capitão e o marechal

Com Bolsonaro, cresce presença de militares no governo

Ainda que pareça distante de um regime de ditadura militar, presença de oficiais nos quadros políticos e administrativos do novo governo é significativo dos novos tempos

Wilson Dias/Agência Brasil

Autoritarismo bolsonarista sinaliza se alinhar ao ultraliberalismo na economia que ainda padece da privatização em massa

Sem paralelo com o regime militar (1964-1985), a ascensão de Bolsonaro traz algumas similitudes com o período do Marechal Eurico Gaspar Dutra que, eleito presidente da República (1946-1951), sucedeu um governo sem votos e assentado em golpe (Estado Novo de 1937-1945), aproximou-se dos Estados Unidos, rompeu com a União Soviética, exonerou funcionários públicos vinculados ao PCB (15 deputados federais e 1 senador, cassados) e patrocinou forte repressão aos movimentos sindicais e sociais. Se autoritário na política, Dutra dialogou com o liberalismo na economia frente à abertura comercial que fez diminuir as reservas externas, aumentar a dívida externa e a desacelerar a indústria nacional.

Nesse sentido, o ex-militar Bolsonaro – que foi eleito o presidente da República para suceder o governo Temer, sem votos e golpista –, pretende ser cópia tropical de Trump, presidente dos EUA, ademais de se opor a governos nacionais progressistas, exonerar funcionários públicos taxados de petistas e sempre desejar derrotar o PT, quem sabe empurrá-lo para a ilegalidade.

O autoritarismo bolsonarista sinaliza se alinhar ao ultraliberalismo na economia que ainda padece de anúncios da privatização em massa, dos cortes nos gastos, da destruição das políticas públicas e da “deforma” do sistema de aposentadoria e pensão.

Mas o paralelo entre o capitão e o marechal talvez não seja o mais apropriado, por hora, posto que o mundo não vive o contexto do segundo pós-guerra, eivado pela guerra fria entre os EUA e URSS e pela defesa da democracia, com governos eleitos para capitanear o desenvolvimento da nação e combate à pobreza e desigualdade. Além disso, o Brasil vinha de um período de importante crescimento econômico, com a industrialização em alta, num país que ainda detinha a maior parte de sua população residente no meio rural.    

Nos dias de hoje, proliferam governos de direita e o receituário neoliberal segue dominante. O Brasil encontra-se diante do quinto ano sem registrar crescimento econômico, com profunda desindustrialização e enorme exército de desempregados e de ampla massa de pobres e miseráveis urbanos a se misturarem simultânea e estranhamente com ações neopentecostais e o avanço do crime organizado. 

Ao mesmo tempo em que se distingue o deserto de quadros políticos e administrativos, o governo Bolsonaro patrocina a difusão da presença de militares nas mais diversas funções governamentais, sem paralelo histórico. Talvez já seja possível defini-lo como um governo militar, ainda distante do regime de ditadura militar.

Para tanto, a intervenção de militares precisaria avançar para todos os poderes da República, não apenas situado no poder Executivo federal. Pode-se alegar que no Supremo Tribunal Federal já consta um militar de alta patente na assessoria do seu presidente, embora isso ainda seja muito pouco, embora significativo dos novos tempos.

Também no poder Legislativo há registro na elevação da presença de militares, uma vez que 72 deles foram eleitos para cargos no senado e nas câmaras federais e estaduais em 2018. O partido que elegeu Bolsonaro, o PSL, foi o que mais elegeu militares,  39 no total, sendo um deles senador pelo estado de São Paulo.

Com mais algum tempo, as análises a respeito da evolução da realidade tornar-se-ão mais precisas. Mas como no ditado popular: “gato escaldado tem medo de água fria”, cabe aprofundar a reflexão.

Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da Universidade Estadual de Campinas.

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