Desgoverno

Bolsonaro cogita demitir ministro Mandetta em plena guerra contra o coronavírus

Ministro da Saúde defende manutenção do isolamento social para conter o avanço da pandemia e se tornou um incômodo para o presidente da República

Marcos Corrêa/PR e Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Marcos Corrêa/PR e Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Quando ministro Mandetta passou a defender o isolamento social e demais práticas recomendadas pela ciência. Antes, porém, já havia dado sua contribuição para o enfraquecimento do sistema público de saúde, seguindo os passos do chefe, Jair Bolsonaro

São Paulo – O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, tornou-se uma pedra no sapato do presidente Jair Bolsonaro.

Alguns dizem que Mandetta é voz dissonante no governo Bolsonaro. Mas Bolsonaro é quem destoa, ao insistir em sua tese de “gripezinha”. Afinal, a pandemia do coronavírus já matou mais de 65 mil pessoas em todo o mundo. Enquanto Mandetta procura seguir as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), obtendo aprovação da maioria dos brasileiros, segundo pesquisas, Bolosonaro atua contra o isolamento social.

Realizado entre os dias 1º e 3 de abril, levantamento do Datafolha indica que 82% dos entrevistados, inclusive eleitores de Bolsonaro, classificam como ótimo ou bom o trabalho do médico e ministro da Saúde.

Mandetta defende o isolamento social, assim como médicos, cientistas e governantes de praticamente todas as nações. Mas fazer nada mais do que o elementar em um governo com esse comando tampouco é fácil.

A quarentena é até agora o único meio comprovadamente eficaz de reduzir a curva de doentes e salvar vidas nesses cerca de quatro meses em que a covid-19 assola o planeta.

Sem rumo

Em tempos de medidas urgentes e necessárias, a tarde desta segunda-feira (6) foi consumida pelo cai-não-cai de Mandetta.

O ex-ministro da Cidadania, atualmente deputado federal (MDB-RS), Osmar Terra, chegou a ser cotado para o cargo. Defensor do fim do isolamento social, como quer o presidente da República, Terra teria feito contato com alguns governadores para anunciar a decisão de Bolsonaro de demitir Mandetta.

O partido de Terra já se pronunciou: o deputado perderá o mandato caso decida assumir o Ministério da Saúde do governo Jair Bolsonaro. “Nós, do MDB, não vamos aceitar o Ministério da Saúde porque não somos contrários à prática do isolamento”, afirmou ao UOL o líder do partido no Senado, Eduardo Braga (AM).

Não se sabe se a queda do atual ministro da Saúde foi realmente aventada ou não passou de mais um dos muitos balões de ensaio ou recuos de Jair Bolsonaro. Parte da mídia comercial informou que ministros militares teriam convencido o presidente da República a não fazer a exoneração.

O mais grave, no entanto, é essa queda de braço com um integrante do governo, um dos poucos cuja atuação vem sendo pautada por medidas técnicas, com embasamento científico. E isso quando o país mais precisa de um governo de fato.

Contra todos

Bolsonaro também tem criado caso com governadores. A queda de braço com os estados do Nordeste se ampliou. Apoiadores de primeira hora do presidente da República já abandonaram o barco de Bolsonaro, como o governador de Goiás (DEM), Ronaldo Caiado.

Bolsonaro está em rota de colizão também com o chefe do Executivo de São Paulo, João Doria. O coronavírus parece ter enterrado de vez a dupla BolsoDoria das eleições de 2018.

Durante o anúncio da prorrogação da quarentena no estado – que até pelo menos 22 de abril –, Doria lembrou vários integrantes do governo federal que são favoráveis ao isolamento social, além de médicos e cientistas. “Será que todos eles estão errados? Será que a ciência mundial está errada? Será que o ministro e secretários de 56 países do mundo estão todos errados? Será que um único presidente no mundo é o certo? É quem tem o poder, ciência e conhecimento para discordar do mundo que quer proteger vidas e salvar pessoas?”, disse.

A possível demissão de Mandetta tornou-se o assunto mais comentado na rede social Twitter no Brasil. Panelaços e a #FicaMandetta indicam que Bolsonaro pode entrar em mais um barco furado. O pior é levar com ele a vida de milhares de brasileiros.