Falta de noção

Bolsonaro e Guedes vieram para destruir o Estado e a dignidade da população

Frases absurdas do ministro da Economia expõem a crueldade de um governo que ataca as políticas públicas criadas para proteger os mais necessitados, os que se aglomeram nas periferias das grandes cidades

Marcello Casal Jr / ABr
Marcello Casal Jr / ABr
Guedes: tripudia sobre a população após seu governo extinguir o Conselho Nacional de Segurança Alimentar

“Alimentar a população com restos de comida”, defende o ministro que deveria se preocupar em reativar a economia e incentivar a geração de empregos. “O Brasil precisa de mão de obra barata”, arremata o mesmo ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes. Provavelmente Guedes considere exorbitante o salário mínimo de R$ 1.100, cujos aumentos reais o atual governo Bolsonaro, preocupado em destruir o Estado, extinguiu, enquanto a inflação de alimentos explode, esvaziando o prato de adultos, crianças e adolescentes.

Assim, o ministro da Economia tripudia sobre a população após seu governo extinguir o Conselho Nacional de Segurança Alimentar, por meio do qual a sociedade construía políticas para garantir comida na mesa de todos. Pisoteia a dignidade dos brasileiros enquanto o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra que 31% dos lares brasileiros não têm renda do trabalho e sobrevivem sabe-se lá como.


Eu tive fome e me destes suas sobras. Não precisava tanto, ministro


As frases absurdas poderiam ser somente frases infelizes, mas não. Isso porque expõem, com clareza solar, a crueldade deste governo que, nas palavras do próprio presidente, veio para desconstruir. Bolsonaro busca destruir o Estado e as políticas públicas elaboradas para proteger a todos. Principalmente aos mais necessitados, aos que se aglomeram nas periferias das grandes cidades.

Até mesmo o Fundo Monetário Internacional (FMI), organismo criado para garantir a estabilidade do sistema capitalista e a acumulação de riqueza, revisou alguns dogmas. Diante dos efeitos avassaladores da pandemia e da profunda desigualdade de renda imperante no mundo, o FMI recomenda fortalecer o papel do Estado, garantir saúde pública, taxar os mais ricos e redistribuir renda para as famílias menos favorecidas. Desse modo, aos olhos do atual governo, o conservador FMI não passa de um antro de comunistas.

Frentes de ataques

As estapafúrdias declarações ministeriais se somam a iniciativas como a reforma da Previdência para dificultar aposentadorias e reduzir benefícios, a revogação das leis trabalhistas para precarizar relações de trabalho e salários, o desmonte das escolas e universidades públicas, a tentativa de acabar com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), o teto de gastos públicos que compromete a manutenção do SUS. Inclaa-se aí a negação da vacina e o desmonte dos centros de pesquisa científica, a destruição de florestas que compromete a biodiversidade e o futuro da humanidade, a privatização da água e da energia que levará aos apagões e à falta d’água, a entrega do petróleo que poderia redimir a secular falta de investimento em educação.


Bolsonaro e Guedes querem tirar trabalhadores dos fundos de pensão e transferir patrimônio aos bancos


Aos olhos do atual governo, tudo o que protege a população – saúde, educação, previdência, transporte, água, habitação, saneamento, energia – deveria ser objeto de lucro privado e não direitos de todo cidadão, previstos na Constituição Federal e garantidos pelo Estado. A minoria que pode pagar, acessa os serviços. A maioria que não pode, ficam sem. Só não consegue aprofundar ainda mais a destruição porque a sociedade teima em reagir, ainda que de maneira modesta.

Estamos no meio da encruzilhada. De um lado a barbárie representada pelo desmonte do Estado e das políticas públicas. De outro, o caminho da civilização a ser retomado pela continuidade da construção do Estado de bem-estar social apontado pela Constituição de 1988, que começou a ser construído pelos governos democráticos na alvorada do século 21 e foi interrompido pelos dois últimos governos.

É o povo novamente na rua quem vai apontar o caminho da reconstrução.  


José Ricardo Sasseron foi presidente da Associação Nacional de Participantes de Fundos de Pensão e de Beneficiários de Saúde Suplementar de Autogestão (Anapar), diretor de Seguridade da Previ e diretor do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região.

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