso: treinamento em gestão comercial, formatação de preços. Todo aquele rito do Sebrae com o MEI, as micro e as pequenas empresas. O Sebrae está concluindo esta etapa agora. E nós vamos organizar a primeira rodada de negócios.


Ana Carolina Tosetti Davanço é economista e mestra em Administração pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS). Autora da dissertação ‘Fintechs: Tipificação no mercado brasileiro. 2022’